2
No início do presente Congresso que aborda precisamente este tema tão difícil, ou
seja, as perspectivas do personalismo na
bioética reunimo-nos para celebrar em conjunto a sagrada
Eucaristia, para recordar o mistério
que se coloca no fulcro da vida e do dinamismo da Igreja (cf. Carta Encíclica Ecclesia de Eucharistia
[17 de Março de 2003], nn. 3a e 7), para reforçar em nós mesmos
"o sentido de Deus" e a nossa
união com o Senhor; para sensibilizar as nossas consciências
e as nossas responsabilidades; para seguir a sua lei, para buscar a Verdade e para nos inserirmos plenamente na construção do verdadeiro bem de toda a humanidade.
A Eucaristia tem um significado
forte para o nosso Congresso e para o compromisso em favor da vida humana. Nesta
perspectiva, tendo como fundamento a supramencionada
Carta Encíclica Evangelium
vitae , quereria frisar quatro aspectos da Eucaristia.
a. Cristo, que derramou o seu sangue por nós na Cruz
e que, neste mistério, se torna realmente presente, aliás,
de maneira totalmente específica
e substancial (cf. Carta Encíclica Ecclesia de
Eucharistia, 15), na celebração
eucarística, "enquanto
revela a grandeza do amor
do Pai, manifesta o modo como
o homem é precioso aos olhos de Deus como o valor da sua vida é inestimável. É quanto nos recorda o Apóstolo Pedro: "Vós sabeis que não
foi à custa de coisas que se podem
corromper, como a prata e o ouro, que
vós fostes libertados [...], mas com o
sangue precioso de Cristo [...]" (1 Pd 1, 18-19). Precisamente
contemplando o sangue precioso de Cristo, sinal do seu dom
de amor (cf. Jo
13, 1), o fiel aprende a reconhecer e a apreciar
a dignidade semidivina de cada homem"
(Ibid., n. 25c; cf.
também o n. 33b). Por conseguinte, o Sucessor de Pedro exclama com
reconhecida admiração:
"É verdadeiramente grandioso o valor da vida humana, se o Filho de Deus a assumiu e a transformou num lugar em
que a salvação se realiza em benefício
de toda a humanidade"
(Ibid., n. 33b; cf.
também o n. 25c).
b. No que diz
respeito a esta vida, Jesus disse: "Eu vim para que
tenham vida, e a tenham em abundância"
(Jo 10, 10). Na celebração eucarística, torna-se presente o núcleo central desta sua missão redentora, a propósito da vida dos homens, que se cumpriu com a morte na Cruz.
Na realidade, nestas palavras como observa ainda
a Carta Encíclica Evangelium
vitae Jesus Cristo "refere-se
a esta vida
"nova" e "eterna", que consiste na comunhão com
o Pai, a que cada homem é chamado gratuitamente"
(cf. n. 1c; cf. também
nn. 37-38). De resto, este é o significado da "vida" nas afirmações que acabei de citar. "Mas é precisamente nesta "vida" [da dimensão eterna] e é isto que gostaria de sublinhar nesta circunstância que adquirem pleno significado todos os aspectos e momentos
da vida do homem", inclusivamente aqui na face da terra (cf. n. 1c), ou seja,
também todos os aspectos da vida de que a bioética se
interessa. Com efeito, a sublimidade da vocação sobrenatural do homem "revela a grandeza e
a preciosidade da vida
humana, até mesmo na sua fase temporal" (Evangelium
vitae , 2b).
c. "O sangue de Cristo [derramado
na Cruz, que se torna presente na
Eucaristia] de resto revela ao
homem que a sua grandeza e portanto a sua vocação, consistem no dom sincero de si mesmo
[uma afirmação de extrema importância para enfrentar cristãmente as questões da bioética: cf., por exemplo, os nn. 23, 51, 54a, 76b, 77 e
87-92]. Exactamente porque
é derramado como dádiva de vida, o sangue de Jesus Cristo não constitui mais um sinal de morte, de separação
definitiva dos irmãos, mas sim
o instrumento de uma comunhão, que é riqueza de vida para todos. Quem, no
sacramento da Eucaristia, bebe deste sangue e permanece em Cristo (cf. Jo 6, 56), participa no seu
próprio dinamismo de amor e de dom
da vida, para levar à plenitude
a vocação originária ao
amor, que é própria de todo o homem (cf.
Jo 1, 27; 2, 18-24)" (Ibid., n. 25d).
d. "É também
do sangue de Cristo [derramado na
Cruz, que se torna presente
e actuante na Eucaristia] que todos os
homens haurem a força para se comprometerem
em favor da vida. Exactamente este sangue é o
motivo mais vigoroso de esperança, aliás, o fundamento da certeza absoluta de que, em conformidade
com o desígnio de Deus, a vida vencerá" (Ibid., n. 25e).
Por conseguinte, a Eucaristia
ilumina-nos na nossa matéria, chama-nos, interpela-nos, compromete-nos, encoraja-nos, exorta-nos ao apostolado e sustenta-nos.
Na sua Carta Encíclica,
o Papa João Paulo II vislumbra
também muitos sinais positivos, que actuam em
benefício da vida, na situação contemporânea (cf. nn.
26-27) e, entre estes escreve ainda o Santo Padre
"é particularmente significativo
o despertar de uma reflexão ética acerca da vida: com o nascimento e o desenvolvimento cada vez mais difundido da bioética, são
privilegiados a reflexão e
o diálogo entre crentes e não-crentes, assim como entre
crentes de diversas religiões sobre problemas éticos, também fundamentais, que dizem respeito
à vida do homem" (n.
27e).
É nesta dinâmica que se insere o presente Congresso. Conscientes
de nos encontrarmos diante de um embate
dramático entre a
"cultura da morte" e a "cultura da vida",
antes, empenhados
necessariamente "no meio"
deste conflito e conscientes
da nossa responsabilidade ineludível neste contexto (cf. ibid., n. 28a), aproximámo-nos
do Senhor nesta celebração. Com efeito, a escolha
incondicionada em favor da vida observa o Papa na sua Carta Encíclica "alcança plenamente o seu significado religioso e moral quando brota, quando é plasmado e alimentado pela fé de Cristo [...] que se fez homem e veio habitar entre
os homens, "para que tenham vida,
e a tenham em abundância"" (Ibid.,
n. 28c).
Como acábamos
de dizer, é o próprio
Cristo que, no núcleo central desta sua missão redentora ("para que tenham vida",
ou seja, no mistério da sua morte e ressurreição,
se torna presente na Eucaristia.
Supliquemo-lo na nossa celebração
hodierna, para que nos sustente no presente
Congresso, a fim de que ele seja fecundo
e que nos ajude em todo o nosso generoso e apaixonado compromisso na construção e promoção de uma nova
"cultura da vida" (cf.
ibid., nn. 95-100).
Mesmo depois do Congresso, que a Eucaristia se torne um momento cada vez mais
importante neste nosso empenho específico e contínuo.
Que nos sirva de encorajamento
São Luís Gonzaga (1568-1591), cuja memória se celebra no dia de hoje, que praticamente deu a vida assistindo
com grande sacrifício e caridade heróica as vítimas da peste.
|