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c) A CONFISSÃO DA FÉ
“Eu não me
envergonho do evangelho.”
Nas
coisas de religião, quer se trate de dogma ou moral, de preceito ou de
conselhos, de leis de Deus ou da Igreja, de culto ou de hierarquia, do Papa,
dos Bispos ou de sacerdócio, não só a nossa linguagem, mas a nossa vida deve
ser como um grito, que diga à terra: eu não me envergonho do Evangelho. (...)
É
hora de professar e praticar abertamente a nossa fé. É hora de colocar mãos à
obra vigorosa da regeneração cristã do povo, iludido e irritado pelas
mentirosas promessas de quem, em lugar de bem-estar e de riqueza, não lhe deu
senão humilhações e miséria. É hora de circundá-lo com a nossa caridade, em
nome de Jesus Cristo, para que não abra os ouvidos a doutrinas enganosas e a
promessas ainda mais enganadoras. É hora de alinhar-se compactos, em torno de
nosso Chefe Supremo, o Vigário de Jesus Cristo. 15
“O martírio
não será para nós?”
O martírio
talvez não seja para nós? O Espírito Santo diz a cada um, nas divinas
Escrituras: agoniza por tua alma e combate pela justiça até a - 199 -
morte. Esta justiça é a verdade de
Cristo, da qual os que se separam, pensam coisas injustas e tornando-se
operadores de iniquidade, incorrem no ódio eterno de Deus (...).
Por
esta verdade é necessário combater incansavelmente até a agonia e morte. E a hora
desta agonia, cedo ou tarde, soará para todos nesta vida. Diz um Doutor que a
assídua luta do espírito com a carne, a dor de uma alma que é, às vezes, presa
à terra como escrava, rejeitada como indigna pelo céu, outra coisa não é que
agonia e martírio; é ter a coragem das próprias convicções, levar uma vida
cristã diante de um mundo que ridiculariza, porque não tem a coragem de crer; é
um aproximar-se do martírio. 16
“Temos que
tomar abertamente partido de Deus.”
Muitos
se conservam católicos, mas por pusilanimidade mantém oculta a sua fé. Não nos
condenemos ao silêncio, quando se blasfema contra o Nome três vezes santo de
Deus e se zomba do nosso Pai comum, o Romano Pontífice. Não sejamos daqueles
catôlicos, dos quais escrevia o profundo Pascal: indecisos por timidez,
indulgentes por cálculo, não saberíamos bem o que pensam.
É
chegado o tempo das grandes afirmações. Não somos nós, os filhos dos heróis e
dos mártires? Não somos nós, os herdeiros daquela fé que resistia aos tiranos e
aos velhacos? Não professamos a fé que venceu o mundo? Se esta fé ensina que
aqui na terra estamos em contínua luta com os inimigos espirituais, não o
estaremos com os inimigos da religião? Se o amor à religião deve armar-nos
incansáveis em defesa dela, o primeiro e mais fácil ato de defesa é mostrar-nos
sem temor e sem ostentação, com palavras e com fatos religiosos. 17
“A coragem
do bem.”
