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b) OS SANTOS
“Os Santos
são prodígios da graça de Deus.”
Como
as obras da criação cantam a glória de Deus, autor da natureza, assim as obras
da santificação exaltam a glória de Deus, autor da graça. Todo esplendor, onde
refulge a virtude dos Santos, se reflete sobre Ele, que nos Santos operou
coisas grandes, maravilhosas. De fato, o que são os Santos senão prodígios da
graça de Deus? Ah! que um homem não retenha quase nada mais da humanidade
corrupta, que pela prática da abnegação - 75 -
cristã
de si mesmo, tenha conseguido subjugar a concupiscência carnal, vencer os
estímulos da cobiça, a domar a febre do orgulho; que tenha dado ovo curso, uma
nova direção às inclinações carnais e terrenas não viver mais, senão das
espirituais e celestes; que se transformado inteiramente, por meio da caridade
mais generosa mais pura, mais perfeita, não viva senão de Deus, por Deus e com
Deus. Isto, diz Santo Agostinho, é um prodígio tão grande, como chamar da morte
à vida, um cadáver. Prodígio, que não pode ser obra do homem, mas só de Deus,
porque Deus formou o homem; Ele só pode transformá-lo e sobre as ruínas do
homem velho que se identifica com Adão pecador, restabelecer o homem novo que
se torna uma só coisa, com Jesus Cristo. 13
“Olhemos
para a fé dos Santos.”
Grandes,
no reino de Deus, pelas obras praticadas aqui na terra na fé e pela fé, os
Santos todos nos pregam sobre todas as coisas, glórias da nossa fé; daquela fé,
que é o tesouro da vida doméstica, que reaviva o amor dos filhos, para com os
pais e tudo conduz à perfeição e à santidade. A fé une, em vínculos de suaves
relações, todas as pessoas e as coisas do mundo, e nos mantém ativos para o
grande dia da prestação de contas, recordando-nos, a exemplo dos Santos, que a
vida do cristão é uma luta sobre a terra; que nós somos aqui soldados que
pelejam difíceis batalhas, para ganhar a bem-aventurança imortal. Estamos agora
em meio ao fogo, que nos purifica da escória. Somos peregrinos em direção à
pátria, mas continuamente assediados por poderosos e cruéis inimigos. Se as
fadigas da luta nos debilitam, se a chama da purificação nos queima, se o
caminho nos prosta, olhemos para a coroa do triunfo, olhemos para a fé dos
Santos, olhemos antes para a fé que professamos e nossos ânimos crescerão. 14
“Não os
milagres e os dons extraordinários que fazem os Santos.”
Acredita-se,
facilmente, que, para chegar à santidade, é necessário distinguir-se por dons
extraordinários e tornar-se singulares por ações luminosas. Não, meus filhos.
Para ser santo não é necessário nem predizer o futuro, como os profetas, nem
operar prodígios como os taumaturgos, nem ir pregar o Evangelho a povos e
bárbaros, como os Apóstolos, nem derramar o próprio sangue, como os mártires.
Nada disso. Quando o rico do Evangelho perguntou a Jesus Cristo, o que devia
fazer para ser salvo, o Divino Mestre - 76 -
respondeu
unicamente: Se queres chegar à vida eterna, observa os mandamentos. A vida
cristã está toda aqui. Observar fielmente a lei de Deus, cumprir com exatidão
os deveres do próprio estado. Existe um grande número de pessoas que chegaram à
santidade, seguindo este caminho. Nem todos os Santos fizeram ações
extraordinárias, não foram portentos de obras e de eloqüência, nem foram
admirados pelo prodígio do saber. Muitíssimos, ignorados pelo mundo, nunca
saíram de um estado obscuro e sempre tiveram vida comum. Maria mesma, não foi
assinalada com nenhum dom extraordinário e não se lê na Escritura que Ela,
durante sua carreira mortal, tivesse feito algum milagre.
Nem
por isso ela deixou de ser considerada como a mais santa das criaturas. Não são
os milagres, os dons extraordinários, que fazem os Santos, e os maiores Santos,
mas a virtude. (...)
