- 158 -
e) IGREJA UIVERSAL E IGREJA PARTICULAR
“O Papa é o
centro e criador dos outros centros.”
O
Papa atrai e irradia, congrega e difunde. É centro do mundo cristão, em toda
sua amplidão; é ao mesmo tempo, criador dos outros centros. Ainda que
imerecidamente, eu sou vosso Bispo. Quem me deu autoridade para governar as vossas almas? Quem me investiu no
foro interno e externo, do poder legislativo, judiciário e executivo, no qual
consiste nos termos da Diocese Placentina, a soberania espiritual do meu
ministério Episcopal? Quem colocou em minhas mãos as chaves do reino dos céus,
em vosso favor? Certamente Jesus Cristo, já que na ordem sobrenatural tudo vem
d’Ele, mas Jesus Cristo através do Papa.
As
chaves do Reino celeste, disse Ele a Pedro, eu as darei a quem? A ti, darei a
ti (...). É verdade que aquelas chaves deverão passar a outras mãos, mas sempre
pelas tuas mãos; aquele poder (em limite mais ou menos amplos) deverá ser
conferido a outros, mas por ti e a beneplácito teu. Portanto, diz São Cipriano,
do mesmo modo que o vigor dos membros humanos deriva da cabeça, a vida dos
ramos, da raiz da árvore, da fonte, a água dos riachos, e a luz. dos raios do
sol, assim todos os poderes hierárquicos emanam, como de visível nascente, da
Sé de Pedro. E se não fosse assim, com que direito chamar-me-ia vosso Bispo? 32
“Todo o
episcopado se concentra no Bispo dos Bispos.”
Agradável
é o louvor que nos vem das pessoas amadas, porém, mais querido ainda é o que
vem de vós, porque endereçado ao alvo muito mais alto, que o da minha pobre
pessoa. O louvor que se faz a um Bispo, ainda que merecidamente (e no caso
presente de fato não o é) é em substância louvor ao episcopado, que com seu
caráter divino, com a graça do seu ofício, com sua celeste dignidade, com sua
autoridade de jurisdição, reflexo da - 159 -
mesma
autoridade de Jesus Cristo, é sempre a límpida e viva fonte de todo o bem, que
o Bispo opera. Como todo o episcopado se concentra, se unifica no Bispo dos
Bispos, que é o Papa, é antes como o corpo de uma única pessoa moral, que tem
como Chefe visível o Romano Pontífice, segue-se que o elogio a um bispo, não é
apenas elogio ao Episcopado, mas resulta outrossim, de modo particularíssimo,
elogio àquele supremo poder papal, no qual o episcopado vive e floresce. 33
“A glória
mais pura da Diocese Placentina.”
Faz
25 anos que sentais nesta infalível
cátedra e faz 25 anos que a ilustrais com a palavra, com o exemplo, com
esplendor de uma sabedoria rara e com o exercício das mais sublimes virtudes;
25 anos de assíduos cuidados e de grandes lutas, cheias de obras santas,
gloriosas, imortais (...). Do
profundo do coração, vos agradecemos pelo bem que nos fizestes, pois a vossa
Palavra, o Espírito de Deus que inspira
e acompanha, nos faz fortes da Vossa mesma fortaleza, valorosos dos vossos
valores, firmes, intrépidos como Vós.
A
união sincera e afetuosa com a Sé de Pedro constituiu em todo tempo, a glória
mais pura, mais ambicionada, mais querida da Diocese Placentina, que hoje, por minha
boca renova os protestos de fidelidade e de respeito a Vossa Venerável Pessoa,
declara altamente querer continuar as tradições recebidas, bem sabendo que, na
união com o Pontificado Romano e na plena e perfeita conformidade aos Vossos
ensinamentos e desejos, é outrossim resposta de salvação para a nossa pátria. 34
“Bispo,
cabeça de uma Igreja que vive sua própria vida, na grande unidade da Igreja
universal.”
Ser
Bispo é pertencer a todos e não mais a si mesmo; no grau mais excelso e com a mais
sublime autoridade do sacerdócio, é o
pai de uma família, o chefe de uma Igreja, que vive de sua própria vida, na
grande unidade da Igreja Universal (...).
