Narrativa
dos últimos momentos do irmão Girard. Notícias da Comunidade. Acidente em Roma. Os irmãos,
“atarefados, sempre no ar” não fazem seguir as mensagens. Envio do Anuário.
Dever de manter a caridade fraterna em seu coração.
Chaville, 2 de novembro de 1868
Meu
caríssimo amigo e filho em N.S.,
Nossas
cartas se cruzam muito ordinariamente, por causa da lentidão dos mensageiros
que as levam. Daí, não se respondem muito uma à outra. Assim, vejo em suas
últimas missivas que você parece feliz na persuasão de que nosso caro irmão Sr.
Girard iria sarar logo. Infelizmente! a cura, era para ele a morte. Declinava
cada vez mais há um certo tempo. Após uma breve ausência, que tive de fazer com
o Sr. Myionnet para assistir à bênção da capela do patronato de Angers,
encontrei-o definitivamente acamado. Era na quarta-feira e, no sábado seguinte,
dia 24 de outubro, devolveu a Deus sua alma, às 9h30 da manhã, no mesmo momento
em que, na minha missa em
Nosso Senhora da Salete, estávamos rezando por ele com as
pessoas ali reunidas. Morreu sem agonia alguma, apagando-se no esgotamento
absoluto de suas forças, em que o colocara sua diarréia. Ficou consciente até
poucos instantes antes de expirar. Tinha recebido os sacramentos com grande
piedade e, uma hora mais ou menos antes de morrer, ainda respondia às orações
que eram feitas por ele. Como o Sr. Faÿ lhe tinha perguntado na véspera se
fazia de bom coração seu sacrifício a Deus, respondera, após um momento de
recolhimento: “Sim, viver para trabalhar, ou permanecer lânguido e inútil, ou
morrer, aceito, qualquer que seja, a santíssima vontade de Deus.” Foi nessas
disposições que deixou este mundo. Confiamos que o Senhor o terá recebido em
sua misericórdia. Seus restos estão depositados no jazigo de Chaville, embora
não tivesse feito votos. Tinha-se doado todo inteiro de coração, de antemão: a
família o considerou como lhe pertencendo verdadeiramente. Agora, amplia a
pequena falange dos nossos que nos aguarda (ao menos é o que esperamos) no
mundo melhor. Terá seguramente rezado bem piedosamente por ele. Aqui, todos os
nossos irmãos eclesiásticos rezaram várias missas em sua intenção e nossos
irmãos leigos ofereceram também suas comunhões e obras com o mesmo
sentimento.
É muito
tarde para dizer-lhe que estivemos bem comovidos pelo acidente desastroso de
que você e nosso irmão Jouin quase foram vítimas410. A divina
Providência, como o nota tão bem nosso irmão Emile [Beauvais], interveio
visivelmente para protegê-los nessa ocorrência. Agradecemos-Lhe muito pela
proteção com que Ela os cobriu e vemos nisso uma feliz segurança de que os
garantirá ainda contra todo perigo no futuro. Não deixamos, aliás, de Lhe pedir
isso, rezando juntos todos os dias por vocês.
É com razão
que se queixa da inexatidão que usam para executar seus recados. Todos
atarefados, sempre no ar, tendo dificuldade para se encontrarem, para se
entenderem entre si, nossos irmãos, sem querer, deixam em suspenso muitas
coisas que teriam grande vontade de fazer. Vou usar de toda a atenção possível,
doravante, para entregar suas mensagens em mãos seguras, cuidando de anotar a
data dessa entrega, o nome dos que a tiverem recebido, para seguir e perseguir,
se é necessário, os negligentes.
Recebi,
pelo Sr. Bailly, o pedaço da veste do Santo Padre. É uma preciosa lembrança;
divido-a com o Sr. Hello que o agradece comigo.
As roupas
do Sr. Girard ainda não chegaram aqui. Não há atraso, mas anoto-o aqui para
informação.
Recomendei
ao Sr. Georges [de Lauriston] mandar-lhe o Compêndio de nossos usos [Anuário].
O R.P. de
Boylesve, enviado para uma casa do interior, não nos faz mais o favor de
livros. Alegro-me com o pensamento de que o Sr. Keller enviará alguns, vamos
lembrá-lo disso. Os livreiros, por ocasião de um primeiro apelo, não deram
quase nada. O Sr. Girard queria ir vê-los para ele próprio fazer seus pedidos.
Deus não lhe deixou o tempo.
Não
saliento as poucas palavras de sua carta sobre alguns desentendimentos entre os
Srs. Emile e Charrin. Quero acreditar que têm o sentimento de seu dever e que
se tornarão dignos da confiança que a Comunidade pôs neles ao enviá-los a um
posto de honra. Não insisto, portanto, bem seguro de que esta única palavra,
sem nenhuma censura nem ameaça será suficiente. São cristãos e servos de Deus,
recorrerão a Deus, que manterá a caridade em seu coração. De resto, há uma só
comunidade para nós em Roma, apesar da separação que suas ocupações provocam,
durante algumas horas cada dia. Você é o superior dessa pequena colônia,
indique a cada um o que tem de fazer e, com a graça do Senhor, os que você
dirigir obedecerão.
Ofereça a
Monsenhor Bastide minhas respeitosas lembranças, se não esqueceu completamente
os dias em que me foi dado ter com ele relações de caridade. Os laços que se
formam assim são ordinariamente mais fortes e duram mais do que todos os
outros.
Adeus, meu
caríssimo filho. Abraço-os a todos e peço ao Senhor para os abençoar.
Seu amigo e
Pai em Jesus e Maria.
Le Prevost
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