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e) A IGREJA É MESTRA
“A Igreja é
Mestra infalível.”
A
Igreja Católica, no seu conjunto, é a sociedade dos anjos e dos fiéis, que
atravessa os séculos e passa sobre a terra para recolher-se na santa unidade
universal e perpétua e retornar com os seus filhos à eternidade de onde saiu. É
ela a assembléia dos filhos de Deus, o exército do Deus vivo, o seu reino, a
sua cidade, o seu trono, o seu tabernáculo. É a nobre sociedade, que existe
desde o princípio dos séculos e que aparece nas sombras e nas figuras com Adão,
anunciada pelos Patriarcas, acreditada em Abraão, revelada por Moisés,
profetizada por Isaías; no seu último período se manifesta em Jesus Cristo, como
uma sociedade de homens, unidos pela profissão da mesma fé, pela participação
aos mesmos sacramentos, sob o governo dos legítimos Pastares e principalmente
do Romano Pontífice, Chefe visível, Chefe supremo, Pastor universal desta feliz
reunião, fundada pelo Homem-Deus.
Jesus
Cristo se compraz em entregar-lhe o depósito da revelação, o conjunto total das
doutrinas pertencentes à fé e à moral! Ele mesmo trouxe-as do céu, para
ensiná-las a todas as gerações com certeza, com facilidade e sem mistura de
erros. Era necessário que fosse enriquecida com a gloriosa qualidade de mestre
infalível, a fim de transmitir, em todos os tempos, as verdades reveladas, tais
como as recebeu de seus próprios lábios divinos (...).
Não
acolher todas as definições do Concílio, com plena e pronta submissão de
intelecto e de vontade, sem restrições, sem transações, - 117 -
hesitações ou compromisso é não só negar a verdade particular
que contraria as próprias idéias, como negar o infalível magistério, que no-la
propõe a crer; é destruir o catolicismo e ferir mortalmente a mesma sociedade.
De
fato, com o magistério infalível da Igreja, o Catolicismo ó divino, a filosofia
é por ele conduzida à fé; o mundo é renovado por Ele; o martírio torna-se racional. Os Concílios são reconhecidos e
respeitados, as heresias destroçadas, a ciência e a sociedade fecundadas, a
moral assegurada, a paz da consciência certa e tranqüila, todos os frutos da
santificação derramados abundantemente sobre os povos, a existência da Igreja
invencível, a sua unidade indissolúvel. Tirai da Igreja católica esta gloriosa
prerrogativa e ela se desmantelará e se destruirá, como se desmantelou e
destruiu a fé naquelas almas infelizes, que combateram nestes últimos anos, as
suas santas e solenes definições. 29
“A Igreja
docente e a Igreja discente.”
Se
existe, por ordem divina, uma autoridade unitiva e dirigente, esta pertence à
ordem sacerdotal; deveis, portanto, reconhecer que na Igreja existe distinção
de classes, de serviços e de poder. Existe superior e súdito, existe pastor e
rebanho; existe quem ensina e quem aprende, quem apascenta e quem é
apascentado. Existe, em outros termos, a Igreja docente e a Igreja discente, as
quais, embora distintas entre si, não formam senão uma só e mesma Igreja.
À
primeira pertencem os sucessores dos Apóstolos, os Bispos e especialmente o
sucessor do Príncipe dos Apóstolos, o Papa. À segunda pertencem todos os fiéis.
Quanto aos simples sacerdotes, se de um lado parecem pertencer à Igreja
docente, enquanto administram os Sacramentos e ensinam os fiéis, na realidade
pertencem à Igreja discente, porque não possuem a plenitude do Sacerdócio,
porque não têm nenhuma jurisdição, porque não administram Sacramentos, nem
ensinam os fiéis, senão enquanto são autorizados pelos bispos. 30
“A
infalibilidade do Papa não é separada da fé de Igreja.”
