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c) ANEL DA HIERARQUIA
ECLESIÁSTICA
“A unidade
dos sucessores dos Apóstolos.”
A unidade que Jesus Cristo suplicou
ao Pai celeste, “sejam um”, recomendou-a (...) aos sucessores dos Apóstolos e entre eles, ao Sucessor do Príncipe
dos Apóstolos, centro de onde partem e para onde apontam todos os raios. Mestre
privilegiado de especialíssima assistência de Deus, Juiz sem apelação de todas
as controvérsias, Pedra fundamental do místico edifício erigido pelo Verbo
Encarnado, para a salvação dos homens, Pastor a quem foi conf ia-do com poder
absoluto, todo o rebanho e todos os pastores, que em cada Diocese governam
cada população.
Fiéis
a este desígnio divino, o Chefe dos Pastores e com ele, e sob sua guia, os
bispos fazem com que a Igreja floresça sempre, com a unidade que é um dos mais
claros sinais de sua divindade. É verdade que surgiram na Igreja e sempre
surgirão, heresias e erros, mas a história nos ensina que a indicar e a
condenar os que erram, não se levantaram homens sem autoridade, mas os Bispos,
juízes e guardas do sagrado depósito da fé, e o Romano Pontífice, que vem
colocar, às suas sentenças, quando há necessidade, o selo de sua condenação e a
dar o golpe definitivo ao erro. 17
“Na Igreja,
foram excluídas missões extra-hierárquicas.”
Não
digais pois, como aqueles que, desde seu tempo o Apóstolo censurava: eu sou de
Paulo e eu de Apolo e eu de Cefas, pois somos todos de Cristo.
Recordai-vos
de que, na Igreja de Jesus Cristo, toda missão extra-hierárquica foi excluída.
Nenhum fundamento pode ser colocado, senão o que já foi posto, e que é Jesus
Cristo. Na escola de Jesus Cristo ninguém pode arvorar-se de mestre, senão os
que ali foram colocados pelo Espírito Santo.
Quem
se recusa submeter-se a este magistério é um temerário; quem, contra ele, se
rebela é um apóstata; quem contra ele, levanta a cabeça, é um orgulhoso, um ignorante,
um anti-Cristo e deve considerar-se publicano.
Mas
este é um grande homem! Aquele um grande teólogo, aquele outro um grande
filósofo! Aquele outro ainda, um grande santo!
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Que importa isto? É um anjo do céu? Ainda que seja um anjo do céu, se
ergue a cabeça e ensina e escreve algo diferente do que o Papa ensina, que os
Bispos ensinam: seja anátema, gritaremos com o Apóstolo, seja excomungado.
Também
não exista entre vós, quem se deixe entusiasmar pela funesta ilusão, que invade
e alucina, em nossos dias, algumas mentes, embora não sejam perversas, nem
mesquinhas, como acreditamos que verdadeiramente possa estar com o Papa, aquele
que, separando-se do necessário vínculo da ordem hierárquica, divinamente
estabelecido, não fosse unido em obediência, em respeito e em caridade ao
próprio Bispo e com ele, e por ele, unido ao Papa; ou sob cores de zelo e de
exagerado sentimento de devoção ao Papa, reduzisse de fato a obediência e o
respeito devido ao Bispo, julgando-o por seu particular arbítrio, fiel ou não
às ordenações pontifícias. Sem dúvida, isto seria antecipado ao julgamento da
Sé Apostólica, um atentado à divina constituição da Igreja, palmilhando o
caminho do mais refinado e pernicioso liberalismo. 18
“Multiplicam-se
os Papas, os leigos substituem os bispos.”
Nossas coisas vão mal, muito mal. Quer-se fazer
entrar em tudo a política, até nas peregrinações! Soube que no Congresso de
Liege tomariam parte muitos bispos italianos e muitíssimos personagens, se não
se tivesse colocado em pauta a questão do poder temporal. Czacki estraga tudo.
Cada dia se multiplicam os Papas, os leigos pouco a pouco substituem os Bispos
e aumentam cada dia os equívocos, as confusões, as desordens (...).
Nós, pobres Bispos, não sabemos mais o que pensar,
o que falar, o que escrever, como nos mexer. Já somos conduzidos pela mão,
como crianças do jardim da infância, em poder do jornalismo e de que
jornalismo! Pobre Episcopado!
Agora
estou me ocupando, perdendo tempo com o opúsculo, do qual vos escrevi, e que
poderia intitular-se: A questão social e a missão do clero. Quanto a imprimi-lo... Existe
muita facilidade, ao que parece, de mandar para o índice, quem não pensa com a
cabeça..., dos outros. 19
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“Haveis
redimido o Episcopado.”
