O projeto de Casa de
estudantes continua firme. O Sr. Le Prevost examina, com sua esposa, outras
soluções propostas pelo Sr. Levassor. Dois confrades da Sociedade de São
Vicente de Paulo se interessam também pelo projeto.
Paris, 17
de março de 1835
Parece agora bem certo, meu caro amigo, que Deus não o quer na situação que
tínhamos desejado. Ele, que tem os corações em sua mão, podia facilmente tornar
favorável a nós o de sua mãe, e não o fez. Mais tarde, talvez, nos
deixará ver por quê. Hoje, caro amigo, tenhamos confiança e submetamo-nos
aguardando a hora dele. Qualquer pesar que me possa causar esse resultado de
nossos projetos, sinto bem que ele é mais duro para você do que para mim; você
o tinha previsto menos talvez e aliás ele perturba mais essencialmente a
ordem de sua vida.
Mas o que importa isso? Para ambos não há este pensamento consolador de que uma
vida, realmente dada a Deus de coração, nunca é inútil, e que ele bem sabe
tirar proveito dela e dar-lhe um nobre emprego?
Para você, meu amigo,
ele fecha este caminho, pois o chama para um melhor. Para mim, sem
dúvida, a tarefa já a mim confiada basta à minha fraqueza, se é que não
lhe vá além. Assim, por aflita e triste que me pareça sua alma, estou
tranqüilo, pois saberá ou se queixar ou se consolar; não tenha também demasiado
pesar por mim, caro amigo. Como você, rezarei e, como você, reencontrarei a
paz.
Não é preciso dizer que não deixei de tentar ou de examinar os diferentes meios
que você me indicava em sua carta, para impedir a inteira destruição de nossos
projetos.
Apesar da gravidade das considerações de que falei com você muitas vezes quanto
aos meus recursos pessoais e às razões que me impedem de dispor deles
livremente, examinei uma última vez a situação e consultei também minha esposa.
Você sabe, caro amigo, como a doença nervosa de minha esposa a preocupa
dolorosamente com pensamentos tristes e temores felizmente infundados; mas
devo, você sabe também, para o descanso dela, levar isso em conta e não dar-lhe
nenhum motivo de inquietude. Meus anos, disse-me ela, estão contados, se ainda
devo ter alguns; durante estes poucos dias quereria repouso, não envolva, portanto,
nem você nem a mim em nenhum embaraço, sinto-me incapaz de suportar nada disso.
Que tudo isso não fosse fundado na razão, não importa. Não é verdade, meu caro
amigo, que é meu dever dar-lhe um valor absoluto e não desprezá-lo? Minha
esposa achava bom, no entanto, para não me recusar tudo, que eu tomasse a
responsabilidade do aluguel da casa durante os dois últimos anos do contrato e
que imediatamente eu desse 1.000 ou 2.000f, metade em móveis, para suprir a
insuficiência dos do estabelecimento, metade em dinheiro, para as outras
necessidades, mas isso não enche o vazio, não aplaina nada. Precisa-se de uma
importância redonda, um pouco mais redonda até que você parece acreditar. Em
primeiro lugar 4.000f
com seus 2.000f
presumidos de lucro em fim de ano, para completar o pagamento a fazer ao Sr.
Dufour. Depois, para assegurar o aluguel da casa durante o primeiro ano, mais 4.000f; para a reforma do
mobiliário 1.500f, para primeiros adiantamentos e despesas correntes 2.000f. No
total, dá 11.500f
e temos para prover somente 1.000f, a tirar talvez de sua aposentadoria e
a mesma quantia que posso oferecer. Sobra sempre, sendo otimistas, um déficit
de 8 a
9.000f. Você notará que esse cálculo é baseado na previsão que confesso
pouco admissível, de um não êxito absoluto.