Muitos
Santos que hoje veneramos, nunca saíram do círculo da vida doméstica, mas tudo
faziam continuamente para cumprir os deveres, atentos em nobilitar suas
ocupações ordinárias, mediante a reta intenção, agindo sempre com fins
sobrenaturais. 15
“O que eles
fizeram por que não podemos nós também fazer?”
Um
grande número de pessoas se tornaram santos antes de nós. O que eles fizeram,
por que não podemos nós fazer? Para suprimir as dificuldades, elevemos
frequentemente os olhos ao céu, pensemos que todas as fadigas todas as
dificuldades que se possa sofrer, não podem nunca ser proporcionais à grandeza
da recompensa. Os sofrimentos da vida presente não são comparáveis à glória
futura que em nós será revelada.
Um
cansaço de curta duração nos coloca de posse de uma feliz eternidade, momentâneas
e leves nossas tribulações, uma tribulação leve e passageira nos garante uma
glória eterna.
À
vista dos Santos, dos quais celebramos, hoje, os triunfos, consolemo-nos, pois
a santidade não é tão difícil.
Com
Deus que nos conforta, com um Deus que nos dá a mão, que nos inspira vigor,
podemos encontrar dificuldades no caminho da nossa salvação eterna? Se ainda
temeis, pensai nos Santos que hoje festejamos. Eles foram nossos irmãos aqui na
terra, eram unidos a nós pela fé, pela pátria, pelo conhecimento e pelo sangue.
Eles, que em vida foram animados por tão viva caridade, por um zelo tão
ardente, para ajudar o próximo, agora que sua caridade aperfeiçoa-se,
consumou-se, no céu terão por nós, seus irmãos, menos interesse pela nossa
santificação, pela nossa salvação? Oh! se pudéssemos - 77 -
vê-los, com que empenho estão advogando hoje e sempre,
junto ao trono de Deus, a nossa causa, como compreenderíamos logo e provaríamos
que a santidade não é tão difícil, como geralmente se pensa, antes, é possível
e portanto obrigatória para todos e para cada um de nós, chamados que somos a
sermos santos na terra, a fim de reinar com os Santos no céu. 16
“Vivamos
cristãmente e seremos santos.”
Um santo, um perfeito cristão.
Vivamos cristãmente e seremos Santos. O que formou os Santos mais ilustres, o
que a Igreja reconhece, não foram os dons extraordinários, as aparências
luminosas, os grandes milagres, as visões, os êxtases. Foi aquela fidelidade,
aquela exatidão, com que cumpriram constantemente os deveres de seu estado e os
cumpriram por causa de Deus. Eis o verdadeiro, essencial cárater da santidade.
E eis o que devemos propor-nos, se queremos chegar a ser partícipes da glória
dos Santos. 17
“Grande
poder dos mártires junto a Deus.”
Os
Mártires sempre foram objeto de culto especial na Igreja de Jesus Cristo. Ela,
desde os tempos dos Apóstolos, respeitou as cinzas dos Mártires, como coisa
venerável e sagrada, e sobre seus sepulcros costumava celebrar os sacrossantos
Mistérios. O que existe de mais justo, mais religioso, mais digno de respeito,
do que oferecer o Sangue de Jesus Cristo, sobre o Corpo e sobre os despojos de
seus discípulos, que derramaram o sangue por Ele?
Não
deve ser grato a Jesus Cristo misturar o seu sacrifício com o dos Mártires, os
quais são, com Ele, uma mesma vítima?
Sempre
foi grande o poder dos Mártires junto de Deus. Membros e relíquias daqueles
homens maravilhosos, que mais viveram da vida de Jesus Cristo que da própria, a
Ele incorporados pelo espírito de santificação e com Ele um só corpo, e quase
uma mesma subsistência, com seu válido favor, protegem e ajudam quem eles
recorrem seguros e confiam no seu poder. (...)
Tudo
é concedido às suas orações, tudo é dado por seus méritos. Eles, reinando com
Cristo, derramam sobre os povos, as mais esco1hidas bênçãos, Santo Agostinho
assegura-nos que os milagres dos tempos Apostólicos, se renovam diante de todas
as nações, em virtude dos corpos dos Mártires. Eles deram testemunho de Deus
com seu Sangue e Deus concede aos fiéis graças e prodígios, por suas
intercessões. 18
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“Os
sagrados penhores da Santa Igreja Placentina.”