O Papa é pessoalmente infalível, mas a sua infalibilidade não
pode ser pessoal e separada, de tal modo que sua fé seja desligada da fé da
Igreja. A Igreja é um corpo vivo e não um cadáver, nenhum poder terreno pode - 118 -
roubar-lhe a força vital, porque é
divina e reflete em si, a vida íntima de Deus. O
Papa é cabeça, os Bispos são os membros do corpo docente e vivo. Se a cabeça
pudesse se separar dos membros, teríeis um corpo morto, e a Igreja, contra as
promessas de Jesus Cristo, seria destruída.
Portanto, o Pontífice, que em si mesmo une e concentra todo o
episcopado, nunca poderá encontrar-se solitário e isolado, quando ensina a
todos os fiéis as coisas da fé e da moral, porque o Espírito Santo, que assiste
a cabeça e a defende de todo erro, opera e inspira a submissão aos Bispos, que
unidos a Pedro formam a verdadeira Igreja (...).
O Papa é infalível, mas a sua
infalibilidade não o desobriga de aplicar-se à doutrina, de manter consultas, de
apoiar-se nos bispos e nos Concílios. A infalibilidade se compõe de duas partes
bem distintas: a parte divina, que é inspiração, a luz que Cristo, mediante o
Espírito Santo irradia sobre o sucessor de Pedro; a parte humana, que encerra
os elementos da ciência, a pesquisa necessária na tradição e na Escritura, o
modo mais apto para exprimir ao povo a verdade.
A verdade
não vem por meio de novas revelações, nem por ilustrações imediatas, mas deve
unir o elemento humano ao elemento divino, que aprofunda o sagrado depósito
confiado à Igreja, contido nos livros do velho e do Novo Testamento, nos
escritos dos Padres, nos monumentos da religião, no ensinamento oral e no uso
sempre vivo e constante das Igrejas, em comunhão com a Igreja Romana, Mãe e
Mestra de todos. Não pode haver uma definição sem o devido exame.
O
Espírito Santo, em cuja assitência se fundamenta a infalibilidade, não pode
permitir que a negligência do homem leve a Igreja ao erro, omitindo a pesquisa
necessária para descobrir, ilustrar, promulgar com solenes e novas definições,
as verdades antigas. 31
“A Igreja
causa de ignorância?”
Conhecemos
bem o que se diz: A Igreja corta as asas do espírito e é causa de ignorância!
Que acusação mais imbecil e mais irracional! A Igreja fautora de ignorância,
ela que nada mais teme que a ignorância, e que antes, considerando ignorância
uma culpa, obriga todos ao mais diligente e desapaixonado estudo da verdade?
Quando a verdade foi obstáculo ao desenvolvimento da inteligência humana?
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A
Igreja causadora de ignorância? Pode existir maior igorância da história, que tal
acusação coloca em evidência? A história proclama altamente que a Igreja,
dissipando as trevas das superstições mais entranhadas, impeliu a humanidade
para os caminhos da verdadeira civilização. Foi a Igreja que abriu diante de
nós novos céus e novas terras e mediante sua luz vivificante, elevou a nossa
razão acanhada e fortificou-a tanto, que a libertou de todo erro. (...)
Hoje,
ainda que se fale tanto de instrução e tantas máximas constitucionais se
espalhem em abundância por todos os lugares, quem pensa em conservar intactos,
nos povos, os princípios eternos de verdade e de justiça? Quem, senão a Igreja
católica? E não é também a Igreja católica que envia ainda hoje, seus
missionários aos lugares remotos e entre os povos mais bárbaros, para conquistá-los
à civilização, ao mesmo tempo que os conquista para a cruz? Não é a Igreja
Católica que manda os seus padres, também aos lugares mais montanhosos e
desfavorecidos, onde com escasso pão e privações de todo tipo, passam os dias
entre as neves durante o inverno e entre mil intempéries durante o verão, para
civilizar tantas pobres criaturas,
santificá-las e fazê-las prelibar
consolações do céu?
