Relação entre o
apostolado hierárquico e o apostolado leigo
Examinemos o primeiro
sentido. - Qual a missão que Nosso Senhor deu à Hierarquia?
Como vimos, é a
distribuição dos frutos da Redenção. Nesta tarefa, há certamente funções que
podem, a titulo meramente instrumental, ser exercidas pela massa dos fiéis, e,
como vimos, toda colaboração instrumental e meramente instrumental que ela
assim prestar à Hierarquia será legitima.
Legítima apenas? Não
só legitima, mas desejada clara e iniludivelmente pelo Redentor. Com efeito,
instituiu ele uma Hierarquia que é, evidentemente, insuficiente para realizar
sua própria finalidade em toda a sua extensão, sem o concurso dos fiéis, pelo
que ficou significada a evidente vontade do Salvador, de que os fiéis fossem
colaboradores instrumentais da Hierarquia na realização da grande obra só a
esta cometida. Em outros termos, disse-o o primeiro Papa, quando escreveu: -
"Mas vós, vós sois a raça eleita, o sacerdócio real, a nação santa, um
povo adquirido, AFIM DE QUE ANUNCIEIS AS VIRTUDES DAQUELE QUE VOS CHAMOU DAS
TREVAS A SUA ADMIRÁVEL LUZ" (1 S. Pedro, 2, 9).
A tal ponto se
enquadra esta noção no pensamento do Santo Padre Pio XI, que ele não hesita em
chamar Ação Católica os esforços desenvolvidos pelos leigos, neste sentido,
desde os primeiros albores da vida da Igreja. Ouçamo-lo: - "A primeira
difusão do Cristianismo em Roma foi feita com a Ação Católica. E poderia ela
fazer-se de outra maneira? O que poderiam ter feito só os Doze, perdidos na
imensidade do mundo, se não tivessem chamado em torno de si colaboradores? São
Paulo termina suas Epistolas com uma ladainha de nomes entre os quais poucos
Sacerdotes mas muitos leigos e mesmo mulheres: ajuda, diz ele, aquelas que
comigo trabalharam no Evangelho. São Paulo parecer dizer: são os membros da
Ação Católica". (Alocução à JOC italiana, em 19 de Março de 1927).
Houve, portanto, na consecução do mesmo objetivo, duas missões, uma para a
Hierarquia, e outra para os fieis, uma para governar, outra para servir e
obedecer, e ambas estas missões procedem do mesmo divino Autor, devem
desempenhar-se pelo trabalho e pela luta, e têm por escopo comum o mesmo fim,
isto é, a dilatação e exaltação da Igreja.
Em outros termos, a missão dos fiéis consiste em exercer, na missão da
Hierarquia, a parte de colaboradores instrumentais, ou seja OS FIÉIS PARTICIPAM
DO APOSTOLADO HIERÁRQUICO COMO COLABORADORES INSTRUMENTAIS, já que "ter
parte" é, no sentido mais próprio da palavra, participar.
Assim, tomadas as palavras "apostolado" e
"participação" em seu sentido natural, sem atormentar qualquer
vocábulo da definição pontifícia, sem qualquer contorção de significados,
chegamos à conclusão de que, afirmando que a A. C. é uma participação no
apostolado hierárquico, quis Pio XI dizer que ela é pura e simplesmente uma
colaboração, obra essencialmente instrumental, cuja natureza em nada diverge,
essencialmente, da tarefa apostólica exercida pelas organizações estranhas ao
quadro da A. C., e que é esta uma organização súdita, como toda e qualquer
organização de fiéis. Aliás, afirmou-o o
próprio Pio XI, quando disse, em discurso aos Bispos e peregrinos da
Jugoslávia, de 18 de Maio de 1929: - “A A. C. não é uma novidade dos tempos
presentes. Os
Apóstolos lançaram-lhe as bases em suas peregrinações”. Em outros termos, disse o Papa que a essência da A. C.
é absolutamente a mesma que a essência da colaboração leiga desde os primitivos
tempos da Igreja.
Em suma, nos planos da
Providência, a missão dos fiéis participa da missão da Hierarquia como o
instrumento participa da obra do artista. Entre missão e missão, entre obra e
obra, a participação é absolutamente a mesma. Assim como no caso do artista, a
qualidade do agente não passa intrinsecamente para o instrumento, mas se
aproveita de certas qualidades inferiores do instrumento para a realização da
finalidade que é própria e exclusiva do artista; assim também a natureza
hierárquica da missão confiada aos Doze e a seus sucessores não passa para a
colaboração instrumental dos fiéis, mas dela se serve para uma finalidade que
transcende a capacidade dos fiéis e é privativa da Hierarquia. A arte é
privativa do artista, e de nenhum modo pode pertencer ao pincel.
Como se vê as relações
entre obra e obra, missão e missão, constituem uma participação efetiva, real,
e em tudo conforme às exigências de qualquer terminologia filosófica rigorosa:
participação é ter parte.
O que tudo quer dizer
que a definição clássica de Pio XI se deve entender como participação dos fiéis
no apostolado da Igreja, o qual é hierárquico, e não no sentido de participação
dos fiéis na autoridade e funções apostólicas que, na Igreja, só a Hierarquia
pode exercer.
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