A respeito
do serviço militar de seu filho. Notícias da guerra: cópia de uma carta enviada
do campo militar de Châlons por um membro do Círculo de Grenelle.
Vaugirard,
13 de agosto de 1870
Senhora
Marquesa,
Agradeço-lhe
muito por me manter informado sobre o que concerne a seu caro filho, e a suas
disposições próprias, e ao estado de sua boa mãe. Neste tempo de agitação e de
inquietude, tem-se necessidade de não perder de vista todos aqueles de quem se
tem respeito e amor.
Será
bem difícil, com efeito, que seu caro Richard evite uma separação temporária,
pois as leis que convocam todos aqueles que são válidos se apressam e se
sucedem, cada vez mais invasoras. Acredito que se, por motivo de sua pouca
idade e da necessidade que teria de concluir o grande empreendimento de seus
estudos, for possível subtraí-lo ao serviço neste momento, será o mais sábio.
Se não for possível consegui-lo, a vontade de Deus sendo manifesta e nada tendo
sido descuidado para afastar essa provação, a Senhora aceitará com submissão e
confiança as disposições da Sabedoria divina, esperando que ela saiba tirar
algum grande bem do que seria tão penoso para seu coração de mãe.
Temos,
de nosso lado, muitas dificuldades: 28 ou 30 de nossos Srs. leigos nos serão
retirados das obras para o serviço militar, todas as nossas casas vão estar em
grande sofrimento. Deus dignar-se-á lembrar-se de que lhe pertencem, como tudo
o que está em nossas mãos.
Cuido
que a Santa Missa seja oferecida cada dia às suas intenções por algum de nossos
padres. É o mais poderoso meio da ordem espiritual. Tenhamos confiança, Deus
nos ouvirá.
Um
dos jovens membros do Círculo de nossa casa de Grenelle, simples operário ou
contramestre, mas muito cristão e inteligente, escrevia nestes últimos dias a
seu colega uma carta do Campo de Châlons, onde está como guarda móvel. Essa
carta é tão simples e tão ingênua, dá tão bem a noção do Campo e da vida no
local, que acho agir bem lhe enviando uma cópia. Um de nossos padres que chega
do Campo, onde esteve para visitar um de seus jovens que faz parte dos
recrutas, ficou tristemente impressionado pelas disposições morais do conjunto
dos homens que aí estão reunidos.
Há,
perto do Campo, uma linda igreja, mas, mesmo no domingo, se vê nela apenas
alguns militares. A uma hora de caminhada do Campo, há uma outra igreja num
vilarejo isolado, onde vão os bons militares de bom grado, longe dos
olhares malévolos.
Queira,
Senhora Marquesa, aceitar e partilhar com a Senhora d’Hurbal e seu caro filho,
todos os meus sentimentos de respeito e de devotamento em N.S.
Le Prevost
Campo de
Châlons,
A meus bons amigos do Círculo,
Ainda estou perguntando-me se não estou sonhando e se é bem verdade que, há
oito dias, estou separado de todos aqueles que amo. Família, amigos, costumes,
tudo desapareceu para mim e, como quinhão, tenho a companhia de pessoas que,
sob nenhum aspecto, me são simpáticas. Pouso sob uma tenda, exposto ao vento e
à chuva e em relacionamentos contínuos com uns dez indivíduos mais ou menos
convenientes!
Que linda invenção que é o correio! Somente ele me permite comunicar-me com
aqueles que deixei ao partir para a glória. Os testemunhos de afeição
não me faltam. Chegam-me da minha família querida, de meus amigos íntimos e,
nesta manhã, recebi uma longa carta de nosso amigo comum, do excelente Sr.
Edouard [Lainé]. Em uma das folhas, li com um prazer indizível os nomes de
vários de meus mui queridos amigos do Círculo. Obrigado mil vezes por pensarem
neste pobre móvel que, longe de tudo, longe de seu caro Círculo de Notre Dame
de Grace, não esquece de ninguém. Não lhes direi, meus caros amigos, que tenho
muita saudade, acho que não duvidam disso. Os primeiros dias foram rudes,
asseguro-lhes, mas escrevi tudo isso ao nosso caro Presidente, e sei que lhes
deu notícias minhas. Direi-lhes, no entanto, que, para um jovem acostumado a
viver em sua família, nada pode ser mais penoso do que a vida do Campo. Mas,
para nós cristãos, que recursos não temos? É possível rezar em todo lugar,
mesmo sob uma tenda (que é, no meu parecer, o que mais se assemelha ao
inferno). Faço-o do melhor modo possível, e asseguro-lhes que meus colegas não
desconfiam muito!... No domingo, tive a felicidade de poder assistir à Santa
Missa em Mourmelon (de onde escrevo). Fica a 25 minutos do lugar onde está meu
acampamento. Vou para lá quase todos os dias, pois não se acha nada no Campo.