Confesso-vos
ter sido plenificado de grande
consolações, e alegria de Deus, vendo, na visita às Igrejas, desta cidade e
Diocese, fontes salutares e perenes, das quais brotam benefícios para o povo
cristão e emana um suavíssjmo perfume.
Refiro-me
às sagradas relíquias dos Santos, insignes monumentos da fé e da caridade, das
quais o misericordioso Senhor se dignou enriquecer a Santa Igreja Placentina.
(...)
Limitar-me-ei a falar a vossa
veneranda e devotíssima Congregação sobre o reconhecimento dos despojos do
ilustre Mártir de Cristo, Antonino da Legião Tebana, Patrono Principal e de São
Vitor, primeiro bispo desta Santa Igreja Placentina. Encorajado pelo Conselho
do Exmo. Card. Domenico Bartolini, grande perito na matéria, quando retornando
a Roma, em outubro de 1877, foi meu hóspede, por algum tempo baseando-me em um
colóquio sobre o assunto, com o sumo Pontífice Leão XIII, o fiz nos dias 30 e
31 de maio de 1878. (...)
Com que alegria espiritual e exultação
de ânimo, eu vi os sagrados penhores, mais preciosos que o ouro e que as pedras
preciosas, que benignamente protegem e custodiam esta Santa Igreja Placentina.
Ponderei, mais atentamente, a
necessidade, que temos, que estes santos, com os quais temos uma certa
familiaridade, movidos pela nossa particular veneração e culto, supliquem a
Deus, por mim e pelos meus diletíssimos filhos, aquela fortaleza na fé, que é
necessária, ao cristão do nosso tempo, para vencer. Por isso, desejando
suscitar no meu rebanho o sentimento de devoção para com os já mencionados
Santos, que alimentaram a fé e a santidade dos nossos avós e pensando de que modo
poderíamos obter este fim, percebi que uma coisa faltava para inflamar meus
filhos, à devoção para com os benéficos Patronos e Pais: divulgar seus feitos,
o sepulcro, as relíquias e o culto com oportunos e doutos estudos, que
ilustrassem acurada e inteligentemente, os monumentos e os documentos, que a
eles se referem e apresentá-los a sua reflexão. Depois, transladar os ossos dos
Santos Antonino e Vitor de modo que, em determinadas solenidades ou na
iminência de qualquer calamidade, pudessem ser expostos publicamente, aos olhos
e à veneração dos fiéis. 19
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“É-nos dado
ver os sagrados despojos.”
Há
dois anos, com imensa consolação para nós, cumprimos a Sagrada Visita Pastoral,
na insigne Basílica de Santo Antonino. Naquela ocasião ordenamos a abertura da
grande urna de mármore, colocada sob a mesa do altar-mor e isto para fazer um
solene reconhecimento das relíquias dos Santos Antonino e Vitor ali sepultados.
Desde
séculos, aquela urna não tinha sido aberta; se bem que externamente apresentasse
sinais manifestos dos tesouros que encerrava, sérias dúvidas apareceram em
torno dos mesmos.
Que
alegria a nossa, quando nos foi dado ver com nossos olhos, os sagrados despojos
dos dois Santos! Qual não foi a nossa comoção, quando beijamos a ampola que
continha as relíquias daquele sangue bendito, que foi derramado por Antonino,
em testemunho da fé!
É sem dúvida, um traço singular da Providência de Deus, que este
preciosíssimo vidro tenha sido conservado incólume, em meio às ruínas a que a
Basílica do Santo Patrono, situada por séculos, fora dos muros da nossa cidade,
sendo várias vezes sujeitada, por causa de invasões bárbaras, a incêndios e a
guerras. Mas, é um traço ainda mais admirável desta mesma Providência divina e
digno de todo reconhecimento, que o glorioso sangue de Antonino, recolhido
neste vidro, se conserve, depois de tantos e tantos séculos, em tal estado de
oferecer também, em nossos dias, provas certíssimas de sua primitiva natureza,
enquanto, em outros casos semelhantes a este, a ciência não chegou a
estabelecer sobre eles, senão a probabilidade.
