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a) AMOR À VERDADE
O espírito do mundo é um
espírito de duplicidade e de desconfiança. Assim como, desta fonte, nasce o
amor próprio, do mesmo modo, ele não busca a verdade, senão enquanto a verdade
posas agradá-lo. Não se define pela piedade, senão enquanto a piedade encontra
partidários favoráveis. Não elogia a virtude, senão nos lugares onde a virtude
é honrada. Eis o espírito com o qual muitos se deixam governar, um espírito
tímido e conivente, - 328 -
receia
ser de Deus e, em todas as ocasiões, nas quais deve declarar-se por Ele, vacila
e onde, pela sua glória fosse necessário expor-se ao escárneo e às críticas dos
homens, volta atrás. O que e covardia de espírito, chama-se prudência. Onde se
trata de desgostar alguém, para não faltar ao dever, considera legítima a
transgressão, e a primeira coisa que se examina nos passos que Deus exige de
nós, é se o mundo nos dará sua aprovação; e para não perder a estima do mundo,
finge ser mundano, fala-se a linguagem do mundo, aplaude-se as máximas do
mundo, procura acomodar-se aos hábitos do mundo. 1
“O culto da
verdade até o sangue.”
O
combate mais forte neste mundo é aquele de dizer a verdade de Cristo, tanto aos
inimigos, como aos amigos, e dizê-la na prosperidade e na dor, nas trevas e na
luz, nos cárceres e nos cortes, à plebe e aos poderosos, em particular e em
público, sem ambigüidade, sem medo, sem ânsia no coração, mas antes com sublime
desprezo dos perigos que é o privilégio das grandes almas.
Este é o forte combate do
qual falou Jesus Cristo, quando disse ao governador do povo romano: para isto, eu
nasci, e para isto vim ao mundo, para dar testemunho da verdade. Este foi o
programa que Jesus Cristo recebeu do seu Pai e deixou aos seus amigos, como
herança: o culto à verdade até o sangue. 2
“Não podeis
deixar de amar a verdade.”
Padre Santo, vós
conheceis a sinceridade do meu espírito, conheceis os sacrifícios não leves
feitos pela glória da Igreja e para mostrar-me o que sinto que sou, todo para
vós e para Vossa causa, que é aquela de Deus.
Pois bem, prostrado aos
vossos pés, vos peço uma só graça: chamar à ordem aqueles elementos
extra-hierárquicos, especialmente os jornalistas (chefiados pelo Observador de
Milão), que ostentando acatamento ao sucessor de S. Pedro devoção que não têm,
mas usam de capa e veículo de idéias partidárias para tutelar interesses de
particulares, ofendem a suprema autoridade dos Bispos, desonram a Igreja e a
tornam desprezível diante das pessoas sérias, com as suas violentas e
escandalosas polêmicas. E rompem aquela admirável união entre os Pastores que
constituiu, até agora uma de suas glórias mais belas. E reduzem o catolicismo a
um grupo de fanáticos, excluindo as mais belas inteligências. - 329 -
Como foi tratado o
célebre Abade Stoppani, glória da nação e da Igreja? Como as outras
instituições, padres e leigos? Meu Deus, salvai a vossa Esposa tão
horrivelmente lesada!
De talento poderoso como
sois, de coração modelado pelo de Jesus Cristo de quem sois o Vigário, vós não
podeis deixar de amar a verdade, não podeis não desejar que ela seja conhecida
como desejavam os santos; estou mais que certo, SSmo. Padre, dignar-vos-eis
perdoar a liberdade desta minha carta, ditada unicamente pelo afeto vivíssimo
da glória do vosso imortal Pontificado manchado e diminuído pela atrevida
impunidade de um partido cego e petulante. 3
“A santa
coragem de dizer a verdade.”
Continue, caríssimo Pe.
Luís, a vir em socorro da Igreja com os seus escritos, pois tanto necessitamos,
sobretudo em nossos dias, de quem convoque as mentes, precisamente ao estudo do
Evangelho e da doutrina cristã, e assim, procure reconduzir Jesus Cristo, às
famílias e à sociedade.
Tenho para mim, que esta
seja a maior necessidade, o meio mais seguro, ou melhor, único, para conseguir
o que em vão acreditou-se e acredita-se poder conseguir, com outros meios.
Vendedores de boatos, como Sto. Agostinho chamaria essa gente, temos até
demais... Digo isto, porque já são poucos os homens que têm a santa coragem de
dizer a verdade, conforme a expressão evangélica: “sim, sim, não, não”. Muito
facilmente, alguns verdadeiramente doutos e merecedores colocam-se de fora, por
causa dos insipientes clamores de quem não tem em mira senão o próprio
interesse.4
“Ai da
religião, quando os Bispos são obrigados a calar-se.”
Aqui, absolutamente eu devo
justificar, ou devo ser justificado.
Vir aconselhar-me o
silêncio seria, neste caso, acrescentar ultraje sobre os ultrajes do sacrilégio
difamador, seria como dizer: nada importa à Autoridade Episcopal ser atirada na
lama; seria acreditar, na voz corrente, que se tem medo do governo oculto de
certos homens astutos e que se é impotente para dominá-los. Ai, exclamaria, um
doutor da Igreja, ai da religião, quando os Bispos são obrigados a calar-se! - 330 -
Eminentíssimo, estou
errado? Diga ao S. Padre que me corrija e me terá como sempre, filho submisso,
obediente em tudo Mas
se ao contrário, encontro-me ao lado da verdade, da justiça, do direito, como
se permitirá que um Bispo, embora o último e mais indigno dos Bispos, tenha que
ser publicamente levado ao tribunal por um padre, que de padre só tem mesmo o
hábito e a aparência?
Para concluir: peço
novamente, com todo ardor, testemunho favorável, que me creio com direito e no
dever de pedir, invoco-o e o espero.
Eminentíssimo, perdoará
se lhe sou importuno mas creia, torna-se mais importuno a mim, ser constrangido
a importuná-lo novamente.
Espero que desta vez se
dignará ouvir-me, de tal sorte que não sendo atordoado por outras coisas, eu
possa atender sereno e tranqüilo a coisas mais relevantes do que estas, e possa
orientar todas as minhas fracas forças para a salvação das almas, a mim
confiadas, e na defesa dos sacrossantos direitos da S. Sé, que são as duas
coisas que mais me são caras. 5
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