Falta
a seus deveres mais sagrados, o eclesiástico que não pratica as santas palavras
do Mártir Sto. Inácio: Sede submissos ao Bispo, como a Jesus Cristo; obedecei
ao Bispo, como Jesus Cristo obedeceu ao Pai (...).
- 160 -
São
estas regras eminentemente, apostólicas, que sobressaíam na conduta do nosso
piedoso Prelado, que não cessava de deplorar a decadência e os grandes males
que seriam atribuídos à Igreja. Repetia constantemente (...) o que antecipará o triunfo da Igreja e
formará uma grande armada disposta à batalha, será, sem dúvida, uma inabalável
adesão ao centro da unidade católica, o respeito, o amor, a obediência em tudo,
ao Romano Pontífice mas não separado do respeito do amor, da obediência à
autoridade episcopal, sobre a qual, no dizer de um Padre, se fundamenta e
repousa a salvação da Igreja. 35
“Nós
Bispos, somos irmãos entre nós.”
Reunidos
pela primeira vez, para conferir as coisas que dizem respeito ao governo de
vossas almas, unidos, em espírito de obediência e de devoção para com o Pai
comum dos fiéis, o encontrarmo-nos e sentirmo-nos verdadeiramente irmãos, foi
uma coisa só (...).
Sabei
que nossas palavras não são nossas, são o eco fiel do magistério divino de
Jesus Cristo, confiado a Pedro; dele desce através dos Bispos, até vós. Nós somos e nos alegramos de poder chamar-nos e sentir-nos irmãos,
unidos e amáveis entre nós, porque com todo o ardor da alma e com profunda devoção, atendemos aos
infalíveis documentos do nosso único mestre, a cuja voz nos sentimos felizes de
prestar, por graça de Deus, dócil e amorosa atenção: “vós sois todos irmãos, o
vosso único Mestre é Jesus Cristo”. 36
“Impossibilidade
de governar as Dioceses.”
Confesso-vos
ingenuamente, que o miserável estado das nossas dioceses por causa dos
contendores e das escandalosas polêmicas, constitui a maior dor da minha vida e
me aflige de tal modo, a ponto de perder até a saúde.
Quando
estive em Roma, falei claramente, talvez com excessiva franqueza, sobre as
coisas que acontecem entre nós, da impossibilidade de governar as Dioceses, se
não fosse freado aquele partido audacioso, que tendo seus chefes em Milão, se
difundia em todas as cidades, que se tornava intocável, também diante dos
Bispos com sua exagerada - 161 -
adesão
ao Papa etc. Que devo dizer-vos? parece-me que ao Santo Padre, as minhas palavras
causaram alguma surpresa; tenho motivos para acreditar que o partido tenha
percebido, “daí vem a cólera”.
Falou-se
há dias de insinuações malévolas feitas pelo Osservatore a vós e a mim e a algum outro colega. Há dois anos que
não leio aquele jornal e não me preocupo com seus julgamentos. porém, ao chegar
a Placência escreverei sobre isto ao Papa e escreverei com força e não só de
mim. Caro amigo, estamos unidos, como alvo das flechas destes pobres cegos e
devemos opor-nos a suas insanas tentativas, conservando a calma, a pureza de
intenção, procurando só a glória de Deus, da Igreja e a salvação das almas.
De minha parte estou
disposto não só a escrever, mas também a empreender
viagem a Roma, para levar ao conhecimento do Santo Padre, o verdadeiro estado
de coisas. 37
Os
partidos que tomam, ora um pretexto, ora outro, para esmagar pouco a pouco o
Episcopado e dar, a seu modo, a orientação da opinião pública católica, tornam-se,
cada dia, mais audaciosos, até tornar os Bispos impotentes, talvez no exercício
do seu sagrado ministério (...).