Estive com o Sr. Marziou, com a intenção de lhe oferecer 1/3 do lucro, se
quisesse adiantar essa importância, a fim de que uma grande chance lhe fosse
dada em vantagem, se pudesse haver alguma chance em correr com saldo negativo.
A proporção estava baseada aliás, como dissemos, tanto sobre a idade como sobre
o caráter do Sr. Marziou que nos obrigava, ao mesmo tempo que íamos contratando
um compromisso com ele, a dar-lhe apoio e força contra nós mesmos. Os outros
dois terços do lucro deviam, em meu pensamento, pertencer, um a você, o outro a
mim, e servir para completar o pagamento do estabelecimento.
Encontrei o Senhor de la Noue68
no momento de minha visita ao Sr. Marziou e pude fazer minha proposição a este
último com tão maiores garantias que podia ter um conselho todo natural num
amigo inteiramente desinteressado. Logo na simples exposição dos fatos, ambos
pegaram fogo e pediram ardentemente a realização do nosso projeto,
oferecendo-se à porfia a concorrer com ele como numa coisa santa e útil para
todos os nossos amigos cristãos. Mas, afinal, nem um nem outro tem atualmente a
importância disponível de que precisaríamos e não podem assegurar expressamente
que poderiam apresentá-la em tempo fixo. O Sr. Marziou está sendo chamado neste
momento por sua família para prestação de contas, mas isso pode durar um certo
tempo; sua maioridade, aliás, ainda não chegou. Enfim, seria de temer que sua
família, numa legítima solicitude pela gestão de sua fortuna, reclame-lhe a
direção, com bastante insistência para ligar as mãos ao nosso amigo. Ele
partirá, portanto, daqui a pouco e espera poder nos dar resposta num prazo
bastante breve; mas você e eu temos bastante conhecimento das coisas para não
assentar uma determinação e concluir negócio sobre bases tão pouco seguras. Por
outro lado, não vejo caminho nenhum aberto, o pensamento da oposição tão
enérgica de sua mãe me aflige, aliás, e não me permite procurar tão livremente
como teria querido os recursos que poderiam por acaso existir ainda. Nem mesmo,
por vontade expressa, tentei os que você me tinha indicado, porque a você
pertence e não a mim apreciar o grau de liberdade legítima que lhe resta sem
faltar ao respeito e à submissão que deve à sua família. Limito-me portanto e limitar-me-ei
à simples execução de suas instruções. Fica para mim ver o Sr. Dufour. Não pude
encontrá-lo. Voltarei à noite. Em todo o caso, oferecerei você e a mim, à
escolha dele, para vigiar a casa gratuitamente durante todo o tempo que ele
queira se ausentar. Será uma compensação bem fraca pela incerteza em que o
temos mantido até agora. Não é, aliás, de se esperar que ele se preste a
qualquer conciliação do tipo da que você lhe tinha proposto, quer dizer, de
conservar a propriedade do estabelecimento. Eis o meu pensamento, meu caro
amigo, posso consignar aqui, com toda a certeza, a ruptura absoluta de nossos
projetos e dizer adeus com você a esse agradável sonho.
Posso escrevê-lo com toda a verdade, aquilo de que fico mais sentido em
tudo isso é você, é o apoio cristão que eu esperava encontrar em nossa
associação. Deus a isso proverá e ele mesmo me amparará talvez. Reze a ele
nessa intenção, eu o suplico, meu amigo, permaneçamos unidos pela oração ao
menos, se devemos de outro jeito ficar separados. Mas, estou pensando nisso
agora, você, então, vai abandonar Paris? E por quê? É quase somente ali que se
pode estudar à vontade! Você não vai, então, passar ali ao menos uma parte de
seu tempo? Sua carta parece dizer não, volte a esse assunto em sua
próxima carta. Adeus. Vou contar-lhe meu colóquio com o Sr. Dufour.
Seu de coração em Jesus
Cristo
Le Prevost
Peça por nós dois as orações do Sr. Lecomte.
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