Soou
a hora de mostrar aos filhos do século, que se proclamam livres, em que
consiste a verdadeira liberdade. A vida do cristão é sempre um combate. Que
será em nossos dias? Podemos iludir-nos quanto quisermos, mas a guerra tanto
mais insidiosa e feroz, arde hoje em todas as partes do mundo, contra o
catolicismo (...). Cabe a nós, filhos
da verdadeira Igreja de Cristo, sustentar intrépidos este combate, preclaro e
santo por excelência e - 200 -
manifestar
aos olhos dos amigos e dos inimigos toda a força e o entusiasmo da coragem
católica, a força e a coragem de um povo radiante em todo o esplendor da fé e
da esperança cristã. A coragem para o mal, os maus a têm até ao cinismo e só
aos bons a coragem do bem será falha? Terão eles para perder, e nós não para
salvar-nos? Eles estão prontos a arruinar a juventude, e nós, para educá-la
cristãmente seremos tímidos e medrosos? Eles renunciam a todo cuidado, pisando
sobre os respeitáveis costumes, as leis, a consciência, a vontade de todo um
povo. Nós, inundados pela luz divina de dezenove séculos, sustentados por tudo
quanto de verdadeiro e de bom se recolhe na terra, nós abençoados e encorajados
pelos céus, nós certos da coroa imortal, trepidaremos? (...). Sobretudo vós, ó jovens, cara
esperança da Igreja e da pátria, não esqueçais nunca, que as lutas e os
triunfos devem começar em vossos corações. O vosso coração é o primeiro campo
no qual se originam, se preparam as grandes questões, os mais sagrados
interesses da Igreja, família e sociedade civil (...). Não vos deixeis seduzir pela futilidade de um mundo que ri, porque
não tem coragem para acreditar. Fugi dos apóstolos do erro, como fugireis à
vista de uma cobra venenosa. Aprofundai com o estudo, os princípios da nossa
santíssima religião, tende a ciência da fé, sede fiéis por convicção profunda e
então nada poderão contra vós todas as seduções do século. Vencedores, vós
mesmos erguereis sempre mais alta a bandeira da verdade cristã: Temei somente a
Deus e sereis verdadeiramente livres. 18
“Tende a
energia das vossas convicções.”
A
energia, eis o que mais falta em nossos dias. A energia não é exatamente a
firmeza, porque esta pode ser também uma força inerte: a energia não deve,
igualmente confundir-se com a fidelidade e a constância, porque ela é causa,
não efeito, destas duas virtudes. A energia não é pois violência, porque a
violência se esgota num esforço passageiro e estéril. A energia é a força da
alma e da vontade, mas uma força que resiste e progride, que sustenta todos os
assaltos e vence todos os obstáculos: é uma virtude conquistadora. Em meio às
mais ardentes lutas, ela se mantém nos limites precisos da verdade. Ela domina
e dirige, com autoridade calma e soberana,, todas as faculdades da inteligência
e todos os impulsos do coração. É a energia que cria os grandes empreendimentos
(...).
Tende
também vós esta energia. Antes de tudo a energia das vossas convicções. Quando
alguém tem atrás de si, dezenove séculos de luz, de - 201 -
de glória, de beneficência; quando alguém tem atrás de
si, um exército invencível de apologistas e de doutores, a ciência e o gênio, a castidade e o sacrifício, os
apóstolos, os mártires; quando ainda hoje, a Igreja replena a terra com tantas
obras maravilhosas, oh, é bem justo falar e agir, com santa independência e com
nobre altivez! Tem-se bem o direito de olhar de frente o erro, sem empalidecer!
Tende
energia contra as paixões. Também estas podem se tornar instrumentos eficazes
de bem, se nós soubermos freá-las e orientá-las através da energia da vontade.
Ë o raio que tudo arranca e destrói à sua passagem, e é o raio que, tornado dócil na mão da ciência, leva através do
oceano o pensamento do homem, com a rapidez do relâmpago.
Tendes
energia e ardor? Vinde. O campo a percorrer é muito vasto. Leio o vosso
programa, Senhores: organização dos católicos na Emília; ação católica, atos de
religião e de culto, imprensa, escolas etc. Domina-vos a ambição? Endereçai-a à
conquista de tudo o que é belo, bom e verdadeiro. Sim, existe uma ambição
santa: é aquela que grita continuamente: mais alto! mais alto ainda! mais alto
na fadiga, mais alto na virtude, mais alto no sacrifício, mais alto na
influência regeneradora! mais alto! mais alto! alto! Tende a força do apóstolo,
pois todo cristão deve ser apóstolo. Como possuir a verdade, vê-la, senti-la,
amá-la, e não sentir a forte necessidade de difundi-la, de comunicá-la aos
outros?
