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b) A SANTIDADE DO SACERDOTE
“A
finalidade da vossa vocação é a santidade.”
A
finalidade da vossa vocação é a santidade (...). Os sacerdotes não são chamados a uma santidade pessoal, mas se
dedicam também à santidade dos outros. “Eu vos escolhi e vos destinei a ir e a
produzir frutos abundantes” (Jo 14,1).
Eu
vos escolhi, isto é, eu vos separei da culpa, e vos estabeleci solidamente no
estado de graça, a fim de que andeis, progridais na virtude e leveis, como
vosso fruto, os homens à conversão. Que estes frutos durem, isto é, seja sólida
a fé daqueles que a mim associastes.
Com
que força e com que modelo os sacerdotes poderão conseguir, senão com a força e
modelo de santidade de Cristo? “Como o galho frutifica se permanece unido ao
tronco, assim também vós, se permanecerdes em Mim (Jo 15). O poder do vosso sacerdócio
vem da participação ao sacerdócio - 171 -
de
Cristo. De fato, afirma o Tridentino, Ele destinou os sacerdotes, para serem seus vigários. Por
isso testemunhar Cristo, ao povo fiel, tanto na santidade, quanto no
ministério.
Os sacerdotes se aproximam do altar para oferecerem a Hóstia imaculada?
É necessário que os fiéis vejam neles o amor e a união de Cristo, com o Pai.
O sacerdote sobe a Cátedra da verdade? O próprio lugar exige se fale de
realidades altíssimas; requer que tais realidades sejam vistas encarnadas pelos
sacerdotes, que reproduzam não fariseu, mas o Cristo que pregam (S. Greg. pars
II, c. 3).
O sacerdote senta-se no
sagrado tribunal da Penitência? Especialmente lá ele deve ser formado e
reforçado na santidade de Cristo.” A mão que se estende para purificar a mancha
do outro deveria, ela mesma, estar limpa, para não manchar ainda mais aquilo
que toca, caso esteja suja de lama (S. Greg. I, c. 27). 12
“A
santidade é pureza consagrada a Deus.”
A
santidade, disse São Tomás, é pureza consagrada a Deus. pureza comum, nem
medíocre, mas eminente, como disse Crisóstomo. A Santidade é uma eminente
pureza da mente. A mediocridade não é condizente com o sacerdote: é como uma
cidade colocada sobre o monte, que não pode ser escondida. A santidade é pureza
consagrada a Deus: pureza comprometida com a honra de Deus. Portanto a
santidade, juntamente com a pureza da mente, exige imolação contínua. Santo é o
que se queima, no altar, em homenagem a Deus. Do mesmo modo, santidade
autêntica significa uma vida sacerdotal livre de qualquer vício e continuamente
comprometida com a honra de Deus.
Tememos,
porém, que a noção que demos de santidade, suscite alguém idéia de uma
santidade distante de nossas forças, dificilmente acessível, reservada a pessoas
que vivem fora do mundo.
Não
existe motivo para temer, quando se ouve falar em santidade genuína.
A
Santidade, a perfeição própria desta vida, não é algo absoluto, ausente de
qualquer imperfeição. De fato, até o justo peca sete vezes ao dia. A santidade,
consiste em um contínuo impulso para alcançá-la. Assim ensinava S. Bernardo.
Agrada-me citar aqui, a orientação de Sto. Agostinho: “e perfeito o que não tem
pecados graves e não se descuida dos veniais, - 172 -
enfim,
aquele que corre sem se cansar, no caminho da virtude.” (De Perfect, Just. c.
3). 13
“O primeiro
degrau da santidade é o desejo ardente e generoso.”
O
primeiro degrau, ou meio para alcançar a santidade é o desejo ardente e
generoso. Sendo o fim do sacerdote a santidade, a ela devem ser dirigidas todas
as suas forças e aspirações. Não é suficiente um desejo, uma decisão qualquer:
é necessário, um desejo e uma vontade comparáveis à fome e à sede.
“Bem-aventurado aqueles que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados”.
A
Santidade é a verdadeira sabedoria, que é necessário pedir, desejar, buscar,
como a riqueza: cavar como um tesouro (...). Ninguém, jamais alcançará o cume da
santidade, se não a tiver ambicionado assídua e intensamente. Veneráveis
irmãos, todos vós desejais a santidade. Pelos frutos, cada um avalie a
intensidade do seu desejo.