Padre Santo, já é a todos manifesto
o sublime plano de vossa mente, o supremo desejo do vosso coração. É o plano da
divina Providência, que atinge, até o fim com força e tudo dispõe com
suavidade. É o desejo daquele, de quem sois, aqui na terra, digno e visível
representante, quer dizer: que todos os filhos da Igreja católica sejam um, e
sejam um, na submissão total e absoluta de mente, de coração e de obras, àquela
autoridade hierárquica, que Jesus Cristo estabeleceu, aqui na terra, para
governo da mesma Igreja.
Para nós é um solene testemunho, a
carta que vós dirigistes ao Eminentíssimo Cardeal Arcebispo de Paris, em junho
próximo passado. Certamente foi Deus quem vô-la inspirou, pois é muito bela,
sábia e oportuna. Eu a beijei comovido e confesso-vos, Padre Santo, que sou
incapaz de expressar, como gostaria, toda minha admiração, todo meu
reconhecimento. Com ela, afugentastes o nevoeiro levantado pelos espíritos do
abismo, para ofuscar o horizonte cristão. Sepultastes o novo liberalismo, que
desde as últimas fileiras do exército católico ia cada dia mais se propagando.
Redimistes, por assim dizer, o Episcopado, libertando-o de um oculto poder
ilegítimo, que tentava com arte astuciosa, ajuntá-la ao próprio carro (...).
Sede
bendito, por terdes feito compreender de maneira tão clara a todos, que em vão
se presumiriam católicos, se não estivessem unidos, pela obediência, pelo
respeito e pela caridade aos próprios Bispos e, com estes, e por estes unidos a
Vós, que sois o Chefe e o Mestre de todos.
Sede
bendito, por terdes aberto os olhos a tantos pobres iludidos ou enganados,
reprovando aqueles que não abandonam a oposição que se faz, seja aos Bispos,
seja ao Bispo dos Bispos, ao Romano Pontífice, com modos indiretos, tanto mais
perigosos, quanto melhor se ocultam com aparências contrárias. 20
“Não
conhecemos partidos.”
Deus
vê a pureza das nossas intenções, aquele Deus que perscruta os corações e os
rins, e diante do qual todos nos devemos apresentar a curto prazo!
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Ele
sabe que nós não conhecemos partidos, não temos preferência por alguém, por alguma
pessoa, por autor algum; que amamos a todos indistintamente; que não julgamos
as intenções de quem quer que seja; que não queremos e não procuramos nada além
de sua glória e o bem das almas; que não somos apegados, por sua misericórdia,
senão a Ele só, ao seu Vigário na terra, a sua santa Igreja.
As
dores que sofremos são grandes, vendo a veste de Cristo dividida, e talvez
dores maiores nos esperam mas nada disso eu temo, direi com o Apóstolo, a não
ser fazer de minha alma mais importante que minha pessoa, enquanto completo a
jornada e o ministério, que recebi do Senhor, de testemunhar o Evangelho da
graça de Deus.
Desde
agora, conforta-me vivamente o pensamento de que o triunfo da verdade poderá tardar, mas não falhará e o fato mais
precioso deste triunfo será, não duvidamos, a plena liberdade do Episcopado e
do seu Chefe supremo, o Bispo de Roma, de quem o Episcopado, recebe toda sua
força, toda solidez, todo vigor. Levaremos conosco ao sepulcro a suave certeza
de ter combatido o bom combate, concluído a carreira, conservado a fé, esperado
receber de Deus, justo juiz, a coroa imarcescível. 21
“Seja a
caridade o nosso distintivo, a arma para o nosso combate.”
Está
fora da Igreja, tanto quem desconhece o poder sagrado, quanto o temerário, que
tenta usurpar para si, o trabalho e os direitos.
A
vós, portanto, nos dirigimos (...) clamando-vos
com todo o nosso zelo: zelai, zelai pelo espírito da disciplina eclesiástica!
É o amor espontâneo, sincero,
constante, absoluto, inviolável a esta disciplina, a razão das nossas forças, o
motivo das nossas esperanças, a delícia da nossa vida, a fonte de todo nosso
bem.
A
disciplina da Igreja é coisa sagrada; ai de quem ousa profaná-la!
Fazei
de vosso peito o escudo contra os assaltos: fugi das discórdias, que são a
vossa ruína; guardai-vos delas, como do maior crime (...). Longe de vós o espírito de partidarismo e de contenda, com
tendências exclusivas e egoístas.