Tende a energia que sabe resistir na hora da prova
e do combate, exatamente, porque, todo cristão deve ser soldado (...). Combatei como fortes, mas sempre com
caridade. Os adversários, direi como um insigne escritor moderno, embora
malignos, pertencem ainda à arquitetura do bem e se Deus vibra golpes vigorosos
eles se mudarão. Levai vossa mão ao santuário do coração: perpassai uma a uma,
todas as fibras. Encontrareis também a fibra do amor. Tocaia-a com a cortesia,
que é irmã da caridade; aquela fibra se moverá, e tereis conquistado uma alma
imortal e curvado um novo coração ao cetro da verdade. A verdade cristã,
recordai-o sempre, quer a seu serviço, não homens que matam, mas que salvam,
não requer algozes, mas vítimas. Pensai que o apóstolo, descrevendo a armadura
do soldado cristão, lhe dá a base, que ele chama de preparação do evangelho da
paz. Na escola de Jesus Cristo, combater e vencer, é amar. Amor é triunfo; o
ódio derrota. 19 - 202 -
“O caráter
que produz a firmeza e a coragem.”
O
maior valor de um homem, na sociedade civil, é o caráter, fruto de convicções
profundas. O caráter produz a firmeza e a coragem em evidenciar a própria
opinião, de fronte erguida e diante de quem quer que seja, quando necessário.
Infelizmente, uma chaga terrível do nosso tempo é a falta deste caráter. Os
homens freqüentemente não se entendem entre si, porque, verdadeiros camaleões,
mudam de idéias, opiniões, linguagem, conforme as pessoas que se aproximam
(...). É hora de acabar com as meias consciências e os medos covardes. Por que
não usaremos também aqui, toda nossa liberdade? 20
“É tempo de
sacudir-nos, é tempo de agir.”
A
nós, que por divina misericórdia, somos fiéis, é preciso ocupar-nos em salvar a
sociedade e a pátria de maiores ruínas, tanto mais que também nós, digamo-lo
francamente, não somos isentos de culpa. Por muito tempo, fomos fracos,
incertos, quase medrosos, do olhar fosco e do andar orgulhoso dos audazes
demolidores da fé, que devia ser-nos mais cara que a vida, e se não queimamos
incenso a seus ídolos, escondemo-nos e os deixamos senhores para prejudicar e
esvaziar as caixas.
É
tempo de sacudir-nos, é tempo de agir (...). Em tamanha atividade febril, quem se coloca à parte é um traidor,
um covarde.
O
Evangelho está cheio de alegorias, de preceitos, de censuras, de anátemas
contra a indolência dos preguiçosos e a esterilidade das almas ociosas, e
nenhum vício é tão freqüente e tão desmedido como este.
Que
aproveita, direi a estes, soltar contínuos lamentos sobre os males que vos
afligem, se depois nada fazeis para remediá-los? Favorece a uma só coisa:
tornar mais destemidos os nossos inimigos, que nisto reconhecem a nossa
pusilanimidade, a nossa fraqueza. Não sabeis que os fatos de uma época têm, quase
sempre, suas raízes na época anterior; que a ordem dos fatos tem atrás de si a
ordem das idéias, e que, por conseqüência, se quisermos um futuro melhor,
devemos desde agora, prepará-lo? (...). Não
é bondade, não é fé, mas presunção condenável esperar tudo dos milagres. O
verdadeiro fiel acredita sim, em milagres, mas sabe muito bem que estes não são
os meios ordinários, com os quais Deus governa o mundo. Acredita nos milagres,
mas está bem persuadido de que estes, Deus não os realiza, nem
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Para satisfazer a vã
curiosidade dos tolos, nem para premiar a inércia e a preguiça de ninguém. 21
“A
sociedade cristã não afasta os Nicodemos,
mas quer o
fogo de Pedro.”
Os
tímidos e os pusilânimes tornem-se robustos, pois a sociedade cristã não esmaga
os fracos, mas tem necessidade de leões, não afasta os Nicodemos, mas quer o
fogo de Pedro (...). Enfim, se todos
os que são católicos por dentro, se mostrassem como tais, com os fatos, o bem
começaria a chocar-se com o mal e os direitos da maior parte dos cidadãos
seriam mais valorizados por quem os católicos se deixaram subjugar. Pois bem,
seja esta a vossa tarefa: operar o bem, unida, franca e corajosamente. 22
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