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Congregações Scalabrinianas dos Missionários
e Missionárias de São Carlos
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  • TERCEIRA PARTE     HOMEM DA PALAVRA E PARA A PALAVRA
    • 1.  PASTOR
      • c)    A PREGAÇÃO DA PALAVRA
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c)    A PREGAÇÃO DA PALAVRA

 

“O verbo Divino se fez Homem e veio, Palavra inefável,

falar aos homens.”

 

             Filhos caríssimos, a palavra de Deus devemos antes de tudo, ouvi-la. E por que? Exatamente porque é palavra de Deus; porque palavra d’Ele, que é nosso Criador, nosso Legislador, nosso Soberano, nosso Mestre, nosso Senhor, nosso Pai; porque sobretudo, sua palavra é verdade, verdade por essência, verdade absoluta, verdade suprema, imutável, eterna; porque depois da SS. Eucaristia, não existe sobre a terra nada que possa igualar, pela excelência, nobreza, santidades e grandeza a esta mesma palavra.

Os livros santos nos dizem que, desde toda a eternidade, Deus, contemplando a Si mesmo, pronuncia uma palavra, e esta palavra vasta, como sua imensidão, infinita como o seu ser, eficaz como sua onipotência, é a expressão viva, substancial, adequada de tudo aquilo que Ele é; é o seu Verbo, é a segunda Pessoa da augustíssima Trindade. Este Verbo divino se fez homem e veio, Palavra inefável, dizer aos homens a palavra de vida eterna. 27

 

“A palavra de Deus é tão necessária quanto a .”

 

             A , meus queridos, é o mais precioso de todos os tesouros, nascente de todas as graças, fundamento de todas as virtudes, raiz da nossa justificação, porta do céu. Mas como se pode ter esta ? Mediante a palavra de Deus. Isto ensina expressamente o Apóstolo, dizendo: “Quem é aquele que, invocando o Senhor será salvo? Aquele que primeiramente, acreditou. Mas como acreditará, nas verdades da , se não as conhece? E como as conhecerá, se não há quem as explique?” Portanto, a de Cristo deve ser ouvida, e a escuta vem pela palavra pregada por Cristo.

             “ deve ser ouvida: audição vem da palavra de Cristo.” Disto segue que se obtém a pela escuta da palavra de Deus; a palavra de Deus é tão necessária, quanto a .

             Sim, meus queridos, esta é a estrada que, via de regra, Deus estabeleceu para salvar os que n’Ele crêem. Poderia salvá-los por outras vias; pela via das aparições celestes, pela via das inspirações divinas, pela via dos milagres, e assim por diante. Foi do seu agrado, salvá-los por meio da pregação. 28


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“A palavra de Jesus Cristo não é menos que seu corpo.”

 

             Devemos ouvi-la, acolhendo-a, não como palavra do homem, mas como palavra de Deus. Dizei-me, irmãos, disse Sto. Agostinho, qual destas coisas parece-vos ter maior dignidade: a palavra de Deus ou o corpo de Jesus Cristo?

             Se quiserdes dizer a verdade, certamente deveis convir que a palavra de Jesus Cristo não é aos olhos de vossa , nada menos valiosa e digna de estima que o corpo de Cristo. A palavra de Deus não é menos que o Corpo de Cristo. Ora, se assim é, como é de fato, se não é menor nem menos salutar, nem menos divina que o Corpo de Cristo, a sua palavra, é fácil compreender que devemos ouvi-la com atenção, com respeito, com firme propósito de praticá-la.

             Deve ser ouvida com atenção, de modo que, no dizer do mesmo santo doutor, a diligência que usamos, quando nos é dado o Corpo de Cristo, para que nenhuma migalha caia por terra, devemos usá-la com a palavra divina, cuidando bem que, enquanto pensamos ou falamos de outra coisa, nenhuma delas se perca e caia fora do nosso coração. Este não é um vão escrúpulo, porque (conclui o santo, com termos que fazem tremer), porque não é menos culpado quem ouve negligentemente a palavra de Deus, que aquele que, por sua negligência, deixa cair por terra, uma mínima partícula do Corpo de Cristo. Não nos esqueçamos pois, ó caríssimos, que enquanto o pregador nos fala do púlpito, ou do altar, Jesus Cristo nos fala do céu; o som das palavras atinge nossos ouvidos por fora, mas o mestre está dentro, e por isso, ainda mais que os ouvidos do corpo, devemos abrir os ouvidos do espírito à sua palavra. Ele nos fará compreender de modo misterioso, mas claríssimo, aquilo que quer de nós. 29

 

“A eficácia da palavra está unida à divindade do mistério.”