Eu que consumi a saúde e tudo o que é meu, a bem da
religião, que recusei grandes
condecorações, com o direito à generosa aposentadoria, para protestar contra a
violação dos direitos da Igreja; eu que considero, como ordens absolutas,
também as tendências menos marcantes da S. Sé; que fui, não somente com
palavras e estou pronto a derramar meu sangue pela Igreja e por seu sagrado Chefe,
eu ser suspeito de traição? Meu Deus! Sustentai-me, na árdua prova, pois se a
coisa fosse confirmada, eu morreria do coração. 38
Escrevi a alguém
influente de Roma e ultimamente ao Papa. Envio-vos cópia, para que me digais se
escrevi com suficiente política e se devo insistir sobre o assunto. Se os
Bispos não fossem mudos, à força de falar, tirar-se-ia alguma vantagem. A
propósito, o que pensa Mr. Guindani? Caso veja as coisas como nós, não poderia
também ele escrever, como eu fiz? Enfim é dever de nosso ministério levar ao conhecimento do Papa, o - 162 -
verdadeiro estado de coisas, com a
finalidade de salvar o que se pode. 39
A
confusão das línguas é verdadeiramente assustadora; se as coisas continuarem
assim, as Dioceses tornar-se-ão ingovernáveis. Por enquanto, parece-me
extremamente necessário, especialmente para nós, Bispos, grande prudência,
rodeados como estamos e vigiados por certos fariseus, que procuram avidamente,
todo pretexto, para julgar-nos e colocar-nos em aparente contradição com a S.
Sé, o que se torna gravíssima injúria ao episcopado e enorme escândalo aos
fiéis. Em tão triste condição peço cada dia a Deus me conceda a mim e a todos
os meus irmãos, calma, paciência, tranqüilidade, confiança no divino auxílio,
sem o que se perde a cabeça. 40
“E nós
homens temos senso.”
Participo com toda alma de vossas dores e
de vossas tribulações, mas é necessário ser forte e carregar com grande
dignidade o peso da presente tribulação.
Estou
certo de que num dia, não muito distante, será feita justiça. Quando se
tornarem conhecidas as censuras da Inquisição dir-se-á: deram à luz os montes
etc. Desta história a vossa defesa será feita, vereis. Em tudo, escrevia um
Padre da Igreja, Sto. Ambrósio, desejo seguir a Igreja Romana; mas também nós
homens temos senso; a mim parece querer dizer: porque sou Bispo, devo deixar-me
impor, como se impõe a um jumento? Acautelai-vos das surpresas: o objetivo dos
vossos adversários, já vos disse uma vez, é de vos fazer renunciar à Diocese. 41
“O episcopado deve elevar-se por si mesmo.”
O
episcopado deve elevar-se por si mesmo e encontrar, na própria autoridade
divina, a força para se impor aos inimigos e para conseguir o respeito que lhe
é devido. Expressei-vos, outras vezes, este pensamento e acredito que não erro.
Esperar uma ajuda eficaz de Roma é iludir-se. Todavia, eu tentarei todos os
caminhos e asseguro-vos que falarei, com - 163 -
tamanha
força e com tão profunda convicção, que farei dobrar qualquer vontade. Para que
não aconteça, como temo, uma tomada de posição, em força de uma política toda
humana, que desde algum tempo domina, nas relações exteriores da Igreja. 42
“Saberei
defender minha autoridade.”
Nós somos muito expansivos e sinceros,
é verdade, mas não o percebo como um mal; existe também um tempo para falar e
parece-me que chegou; entende-se: quando e onde se pode e se creia conveniente,
já que o silêncio de todo o episcopado contribui fortemente para aumentar a
audácia dos novos liberais e queira Deus, se possa de algum modo freá-los, o
que eu duvido muito. Valer-me-ei de vossos fraternos conselhos, estarei atento,
mas não a ponto de demonstrar temor de quem quer que seja: nunca nos amarão,
persuadi-vos; ao menos nos temerão.
Sinto-me perfeitamente tranqüilo; se em Roma disserem coisas que não
existem, responderei em bom tom. Não devo nada a ninguém e saberei defender a
minha autoridade e a minha função, com grande energia. Refleti antes de começar
a luta, pesei todas as dificuldades e estou convicto de poder resistir a todas
as forças dos nossos adversários.
Prudência, cuidado, mas
sobretudo, coragem e firmeza. Escrevi ao Papa no sentido que vos disse, com
reverência, mas com energia. 43
|