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Plinio Corrêa de Oliveira
Em defesa da Ação Católica

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  • QUINTA PARTE   A confirmação pelo Novo Testamento
    • CAPÍTULO ÚNICO
      • A "astúcia da serpente"
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A "astúcia da serpente"

 

Comecemos pela virtude da argúcia, ou, em outros termos pela virtude evangélica da astúcia serpentina.

São inúmeros os tópicos em que Nosso Senhor recomenda insistentemente a prudência, inculcando assim aos fiéis que não sejam de uma candura cega e perigosa, mas façam coexistir sua cordura com um amor vivaz e diligente, dos dons de Deus; tão vivaz e tão diligente que o fiel possa discernir, por entre mil falsas roupagens, os inimigos que os querem roubar. Vejamos um texto. “Guardai-vos dos falsos profetas, que vêm a vós com vestidos de ovelhas, e por dentro são lobos rapaces. Pelos seus frutos os conhecereis. Porventura, colhem-se uvas dos espinhos, ou figos dos abrolhos? Assim toda a árvore boa bons frutos, e a árvore maus frutos. Não pode uma árvore boa dar maus frutos nem uma árvore dar bons frutos.

Toda a árvore que não bom fruto será cortada e lançada no fogo. Vós os conheceis pois pelos seus frutos" (S. Mateus, VII, 15 a 20). Este texto é um pequeno tratado de argúcia. Começa por afirmar que teremos diante de nós não só adversários de viseira erguida, mas falsos amigos, e que portanto nossos olhos se devem voltar vigilantes não só contra os lobos que de nós se aproximam com a pele à mostra, mas ainda contra as ovelhas, afim de ver se em alguma não descobriremos sob a alva o pêlo ruivo e mal disfarçado de algum lobo astuto. Quer isto dizer em outros termos que o católico deve ter um espírito ágil e penetrante, sempre de atalaia contra as aparências, que só entrega sua confiança a quem mostrar, depois de exame meticuloso e arguto, que é ovelha autêntica.

Mas como discernir a falsa ovelha da verdadeira? "Pelos frutos se conhecerão os falsos profetas". Nosso Senhor afirma com isto que devemos ter o hábito de analisar atentamente as doutrinas e ações do próximo, afim de conhecermos estes frutos segundo seu verdadeiro valor e de nos premunirmos contra eles quando maus.

Para todos os fiéis esta obrigação é importante, pois que a repulsa às falsas doutrinas e às seduções dos amigos que nos arrastam ao mal ou que nos retêm na mediocridade é um dever. Mas para os dirigentes de Ação Católica, aos quais incumbe, a título muito mais grave, vigiar por si e vigiar por outrem, e impedir, por sua argúcia e vigilância, que permaneçam entre os fiéis, ou subam a cargos de grande responsabilidade homens eventualmente filiados a doutrinas ou seitas hostis à Igreja, este dever é muito maior. Ai dos dirigentes em que um sentido errado de candura faça amortecer o exercício contínuo da vigilância em torno de si! Perderão com sua desídia maior número de almas do que o fazem muitos adversários declarados do Catolicismo. Incumbidos de, sob a direção da Hierarquia, fazer multiplicar os talentos, que são as almas existentes nas fileiras da Ação Católica, não se limitariam eles entretanto a enterrar o tesouro, mas permitiriam por sua "boa " que ele caísse nas mãos dos ladrões. Se Nosso Senhor foi tão severo para com o servo que não fez render o talento, que faria Ele a quem estivesse dormindo enquanto entrava o ladrão?

Mas passemos a outro texto. – "Eis que vos mando como ovelhas no meio de lobos. Sede pois astutos como as serpentes, e simples como as pombas. Acautelai-vos, porém, dos homens, porque vos farão comparecer nos seus tribunais, e vos açoitarão nas suas sinagogas; e sereis levados por minha causa à presença dos governadores e dos reis, como testemunhos diante deles e diante dos gentios". (S. Mateus, VII, 16 a 18). Em geral, tem-se a impressão de que este texto é uma advertência exclusivamente aplicável aos tempos de perseguição religiosa declarada, já que ele só se refere à citação perante tribunais, governadores e reis, e à flagelação em sinagogas. À vista do que ocorre no mundo, seria o caso de perguntar se há um só país, hoje em dia, em que se possa ter a certeza de que, de um momento para outro, não se estará em tal caso.

De qualquer maneira, também seria errado supor-se que Nosso Senhorrecomenda tão grande prudência diante de perigos ostensivamente graves, e que de modo habitual pode um dirigente de Ação Católica renunciar comodamente à astúcia da serpente, e cultivar apenas a candura da pomba. Com efeito, sempre que está em jogo a salvação de uma alma, está em jogo um valor infinito porque pela salvação de cada alma foi derramado o sangue de Jesus Cristo. Uma alma é um tesouro maior do que o sol e a sua perda é um mal muito mais grave do que as dores físicas ou morais que possamos sofrer atados à coluna da flagelação ou no banco dos réus.

