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d) O DESÍGNIO DE DEUS
“A migração
é um bem e um mal.”
É indubitavelmente um
bem, fonte de bem estar para quem vai e para quem fica, verdadeira válvula de
segurança social, aliviando o solo do excesso da população, abrindo novos
caminhos ao comércio e às indústrias, fundindo e aperfeiçoando as civilizações,
alargando o conceito de pátria, além dos limites materiais, fazendo do mundo a
pátria do homem; mas é sempre um gravíssimo mal, individual e patriótico,
quando se deixa caminhar assim sem lei, sem freio, sem direção, sem tutela
eficaz: não forças vivas e inteligentes ordenadas à conquista do bem-estar
individual e social, mas forças que se chocam e freqüentemente se destróem
reciprocamente, atividade desfrutada, em prejuízo e vergonha do país de origem.
Não águas capazes de fecundar, mas
torrentes sem leito, que perdem o tesouro de suas águas por entre as pedras e
os abrolhos, quando não arrastam os campos já fecundados. 14
“É
instrumento da Providência também através de catástrofes.”
A migração é lei da
natureza. O mundo físico, como o mundo humano estão submetidos a esta força que
move e mistura, sem destruir, os elementos da vida, que transporta organismos nascidos
em um determinado lugar e os semeia no espaço, transformando-os e
aperfeiçoando-os de modo a renovar em cada instante o milagre da criação. - 370 -
Migram as sementes nas
asas dos ventos, migram as plantas de continente a continente, levadas pelas
correntes das águas, migram os pássaros e os animais e, mais que todos, migra o
homem ora em forma coletiva, ora em forma isolada, mas sempre lnstru mento
daquela Providência que preside e guia os destinos humanos, também através de
catástrofes, para a meta, que é o aperfeiçoa. mento do homem, sobre a terra e a
glória de Deus nos céus.
Isto nos diz a Revelação
divina, isto nos ensinam a história e a biologia moderna, e é só alcançando
esta tríplice fonte da verdade, que poderemos deduzir as leis reguladoras do
fenômeno migratório e estabelecer os preceitos de sabedoria prática, que deve
discipliná-los, em toda sua rica variedade de formas. 15
“A grandeza
religiosa e moral da causa dos migrantes.”
A grandeza religiosa e moral da causa dos
nossos migrantes italianos, e a grandeza política e material desse hospitaleiro
país que (como me dizia há poucos dias o insígne Presidente da República)
abre-lhes a dois batentes, as portas da hospitalidade. São duas grandezas
feitas para se confundirem em uma só e para manifestar ao século vinte, os
segredos de uma nova era, onde não poderá faltar nem as bênçãos de Deus, nem as
conquistas da civilização (...).
Percorri uma parte
considerável da vossa gloriosa pátria e admirei com alegria misteriosa, que me
entusiasmava, os grandes desígnios de Deus sobre a América. Celebrando o quarto
centenário de Cristóvão Colombo, fui convidado a fazer conferências sobre isto,
na Itália, pela simples razão de que a família de Colombo pertencia à minha
querida Diocese de Placência, embora ele tivesse nascido em Gênova.
Uma destas conferências
se intitulava: “Os desígnios de Deus sobre a América”. Pois bem, aquilo que eu
pensava então, vi confirmado, durante a minha feliz estada entre vós, na minha
longa viagem, pelos vários Estados da União. 16
“Matura-se
a união de todos os homens de boa vontade, com Deus, por Jesus Cristo.”
Aqui portanto, um dia, se
a inércia, se a ignorância dos caminhos de Deus, se o repouso sobre os triunfos
conquistados, se a opressão de santas - 371 -
aspirações,
não desviarem os povos do plano divino, todas as nações terão gerações
numerosas, ricas, felizes, morais, religiosas, as quais, cada uma conservando
embora as caracteríscas próprias de sua nacionalidade, serão estreitamente
unidas.
Desta terra de bênçãos
elevar-se-ão inspirações, desenvolver-se-ão princípios, desdobrar-se-ão novas
forças misteriosas, que virão regenerar, reavivar o velho mundo, ensinando-lhe
a verdadeira economia da liberdade, da fraternidade, da igualdade, ensinando-lhe
que povos diferentes, pela origem podem muito bem, conservar sua língua, sua
existência nacional própria, embora sendo política e religiosamente unidos, sem
barreiras para ciúmes e divisões, sem exércitos, para se empobrecerem e se
destruírem uns aos outros (...).
Eu espero, sim, á
senhores, eu o espero. Porque, enquanto o mundo se agita deslumbrado, pelo seu
progresso, enquanto o homem se exalta com suas conquistas sobre a matéria e
manda como senhor na natureza, desentranhando o solo, subjugando o raio,
confundindo as águas dos oceanos com os cortes dos ístimos, suprimindo as
distâncias; enquanto os povos caem, ressurgem, e se repovoam; enquanto as raças
se misturam, se estendem e se confundem, através dos rumores das nossas
máquinas, para além deste trabalho febril de todas estas obras gigantescas e
não sem elas, amadurece na terra uma obra bem mais ampla, bem mais nobre, bem
mais sublime: a união com Deus, por Jesus Cristo de todos os homens de boa
vontade. 17
“A Igreja
Católica vitoriosa e pacificadora.”
Os servidores de Deus que trabalham inconscientemente para cumprir os
seus desígnios são numerosos, em todos os tempos, mas nas grandes épocas
históricas de renovação social são muito mais do que se conhece, mais do que se pensa: eles são inumeráveis. O fim
supremo da humanidade pré-fixado pela providência não é a conquista da matéria,
por meio da ciência mais ou menos avançada, e nem mesmo a formação dos grandes
povos nos quais se encarna hora por hora o gênio da força, do saber, da
riqueza, não; mas a união das almas, em Deus, por meio de Jesus Cristo e do seu
representante visível, o Romano Pontífice. Os obstáculos que ainda se opõem ao
altíssimo desígnio, desaparecerão pouco a pouco, e virá o dia, e virá antes de
tudo neste vosso grande e glorioso país, no qual as nações conhecerão onde está
a verdadeira grandeza, sentirão necessidade de retornar ao Pai e retornarão.
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Que dia será aquele,
senhores! Dia feliz, no qual todas as inflexões, todas as vozes, em diferentes
línguas, elevarão ao Onipotente o cântico de louvor e de ação de graças. O sol
da verdade resplandecerá mais luminoso e o arco-íris da paz se curvará sobre a
terra, em todas as suas admiráveis cores. Será como um arco de triunfo sob o
qual a Igreja Católica passará vitoriosa e pacificadora, atraindo a si o mundo
moderno; e a sociedade, voltando a ser cristã, continuará na ordem e na
justiça, a trilhar o cami. nho da verdadeira liberdade, da verdadeira
civilização, do verda. deiro progresso.
Apressemos, com votos,
com orações, com obras, aquele dia abençoado! 18
“A antiga
piedade está se despertando.”
Estou comovido sobretudo
por quanto vi na minha longa peregrinação. Vi conservada a fé católica, em meio
a dificuldades, sem número, nas fazendas, do grande Estado de São Paulo; vi a
fé das colônias do Paraná e faço votos que também nas cidades da América
Latina, se imite as cidades da América do Norte. Lá, surgem igrejas italianas
em todas as cidades. Os nossos Missionários as assistem com outros religiosos.
A piedade antiga está se despertando; a credibilidade e a consideração junto às
autoridades aumenta cada dia, verificando-se, uma vez mais que, onde um
apóstolo ergue a cruz, a civilização surge espontânea e o bem-estar material
aumenta. 19
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