O
ataque contra a Igreja católica, da parte de quem não a conhece, é para
escarnecê-la. Ela foi e será sempre a única mestra verdadeira, tanto dos
indivíduos como das nações, constituindo-a como tal, aqui na terra, o seu
Divino Fundador. Só ela tem a força, para preservar a razão das mais
vergonhosas quedas; só ela pode fazer com que o belo seja imagem esplêndida do
verdadeiro e do santo; só ela pode aproximar o homem daquela Sabedoria infinita
e luz por essência; antes, este é o fim de todas as suas obras; por isso
grita-nos continuamente, pela boca do Apóstolo: vós outrora éreis trevas e
agora sois luz, no Senhor: viveu como filhos da luz. 32
“Ai da
Igreja Romana se tivesse sido atingida pela imobilidade.”
A Igreja, como sociedade universal e
perpétua, recebeu o poder de adotar suas leis, às necessidades de todos os
tempos e de todos os lugares. Devendo pois proceder, em razão direta, às leis
providenciais que regem a humanidade, a cujo bem é ordenada, é necessário que
siga seus movimentos, interrogue sobre suas exigências, satisfaça-lhe as
necessidades, no âmbito de sua missão.
Ai
da Igreja Romana se tivesse sido atingida pela imobilidade, como o foi a Igreja
cismática! Daqui se pode obter uma esplêndida demonstração - 120 -
de sua divindade. De fato, a
Igreja cismática trocou o elemento imóvel, isto é o dogmático, e permaneceu
estacionária no elemento variável. Enquanto a Igreja Romana, permanecendo
firme, como torre que não cai, no elemento divino, soube mostrar uma juventude
sempre viçosa, uma vitalidade sempre exuberante, dobrando-se e redobrando-se
sobre o fluxo e refluxo das gerações humanas, cercada de variedades 33
“Olhar o
céu, sofrer e calar.”
É
necessário ter paciência e esperar somente no auxílio de Deus. Mas não pense
que eu esteja desanimado: trabalho indiretamente, porque não acredito viável
fazê-lo diretamente. A oposição àquele partido, eu a considero como um dever de
ministério e jamais deixarei de cumpri-lo, com prudência, firmeza, quanto Deus
queira, se bem que tenha perdido a confiança nos homens. A experiência do
mundo, querido irmão, me fez reacreditar em
muitas e muitas coisas e lamento aqueles dias nos quais a minha alma,
todo ardor, via a Igreja toda perfeita e tudo o que lhe pertence, cor-de-rosa.
Mas as mudanças chegaram e elas também têm a sua razão. Sempre mais me
desprendem das coisas deste mundo e me fazem voltar ao programa que vos
propunha tempos atrás. 34
Caro Monsenhor, precisamos esquecer as tristezas
da hora presente, aos menos por
algumas semanas. A Igreja parece transformada em uma verdadeira babel. Talvez o
presente seja um dos mais tristes períodos da sua história. Lá em baixo vêm o
mal, talvez o deplorem em segredo, mas em público ou nada, ou atos que parecem
encorajar os demolidores da ordem hierárquica. É prudência humana? É fraqueza?
É cumplicidade? É por medo dos homens, que se deixam demolir? Só Deus o sabe;
aquilo que eu sei é que em nenhuma sociedade organizada se toleraria semelhante
patifaria e semelhantes patifes.
É mesmo necessário olhar
para o céu, sofrer e calar. Se sabes calar e sofrer. “Se sabes calar e sofrer,
sem dúvida, verás sobre ti a ajuda do Senhor”. Ë uma grande máxima, cheia de
sabedoria. 35
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Acredito
que a seguinte máxima contém uma grande sabedoria: “Permanecer em perfeita
tranqüilidade a respeito de tudo o que acontece, por disposição divina, não só
em relação a si mas também em relação à Igreja, agindo em seu favor, seguindo o
chamado divino. 36
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