Assim, tem o dirigente da Ação Católica obrigação absoluta de ter olhos atentos e penetrantes como os da serpente, no discernir todas as possíveis tentativas de infiltração nas fileiras da Ação Católica, bem como qualquer risco a que a salvação das almas possa estar exposta no setor a ele confiado.

A este propósito é muito oportuna a citação de mais um texto. “E, respondendo Jesus, disse-lhes: Vede que ninguém vos engane. Porque virão muitos em meu nome, dizendo: Eu sou o Cristo; e seduzirão muitos”. (S. Mateus, XXIV, 4 a 5). É um erro supor que o único risco a que os ambientes católicos possam estar expostos consiste na infiltração de idéias nitidamente errôneas. Assim como o Anti-Cristo procurará inculcar-se como o Cristo verdadeiro, as doutrinas errôneas procurarão embuçar seus princípios em aparências de verdade, revestindo-os dolosamente de uma suposta chancela da Igreja, e assim preconizar uma complacência, uma transigência, uma tolerância que constitui rampa escorregadia por onde facilmente se desliza, aos poucos e quase sem perceber, até o pecado. Há almas tíbias que têm uma verdadeira paixão de se colocar nos confins da ortodoxia a cavalo sobre o muro que as separa da heresia, e aí sorrir para o mal sem abandonar o bem, – ou, antes, sorrir para o bem sem abandonar o mal. Infelizmente, cria-se com tudo isso, muitas vezes, um ambiente em que o "sensus Christi" desaparece por completo e em que apenas os rótulos conservam aparência católica. Contra isto deve ser vigilante, perspicaz, sagaz, previdente, infatigavelmente minucioso em suas observações o dirigente da Ação Católica, sempre lembrando de que nem tudo que certos livros ou certos conselheiros apregoam como católico o é na realidade. "Vede que ninguém vos engane: porque muitos virão em meu nome, dizendo: Sou eu; e enganarão muitos" (S. Marcos, XIII, 5 a 6).

Outro texto digno de nota é este: "E, estando em Jerusalém pela festa da Páscoa, muitos creram no seu nome, vendo os milagres que fazia. Mas Jesus não se fiava neles, porque os conhecia a todos, e porque não necessitava de que lhe dessem testemunho de homem algum, pois sabia por si mesmo o que havia no (interior do) homem" (S. João, II, 23 a 25). Mostra-nos ele claramente que por entre as manifestações por vezes entusiásticas que a Santa Igreja possa suscitar, devemos aproveitar todos os nossos recursos para discernir o que pode haver de inconsistente ou de falho. Foi este o exemplo do Mestre. Quando necessário, não recusará Ele ao apóstolo verdadeiramente humilde e desprendido, até luzes carismáticas e sobrenaturais, para discernir os verdadeiros e os falsos amigos da Igreja. Com efeito, Ele que nos deu a recomendação expressa de sermos vigilantes não nos recusará as graças necessárias para isto. "Atendei a vós mesmos e a todo o rebanho, sobre que o Espírito Santo vos constituiu bispos, para governardes a Igreja de Deus, que Ele adquiriu com seu próprio sangue. Eu sei que, depois da minha partida, se introduzirão entre vós lobos arrebatadores, que não pouparão o rebanho" (Atos XX, 28 a 29).

É certo que só se refere diretamente aos Bispos a obrigação de vigilância contido neste texto. Mas na medida em que a Ação Católica é um instrumento da hierarquia, instrumento vivo, inteligente, deve ela também estar de olhos vigilantes contra os lobos arrebatadores.

Afim de não alongar por demais esta exposição, citamos apenas mais alguns textos:

O mesmo S. Pedro ainda teve mais este conselho: "Vós, pois, irmãos, estando prevenidos, acautelai-vos, para que não caiais da vossa firmeza, levados pelo erro destes insensatos; mas crescei na graça e no conhecimento do Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. A Ele (seja dada) glória, agora e no dia da eternidade. Amém". (Idem, III, 17 a 18).

E não se julgue que só um espírito naturalmente inclinado à desconfiança pode praticar sempre tal vigilância. Em S. Marcos lemos: "o que eu pois digo a Vós, digo a todos: Vigiai" (XIII, 37). São João aconselha com solicitude amorosa: "Filhinhos, ninguém vos seduza" – (1 S. João, III, 5 a 7).

A todos nós, membros da A. C., incumbe pois o dever da vigilância arguta e eficaz.

 

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