 

             A palavra de Deus nada perde do seu valor e permanece sempre palavra de Deus, também nos lábios do mais ínfimo dos sacerdotes, legitimamente enviado, contanto que não ultrapasse os limites da ortodoxia; contanto que ele não tenha renunciado à , o Verbo de Deus se obriga a passar por sua boca, como sobre o altar se obriga a passar pelas mãos do ministro, também se o mais imperfeito.

             Um celebre orador diz que Deus escolheu o homem para iluminar, evangelizar, instruir, santificar os homens, mas não quis que a eficácia destes


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ministérios confiados ao homem, dependesse da virtude, da santidade do homem, caso contrário, os homens se tornariam devedores ao homem de sua santificação e de sua salvação. A eficácia da palavra de Deus, notai-o bem, ó caríssimos, é ligada, não aos dotes pessoais, não ao talento e nem mesmo à santidade do ministro, mas à divindade do ministério, à palavra do homem, enquanto ele falar de Jesus Cristo, e em nome de Jesus Cristo, ou antes, enquanto Jesus Cristo fala através do homem. 30

 

“A palavra evangélica é como uma carta enviada pelo Pai.”

 

             A palavra evangélica é como uma carta enviada pelo Pai celeste. Ora, um filho devotado não fica a considerar se o papel é bom ou ruim, se as letras são nítidas ou manchadas, sem dúvida, vai imediatamente àquilo que o pai lhe disse. Portanto, também a respeito da pregação, não se deve prestar atenção a quem fala, ou ao modo como fala, mas unicamente às verdades que anuncia. Então vosso ânimo será tomado pelo mais afetuoso e profundo respeito. (...)

             A palavra de Deus deve fazer de nós, cristãos de coração e de obras! Então deve primeiramente, transformar-se em afeto. Devemos não só entender a verdade, mas devemos amá-la e não só amá-la, mas também praticá-la. A verdade se transforma em caridade, como ensina o Apóstolo. O sinal que a palavra divina produziu em nós o seu fruto, são as obras, porque se a , sem a caridade é morta, a caridade, sem as obras não é caridade. Deus, quando fala, nos a conhecer o que devemos praticar, mas ao mesmo tempo, nos ajuda a praticar o que conhecemos. 31

 

“A Igreja sem a pregação eucarística seria

uma sociedade de utópicos.”

 

             Eis o significado da vossa pregação. Aqui está toda a salvação e a prosperidade da Igreja. Fruto desta pregação é o deixar atrás a infância, viver e caminhar pelos caminhos da prudência. Que seria da Igreja, sem a pregação eucarística?

             Uma religião, sem sacrifício, uma sociedade de utópicos, uma casa construída sobre a areia; Cristo mesmo se tornaria uma fábula, um mito. 32


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“O sacrifício sem a palavra seria uma comemoração ineficaz.”

 

             Cristo na eucaristia é a força e a sabedoria de Deus, e nós pregamos Cristo, força e sabedoria de Deus. Refleti sobre o conceito de pregação. Cristo, instituindo o sacrifício e consagrando o sacerdote, disse: Fazei isto em minha memória. (lCor 11). Com seu mesmo modo de agir, uniu a pregação ao sacrifício: o sacrifício sem a palavra seria uma comemoração ineficaz. Sabeis com que sublime a divina eloqüência, Cristo falou aos apóstolos, na última ceia, antes e depois da instituição da eucaristia. Os apóstolos continuaram a pregação (...).  Dedicavam-se à pregação da palavra e os fiéis, escutando-os perseveravam na participação da fração do pio, na comunidade (...).