Alegremo-nos
e exultemos! Placência é rica, sem dúvida, de muitos insignes e preciosos
monumentos, verdadeiros tesouros de arte, mas nenhum deles é mais estimável, aos
olhos da fé, que este sangue glorioso. Nenhum mais insigne que os despojos de
Antonino e Vitor. 20
“Pais e
Mestres na fé.”
São
os despojos gloriosos daqueles que foram nossos pais e mestres na fé; os
despojos que gotejaram um dia sangue vivo, aqueles despojos junto aos quais
tantos se alegram de poder um dia estabelecer suas moradas. Diante deles, ó
diletíssimos, corriam ajoe1har-se, confiantes, os nossos antepassados.
Penduravam diante deles seus dons e traziam, em todo tempo favores importantíssimos.
Deles, os Gregórios os Savinos, os Mouros, os - 80 -
Fulchos,
os Gerardi, os Alberti, os Prancloni, os Paulos Burali de Arezzo, os Filippes
Suzani, os Opilús, os Gelasiis, os Raimondos os Contardis as Franche e tantos
outros hauriam, conforto em suas tribulações alento e coragem para avançarem,
sempre mais, nos caminhos do céu. Eram estes sagrados despojos, o eixo em torno
do qual girava, sobretudo na idade média, o bom senso e a vida, tanto
particular, quanto pública, dos cidadãos. Ao redor deles, o povo se estreitava
nas maiores necessidades da pátria e lhe experimentavam os efeitos salutares.
Os representantes das comunidades os colégios e os soldados vinham em pelotões,
cada ano, depor diante dos mesmos, suas ofertas. Era na presença deles, que se
tratavam os destinos comuns. Junto deles se depositavam documentos públicos. À
sua sombra se custodiavam os troféus da vitória. 21
“Não
esqueçais as tribulações que sofreram
nossos pais.”
Esta veneranda Basílica, este
insigne monumento da piedade de nossos avós é quase um perene testemunho do
nascimento do cristianismo entre nós. Oh! que ela vos faça lembrar a fé dos
tempos antigos. Não esqueçais nunca, o que fez e sofreu Antonino, para nos
gerar para o Evangelho. Não esqueçais as tribulações sofridas, por nossos pais
e os perigos dos quais eles foram ao encontro, para conquistar e para conservar
os direitos e o título de filhos de Deus. (...)
Esta fé, deve conduzir-vos à
salvação; permanecei firmes, pensando que Deus é verdadeiro. Não seja a vossa,
uma fé estéril, uma fé morta, mas
vivificada pela caridade, que é seguida do nobre cortejo das outras virtudes e
obras de bem. Então Santo Antonino vos poderá olhar com alegria e vós podereis
nutrir confiança, antes certeza, de ter nele um protetor que ouvirá as vossas
súplicas. Assim, sob o escudo do mártir, sob a égide do poderoso advogado,
caminhareis seguros e tranquilos em meio às insídias, aos assaltos, às fadigas,
às tristezas desta miserável vida, que é dura milícia e vale de lágrimas, até
que desponte também para nós o tão desejado dia do triunfo final e do eterno
repouso. 22
“Eu vos
gerei em Cristo, por meio do evangelho.”
Gerei-vos em Cristo, por
meio do Evangelho escrevia o Apóstolo São Paulo, aos fiéis de Corinto. Estas
belas palavras são dirigidas a nós, cada dia - 81 -
e
especialmente neste consagrado à glória do túmulo venerando, de Vosso Santo
Bispo e Pai Savino. (...)
Ele
é um santo que pertence todo a nós, que tem conosco os mais estreitos laços.
Embora nascesse em Roma, foi do agrado da Divina Providência fazer um dom a
esta nossa cidade. Foi entre nós, que sobressaiu sua santidade Foi esta
cidade, o teatro de suas gloriosas ações, de suas heróicas virtudes. (...)
Placência lhe é devedora dos maiores benefícios. Foi ele que aos nossos
ancestrais, que em grande parte jaziam, ainda nas sombras de morte e nas trevas
do paganismo, levou a luz do
Evangelho e destruiu inteiramente a idolatria, até então dominante entre nós.
Em uma palavra, ele foi o nosso pai na fé e nos repete hoje e repetirá até o
fim dos séculos, daquele túmulo sacrossanto: Placentinos, eu Vos gerei em
Cristo, por meio do Evangelho. 23
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