CAPÍTULO
V
Os "Círculos de
Estudo"
A doutrina que refutamos
Na Encíclica em que condenou a associação católica de jovens chamada
"Le Sillon", depois de expor o caráter igualitário e liberal das
doutrinas dessa agremiação, o Santo Padre Pio X mostrou as repercussões dessa
tendência nas várias esferas de atividade da referida associação. Quando tratou
dos métodos de formação intelectual empregados por "Le Sillon" para a
formação de seus membros, mostrou Pio X o seu sentido nivelador, inspirados na
doutrina do sufrágio universal, com as seguintes palavras:
"Com efeito, não
há hierarquia em "Le Sillon". A elite que o dirige se desprendeu da
massa por via de seleção, isto é, impondo-se por sua autoridade moral e suas
virtudes. Entra-se livremente ali, e com a mesma liberdade se sai. Os estudos
se fazem sem professor, e quando muito, com um conselheiro. Os círculos de
estudos são verdadeiras cooperativas intelectuais, onde cada qual é ao mesmo
tempo mestre e aluno. A camaradagem mais absoluta reina entre seus membros e
põe em contacto suas almas. Daí a alma comum do "Sillon". O próprio
Sacerdote, quando aí entra, rebaixa a eminente dignidade de seu Sacerdócio e,
pela mais estranha inversão de papéis, se faz aluno, se põe no nível de seus
jovens amigos, e não é mais senão um camarada" (Carta de 25-8-1910, ao
Episcopado Francês).
Lido com atenção este
texto pontifício, vemos que o Santo Padre condena, nesse processo didático, os
seguintes erros:
I – A abolição da
função de professor, reputada anti-igualitária;
II – Em conseqüência
disto, o ensino perde seu caráter tradicional, passando a constituir uma
pesquisa de verdades cujos resultados são sancionados, não pela autoridade e
prestígio do professor, mas, à moda democrática, pelo sufrágio e consenso dos
alunos autodidatas. Em outros termos, uma anarquia pedagógica radical.
Neste assunto, devemos
distinguir dois erros, isto é, o espírito de independência, que sugeriu essa
subversão de métodos, e a radical insuficiência de tais métodos para a formação
intelectual sólida e vigorosa.
Através de tudo quanto
temos dito, tem sido fácil notar que um acentuado fundo de liberalismo é a
causa mais profunda dos erros que vimos analisando. Conscientemente ou não, o
resultado a que tais erros conduzem é sempre uma diminuição da autoridade. Não
podiam, pois, os elementos dominados por tal mentalidade deixar de cair, de
modo mais ou menos completo, no erro de "Le Sillon", e por isto já
ouvimos, com grande freqüência, a afirmação de que aulas, cursos, etc.,
representam métodos antiquados de formação moral e intelectual, pelo que a A. C.
não os deve utilizar de modo assíduo, nem deve fazer deles o processo principal
do exercício de sua função instrutiva. Pelo contrário, apenas uma ou outra vez
durante o ano se devem ou se podem realizar "semanas" com tais
conferências. O círculo de estudo é o substituto jovem, interessante,
democrático e atraente, dos velhos métodos didáticos rançosos, sisudos,
monótonos e anti-igualitários.
Em que consistem os
círculos de estudos, como assaz freqüentemente se realizam em certos setores da
A. C.? Ainda aqui, façamos uma enumeração:
I – O auditório deve
ser normalmente limitado, não contando mais de uma dúzia de pessoas, entre as
quais uma, com o nome de dirigente ou monitora, orienta os trabalhos. O
dirigente ou monitor deve tanto quanto possível ser da mesma idade e nível
intelectual das demais pessoas;
II – Em seu modo de
agir, de falar, de orientar os trabalhos coletivos, deve o dirigente excluir
cuidadosamente qualquer manifestação que o coloque na posição de um professor
ou de pessoa no exercício de função que, direta ou indiretamente, implique em
superioridade ou preeminência. Precisamente como um chefe de célula comunista,
deve ele ser o mais acessível, o mais abordável e o mais despretencioso
“camarada”, das demais pessoas presentes. O dirigente deve mesmo apagar-se de
tal forma, que se suspeite o menos possível, ser ele quem, hábil e
disfarçadamente, dirige o curso das idéias;
III – O círculo pode
versar indistintamente sobre questões doutrinárias, ainda as mais altas, e
questões práticas, ainda as mais complexas e minuciosas. São submetidos a
debate quaisquer assuntos, desde aqueles à vista de cuja solução titubeiam os
mais graves teólogos, até aqueles cuja complexidade impõe hesitações aos mais
firmes moralistas;
IV – Enquanto qualquer
aula bem preparada comporta normalmente a definição clara dos termos do
problema a ser estudado, a enumeração dos princípios aplicáveis ao assunto, a
exposição das várias opiniões que sobre a matéria têm sido formuladas, sua
crítica, o enunciado da opinião do professor e sua fundamentação; no círculo de
estudo, pelo contrário, o dirigente deve ocultar cuidadosamente sua opinião
pessoal, e suscitar, por meio de perguntas feitas aos presentes, que as vão
ventilando sucessivamente, os vários aspectos da questão. Com este intuito, jamais
deve o dirigente entrar pessoalmente no debate, argumentando com os membros do
círculo, mas, pelo contrário, deve fazê-los discutir entre si;
V – Ao cabo de certo
tempo, se o dirigente for hábil, terá sabido encaminhar indiretamente os
espíritos à posse da verdade, e isto de modo imperceptível, sendo tanto mais
hábil o dirigente quanto mais espontâneos houverem parecido os debates. Não
falta quem dê um cunho acentuadamente anti-intelectualista aos círculos de
estudo por achar que as conclusões surgem menos do raciocínio concatenado, do
que da espontaneidade vital, que resultou da "comunidade", e das
várias "presenças", que daí surgiram;
VI – O resultado do
círculo teria sido idêntico ao de uma aula, pois que teria proporcionado aos seus
membros o conhecimento da verdade, mas de modo mais vivo, mais interessante e
mais convincente. Em uma palavra, um conhecimento vital, não um conhecimento
lógico, adquirido pelos processos antigos;
VII – Cada setor da A.
C. deve ter um círculo para dirigentes, feito de preferência por pessoa da
direção central da A. C. Estes, por sua vez, repetem os círculos em cada
paróquia da cidade e da diocese.
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