Do
amor à santidade, deriva a freqüente e cotidiana meditação das leis e dos
mistérios celestes. O sacerdote que descuida da meditação quotidiana nunca será
santo, mas experimentará a desolação; será “semelhante àquele que contemplou a
sua imagem no espelho: contemplou-a e mal sai daí esquece-se de como era” (Tg
1,23).
Do
verdadeiro amor à santidade, brota o empenho de purificar a própria consciência
cada oito dias, conforme a prescrição do Sínodo. Quem descuida disto está longe
do caminho da santidade, porque quem despreza as pequenas coisas, pouco a pouco
cairá.
Deste
mesmo desejo imenso, deriva o exame de consciência quotidiano: ele é necessário
sobretudo aos sacerdotes, para verificarem o que estão edificando sobre o
fundamento da fé: se ouro, ou prata, ou palha.
Disse Gregório Magno que, de fato, o nosso espírito
distrai-se continuamente, com as preocupações
e não nos conscientizamos se não verificarmos os nossos progressos e
retrocessos, reentrando em nós mesmos. 14
“A retidão do coração.”
Que
significa um coração reto? Um coração que busca unicamente a Deus, um coração
simples, um coração puro como suplicava o real salmista: “Cria em mim, á Deus,
um coração puro, e renova no meu interior um espírito reto”. (Sl 50,12) (...). - 173 -
Este coração reto é na verdade
grande coisa, origem de todas as virtudes, fonte de santidade, raiz da vida
sacerdotal (...)
Seja
a retidão de coração a primeira preocupação do sacerdote. Foi com esta
disposição que entrastes a fazer parte da milícia da Igreja; é com esta
disposição que deveis perseverar, com constância. Diz o sábio: “Guarda teu coração acima de todas as coisas, porque dele
procede a vida”. (Pr 4,23). É verdade.
De fato, de onde vem o resfriamento do santo temor, a inconstância na virtude,
o difícil progresso no caminho da perfeição? Da fraqueza do coração. Por que,
às vezes, as pedras do santuário são dispersas por todas as partes e os mesmos
cedros de Líbano estão sujeitos a quedas catastróficas? Por um vício oculto no
coração.
Por
isto o sacerdote, como sábio arquiteto, coloque o fundamento do coração reto,
isto é, orientado para Deus, para poder depois edificar sobre ele. 15
“Como
garantir-nos o caminho da retidão.”
Eis como garantir-nos o caminho da retidão: meditar sobre a lei de Deus
e conversar assiduamente, com Ele, na oração.
Quem deseja conservar esta retidão
de coração aplique-se à oração. Um piedoso escritor assim se expressa sobre a
oração: Se alguém me perguntasse do que mais necessita um sacerdote, no cuidado
das almas, responder-lhe-ia: de oração; depois se perguntasse, de que outra
coisa tem necessidade, repetir-lhe-ia: da oração; se ainda e repetidamente
insistisse sobre a pergunta, a minha resposta seria sempre a mesma.
Compreendeis a necessidade da oração. Ouçamos São Bernardo: A reflexão
ou meditação, da qual deriva a oração, oferece as seguintes vantagens: antes de
tudo purifica a mente, isto é, a mesma fonte da qual se origina; corrige os
excessos, regulamenta os costumes, torna a vida virtuosa e ordenada; enfim,
busca conhecimento das coisas divinas e humanas.
É a meditação que
esclarece o que é ambíguo, recompõe, quando está desconexo, ajunta o que está
disperso; escruta as coisas secretas, intui as verdadeiras, submete a exame as
verossímeis, tira a máscara das enganadoras e falsas.
É
ainda a meditação que programa a nossa atividade e uma realizada, a reexamina,
para que nada de incorreto permaneça nossa vida. Finalmente é a meditação que
na prosperidade prepara-nos para as contrariedades e isto é,
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prudência, enquanto, na contrariedade
faz com que quase não a sintamos e isto é fortaleza. (De Consid. I, e. 7).
16
“A Caridade
cresce e se nutre da meditação.”
Eis
a eficácia da meditação, para a retidão do coração e para a integridade da
nossa vida espiritual. Da meditação brotarão riquezas incalculáveis, enquanto
que, sem meditação será desolação sobre desolação e absoluta esterilidade de
boas obras. Nunca poderemos desenvolver dignamente os trabalhos do nosso
ministério, se não o tivermos constantemente diante dos olhos e em assíduo e
íntimo contato com Deus.