Na missa, três móveis, dois ou três militares e um oficial superior, que
edificou a assistência aproximando-se da Santa Mesa. A igreja de Mourmelon é
bonita como estilo, mas a devoção não é o forte da população. As ruas
estão cheias de soldados e de móveis, os restaurantes transbordam, os cafés são
muitos, extremamente cheios, mas a casa de Deus está vazia!... Amanhã à noite,
se estivesse em Grenelle, passaria uma boa hora em adoração em nossa pequena
capela. Espero que, por não estar ali, meus confrades da adoração não se
esqueçam do ausente e que rezem de todo o seu coração por aquele que seria tão
feliz por estar com eles nessa santa noitada, tão salutar para nossas almas.
Esperava receber em breve a visita de meus amigos, os móveis do Círculo, mas
foi julgado prudente não ajuntá-los aos que já estão aqui. Irão para onde...
Deus sabe!... Fala-se de Saint Maur (felizardos!), de Saint Omer
(para onde gostaria muito de ir por causa de minha família), de Lunéville (não
chique).
Querem ter uma idéia do que é o Campo de Châlons e da vida ali dentro? É o
seguinte: o Campo tem 80 km.
de circunferência (não tenho muita vontade de dar a volta). Essa imensa área é
dividida em planícies imensas para as manobras (as menores são do tamanho do
Campo de marte). Há o quartel imperial, onde reside o Marechal Canrobert, que
nos passou em revista há 3 ou 4 dias; há também outeiros para o treinamento do
canhão, alvos, acampamentos para 80 ou 100.000 homens, parques de artilharia e
mil outras coisas que não vi. Oh! há também um templo protestante (nada para os
católicos). Esquecia o hospital, as ambulâncias. Não acabaria. De resto, quase
não vi nada ainda, tudo isso está longe. Às 4h30 da manhã, um tiro de canhão dá
o sinal do despertar, que é tocado em música para a tropa (há ainda 30.000,
diz-se até 50.000 homens acampados aqui e que aguardam a ordem da partida). Às
6 horas, vamos para a chamada, depois ao exercício durante 2 ou 3 horas. Em
seguida, comemos a sopa, depois, para quem não está de guarda ou de faxina, é
tempo livre até o meio-dia. Vai-se à chamada e, em seguida, para onde se quer
(para quem não está de serviço). É preciso estar de volta às 9h., mas mais da
metade volta só às 11h. e mais tarde ainda. Durante quase todo o dia, os
soldados executam grandes manobras. Os grupos musicais tocam e, para mim, não é
a parte menos interessante. Ontem, assisti, com uma multidão considerável, a experiências
de metralhadoras. Mantinham-nos à distância muito muito respeitosa. Os
oficiais de todos os corpos estavam sozinhos perto das máquinas de morte, cujas
formas percebíamos apenas vagamente. A detonação é formidável.
No primeiro disparo, mais da metade dos espectadores se tinham deitado de
bruços. Atiraram a 2.000 e a 2.500 metros, e parece que o resultado obtido é
espantoso. Tudo isso não é alegre... Se, após esta guerra, fosse possível se
chegar a um desarmamento geral, mas... Perdão por ser tão tagarela, não quero
cansá-los a me escutar mais tempo.
Amizades e agradecimentos a todos. Não digo o nome de ninguém, por medo de
esquecer alguém. Recomendo-me de novo às boas orações do Círculo e, aguardando
que volte receber minhas cotizações, aperto-lhes a mão a todos.
Seu amigo e todo devotado
A. Gobrecht
Meus respeitos ao Sr. padre Baumert, M. Piquet, Caron e todos aqueles que
esqueço. O tumulto me impede de escrever um pouco corretamente. Desculpem os
erros, rasuras etc...
Campo de Châlons, sexta-feira 5 de agosto de 1870