Verdades suaves,
verdades austeras.
Não quereríamos
encerrar esta introdução sem um esclarecimento de importância capital. Os erros
que combatemos no presente livro se caraterizam, em grande parte, por seu
unilateralismo. Na doutrina de Nosso Senhor Jesus Cristo, apraz a muitos
espíritos ver apenas as verdades doces, suaves e consoladoras. Pelo contrário,
as advertências austeras, as atitudes enérgicas, os gestos por vezes terríveis
que Nosso Senhor teve em sua vida costumam ser passados sob silêncio. Muitas
almas se escandalizariam – é este o termo – se contemplassem Nosso Senhor a
empunhar o azorrague para expulsar do Templo os vendilhões, a amaldiçoar
Jerusalém deicida, a encher de recriminações Corozaim e Bethsaida, a
estigmatizar em frases candentes de indignação a conduta e a vida dos fariseus.
Entretanto, Nosso Senhor é sempre o mesmo, sempre igualmente adorável, bom e,
em uma palavra, divino, quer quando exclama "deixai vir a mim os
pequeninos, porque deles é o Reino dos Céus", quer quando, com a simples
afirmação "sou Eu", feita aos soldados que O iam prender no horto das
Oliveiras, se mostra tão terrível que todos caem por terra imediatamente, tendo
a voz do Divino Mestre causado não só sobre suas almas, mas ainda sobre seus
corpos, o mesmo efeito que a detonação de algum dos mais terríveis canhões
modernos. Encanta a certas almas – e como têm razão! – pensar em Nosso Senhor e
na expressão de adorável meiguice de sua Divina Face, quando recomendava aos
discípulos que conservassem na alma a inocência imaculada das pombas. Esquecem,
entretanto, que logo depois Nosso Senhor lhes aconselhou também que
cultivassem, em si, a astúcia da serpente. Teria a pregação do Divino Mestre
tido erros, lacunas, ou simplesmente sombras?
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