Seja
a caridade a nossa marca, o nossa arma de combate. 22
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“A obediência mantém a hierarquia, a
hierarquia produz a união, e a união gera a força.”
Se
a força do clero está na união dos seus membros, e se a união não existe sem a
hierarquia, o que é que mantém a mesma hierarquia? A obediência, a submissão
dos padres aos bispos e dos Bispos ao Sumo Pontífice: somos filhos obedientes
(1 Pd 1). Somos discípulos de Cristo que, segundo a expressão de São Paulo,
fez-se obediente até a morte.
Em
nossos dias, quando o orgulho e o menosprezo à autoridade se escondem, muito
freqüentemente, sob palavras de liberdade e de independência, deve-se temer que
esta atmosfera doentia acabe por envolver o mesmo sacerdócio. Mas os padres,
verdadeiramente padres, isto é, penetrados pelo espírito do seu santo estado,
não se deixam seduzir por estas falsas aparências (...)
Sabem
que a graça do estado se detém nos limites da função e que não existem nem
luzes, nem força que lhes possam ser conferidas senão da parte do ministério.
Eles sabem permanecer no seu lugar, não se atribuem direitos que não lhes
competem, não pretendem julgar o conjunto, enquanto não conhecem, senão uma
parte das coisas e, limitando-se à função a eles conferida, cumprem-na, com
fruto.
Não
são vãs promessas que eles fizeram ao pé do altar, no dia de sua ordenação
sacerdotal; eles mantêm fielmente, essas promessas no decorrer de sua vida. São
eles, os bons padres, que, por espírito de submissão, estabelecem e consolidam
o grande corpo da Igreja, pois que a obediência mantém a hierarquia, como a
hierarquia produz a união e a união produz a força. 23
“A
obediência solenemente prometida ao Bispo.”
A
pessoa a quem devemos, depois do Sumo Pontífice, plena obediência é ao Bispo.
Recordamos daquele solene momento, em que tendo nossas mãos apertadas as suas,
nos perguntou: “Prometes reverência e obediência a mim e a meus sucessores”?
“Prometo”. Esta foi a nossa resposta, o nosso voto solene, feito na presença de
toda a Igreja de Deus, esta é a promessa que devemos ter sempre presente e que
silencia todas as nossas desculpas, para desobedecer (...).
Ah!
se os bispos tivessem sacerdotes obedientes e soldados semelhantes aos do
Centurião, para poder dizer a este: vai, e ele vai, àquele, - 153 -
vem, e ele vem, quanto não poderia
fazer para a santificação de sua Diocese!
Mas os Ordinários das Dioceses encontram resistência de todas as partes,
contradições, repugnâncias, quando não claras negativas e desobediências. Os
Bispos, às vezes para não comprometer sua autoridade, são constrangidos a
tolerar a fraqueza dos outros, a fazer pouco uso do seu poder de mando, embora
o tendo em plenitude; e exortando, aconselhando e condescendendo com a
enfermidade de seus ministros, fazem aquilo que podem, que é infinitamente, menos do que poderiam
fazer. 24
“Nosso
Senhor sob a imagem do legítimo superior.”
Não
é servidão, mas um nobre dever que o Apóstolo nos prescreve, quando diz: Obedecei
a vossos superiores etc. Os ascetas dizem que existem três mistérios que a
natureza rejeita com todas as forças de seu orgulho. O primeiro é o de Nosso
Senhor, sob os véus da Eucaristia, o segundo sob a aparência do pobre, e o
terceiro sob a imagem do legítimo superior. E do mesmo modo que a indignidade
do padre não altera em nada a realidade do primeiro mistério, nem a indignidade
do pobre o segundo, a indignidade do Superior (desde que não seja uma
imaginação apaixonada dos inferiores) não diminuiria em nada a realidade do
terceiro. Portanto, existe uma espécie de presença real infusa naqueles que nos
ordenam. Não é só a docilidade exterior que lhe devemos, mas a da consciência.
(...)
Sem
dúvida, existem sofrimentos inerentes à obediência. Existem Outros inerentes à
autoridade. Toda autoridade é um martírio. Todo Superior não é senão uma vítima coroada. Portanto,
superiores e inferiores choremos reciprocamente e façamos da nossa
Diocese
uma escola de respeito e de simpatias recíprocas. Eliminemos sobretudo das
relações que Deus estabeleceu entre nós, o ceticismo desarticulado, isto é, aquele desprezo mudo, fechado no
coração, que é a sabedoria das almas mesquinhas e dos grandes orgulhosos. 25
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