             O divino fundador da Igreja ordenou aos apóstolos, e neles a nós, o ministério da pregação: pregai a todos o evangelho. Depois da instituição da Eucaristia: Fazei isto em minha memória. Aquilo que me vedes fazer, recordai-o com a renovação do sacrifício, e conservai viva a minha memória no coração dos fiéis, com a vossa pregação. O reino de Cristo se aperfeiçoa mediante a Eucaristia, e vós, eleitos a cooperar com esta ação divina, deveis aplicar-vos incessantemente à pregação eucarística, para dilatar e consolidar o reino de Deus. Esta pregação nunca foi tão necessária como em nossos dias, dos quais o profeta poderia dizer “a mesa do Senhor foi desprezada”.

Por que? Porque o dom de Deus é pouco conhecido: a grandeza de Cristo, neste sacramento, é grandeza de amor; em outras palavras: porque raramente se prega Cristo no seu sacramento. Talvez alguns culparão os tempos, os erros que se difundem, os escritos ímpios, os novos escândalos que se multiplicam a cada dia: acusarão as profanações, a crassa indiferença, a diminuição da em muitos. Mas onde nascem estes males, senão da falta de pregação? Escutai o apóstolo Paulo: A vem pela pregação, e a pregação se exerce pela palavra de Cristo (Rm 10,17). 33

 

“A pregação e o sacrifício eucarístico: os dois poderes com que Cristo vos revestiu.”

 

             Ponderai a profecia da Sabedoria: “Anunciarei o teu nome, aos meus irmãos, louvar-te-ei, em meio a assembléia.” (Si 21).

             Cristo realiza a profecia, não com a sua boca, mas com a nossa; com a vossa pregação e com o sacrifício eucarístico. São os dois poderes com que Cristo vos revestiu. (...)  Mediante o sacerdócio e o banquete eucarístico


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o esplendor de Cristo será como uma luz: Tornou a estender e “esquadrinhou a terra, olhou e as nações se dispersaram, as montanhas seculares se despedaçaram, se inclinaram os cumes do mundo”. Eis a vitória e a conquista da terra, prometida por Cristo: ainda não vemos o mundo conquistado; mas levantai os olhos e olhai os campos que já loureja a ceifa. 34

 

“Na pregação uni o útil ao agradável.”

 

             Nesta mesa, Cristo uniu o útil ao agradável; útil porque, como diz o poeta, revigora o homem perdido pelos encantos do fruto proibido, com um alimento melhor; vence o veneno da serpente com o sagrado sangue. Doce, porque exclama a esposa, “seus frutos são minha delícia.”

             Uni os dois aspectos na vossa pregação; o útil com uma explicação adequada do mistério eucarístico, segundo a analogia da , confirmando-a, com a autoridade dos Padres e dos Doutores; o doce, apoiando os vossos argumentos também em razões fundadas, hauridas das ciências.

             Não deveis deixar-vos desencorajar pelo temor de que os fiéis, não compreendam. A compreensão dos mistérios não é fruto da inteligência natural, mas da luz da , que Deus infunde na ocasião da pregação, abrindo-lhes os corações. Depois de tanto ouvir, tornam-se inteligíveis também aqueles pontos que, a princípio, pareciam menos acessíveis, exatamente, porque se pregava raramente.

             Fostes iniciados neste compromisso desde a vossa juventude; mas, talvez, poucos progrediram neste campo, não prestando atenção às palavras de Cristo: Esta é a vida eterna: que te conheçam, único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo que enviaste.” (Jo 17,3). Enganar-nos-emos se, contentando-nos com um conhecimento medíocre, nos limitássemos a apresentar ao povo, sempre leite e nunca alimento sólido. A eucaristia é ao mesmo tempo, o leite para as crianças e alimento para os fortes, o pão dos robustos. Portanto, falemos aos cristãos da sabedoria escondida no mistério.