Vejam
como cumprem o seu ministério os sacerdotes que passam o dia com contatos e
divagações exteriores, extinguindo assim o espírito de oração; mais prontos a
tratar de negócios mundanos, de acontecimentos diários, que da oração;
habituados a falar continuamente com os homens, quase nunca com Deus; raramente
encontram o tempo, para a meditação da manhã; que adiam para as últimas horas
do dia o dever das Horas Canônicas, como se fosse o último de seus deveres. Entendiam-se
de tratar com Deus, porque O amam pouco.
Convencei-vos
de que a caridade cresce e se nutre de meditação. “Na meditação, disse o
Profeta, acende-me um fogo” e isto diga-se sobretudo da caridade do sacerdote:
ele, como ministro de Deus, deve ser como um fogo flamejante: “Que fez dos seus
ministros, chamas ardentes” (Hb 1,7); e o seu coração, como um altar, sobre o
qual oferece um holocausto perene: o fogo deverá ser alimentado no altar, sem
jamais apagar. O sacerdote nele acenderá lenha todas as manhãs” (Lv 6,5). Vós
todos o sabeis: a meditação diária deve fornecer sempre novo alimento à vida
sacerdotal, para que este fogo se conserve e se dilate. 17
“O bom
exemplo é o distintivo do bom pastor.”
Não
é suficiente que o sacerdote seja piedoso e santo diante de Deus, no íntimo da
consciência. É necessário que tal se manifeste, também diante dos homens. Desde
o momento em que foi colocado a parte, pela herança de Deus, é absolutamente
requerida dele, não só a integridade de vida, mas também o testemunho desta
integridade, entre o povo fiel.
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A boa fama é para ele um
compromisso, para com Deus, para com a Igreja, para com os fiéis. O bom exemplo
é o distintivo do bom pastor, conforme as palavras de Cristo: “O Pastor vai com
as próprias ovelhas; vai na frente delas e as ovelhas o seguem” (Jo 10,4)
(...).
O Sacerdote na cura das almas, é
uma cidade colocada sobre o monte, exposto aos olhares de todos. A sua vida,
que não pode ficar escondida, deve produzir efeito nos outros. De fato, ele
será a ruína ou a ressurreição para muitos. Portanto, examinai como vos
comportais, em palavras e em obras.
O sacerdote é lâmpada colocada sobre o candelabro, para
que ilumine a todos os que estão na casa. Mantenha a sua eficácia forte e penetrante,
a tal ponto de atrair à virtude, com seu exemplo. A boa conduta do sacerdote é
a melhor formação das populações. Não existe, nada mais eficaz, do que o
exemplo (...) A pregação santa já
tem em si mesma, a eficácia, mas é dupla a eficácia, quando a palavra pregada é
santa, e aquele que prega é santo. 18
“Deus
escolheu os seus ministros não entre os anjos,
mas entre
os homens.”
Deus,
por um gesto de sua bondade infinita, não escolheu os seus ministros, entre os anjos,
mas entre os homens. Todo Pontífice é tirado dentre os homens, isto é, entre
criaturas cheias de enfermidades e de imperfeições, plasmado com a argila comum
de Adão, expostos, como todos os outros e freqüentemente, mais que os outros,
ao embate das paixões. Ë bom lembrar que Deus, comunicando aos sacerdotes os
seus poderes, não lhes comunicou a impecabilidade. Ao permitir que alguma folha
da árvore caia no lodo, mostra que estes poderes não dependem do mérito daquele
que os recebe. Não são dados ao homem, para uso próprio, mas vara o bem dos
outros. A Igreja não é governada por força humana, mas pela força que vem do
alto. 19
“Os padres
não são anjos: é melhor que seja assim.”
Os padres não são anjos, é melhor que seja assim. Saberão compadecer-se
mais e socorrer os culpados e pobres irmãos, porque também eles estão cercados
de enfermidades. Porém, eles não precisam se envergonhar diante de seus
censores, quase todos sabem honrar seu ministério, - 176 -
com ciência, caridade, operosidade e com virtude,
cumprem o preceito do Apóstolo: honrei meu ministério. 20
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