             Estudai sobretudo Cristo e o seu sacramento; não preguemos somente o Cristo, concebido pela obra do Espírito Santo, nascido da Virgem Maria, que padeceu, morreu, ressuscitou, subiu aos céus, para ser nosso advogado junto ao Pai; mas preguemos também o Cristo, que cada dia perdoa os pecados, com a oblação de si mesmo e se torna, para todos nós, sabedoria de Deus, justificação, redenção; preguemos o Cristo que habita em nós, até a consumação do mundo, o Cristo que vive no Sacramento e que tudo atrai a


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si. Cristo não é uma aparição que logo desaparece, mas é Jesus Cristo ontem, hoje e sempre. 35

 

“Não é a palavra de Deus que alguns pregam,

mas a palavra do homem.”

 

             Talvez nunca se pregou tanto, como no momento atual, mas porque o fruto que decorre da pregação é tão pouco?

Comumente costuma-se culpar os ouvintes; a bem da verdade, acontece muitas vezes, que a mística semente cai em uma terra ingrata, onde pedras e espinhos impedem que germine e cresça até a maturidade. Mas talvez a culpa não é também, freqüentemente, de quem vai semeando no campo do Senhor?

Sim, infelizmente, ó irmãos! é inútil disfarçar; muitas e muitas pregações tornam-se infrutíferas, porque já não é a palavra de Deus que alguns pregam, mas a palavra do homem. Quer-se ostentar, escreve um ilustre orador, uma ciência moderna, quer-se surpreender e maravilhar os ouvintes, com artifícios de retórica, com jogos de memória, com uma série interminável de nomes, com citações de autores de todos os tipos, com uma eloqüência jornalística, com alusões que aguçam a curiosidade doentia do povo, com o ardor vertiginoso da recitação (já entrevista por S. Jerônimo) com a pose teatral, com a força dos pulmões, com gritos que ofendem e martirizam os ouvidos. Mas eu não me cansarei nunca de estigmatizar tal eloqüência, aquela eloqüência que hoje se desejaria colocar em voga, com grande detrimento das almas, com grande descrédito da pregação; aquela eloqüência, rica de figuras e pobre de pensamentos, fecunda de expressões e estéril de sentimentos, faustosa aparência de uma opulência enganadora. Serve-se do sagrado ministério de instruir e da palavra da verdade, para mendigar a adulação, lisonjear os ouvidos e deixar em paz as paixões; em vez de pregar Jesus Cristo, prega somente a si mesmo; tal eloqüência é ostentação de espíritos levianos, de almas profanas, que se perdem em doutrinas vagas, em frívolas descrições, em pinturas muito delicadas, em conceitos extravagantes, em períodos circulares, em palavras, em frases afetadas, em artícios, em flores, em ornamentos, que o gosto mais indulgente perdoaria, apenas em um romance, mas a verdade santa é obrigada a se envergonhar, como uma honesta matrona, ao ver-se coberta com as vestes de uma bailarina; aquela eloqüência que profana na substância, não menos que


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na forma, rebaixa o ministro sacro até o comediante, e a comédia, o ministério divino. 36

 

Devedores aos sábios e aos ignorantes.”

 

             Os sagrados oradores, e especialmente os párocos e seus coadjutores, recordem-se que não devem falar com atraentes palavras de sabedoria humana, mas com demonstrações de espírito e de virtude. Lembrem-se que são devedores aos sábios e aos ignorantes, e que por isso devem aplicar-se à simplicidade, à clareza e à brevidade.

             Nunca subam ao púlpito sem preparar-se, nem sem ter invocado as luzes do Espírito Santo. Recordem-se que as palavras têm o objetivo de iluminar a inteligência, mas muito mais de estimular o coração, portanto, não se deve omitir a explicação das mais altas verdades da ; a pregação, todavia, deve conter sempre algo que toque a prática, também nos panegíricos. 37

 

 




27.           A Palavra Divina. Placência, 1897, pp. 4-6.



28.           Id., pp. 7-9.



29.   Id., pp. 31-32.



30.           Id., p. 30.



31.           Id., pp. 33-34.



32.           Discurso do Sínodo, 29-8-1899. Sínodo Diocesano Placentino Terceiro. Placência, 1900, p. 239.



33. Id., pp. 240-241.



34.   Id., p. 245.



35. Id., pp. 243-244.



36.           Carta circular (...) ao venerável Clero da cidade e Diocese de Placência, 1898, pp. 3-5.



37.   Sínodo Diocesano Placentino. Placência, 1893, p. 31.






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