Seu estado de saúde,
sempre inferior à tarefa que seu zelo quereria empreender. Diante do bem a
fazer, o pensamento de sua insuficiência o persegue: “não estou em proporção
justa com essa enorme cidade”.
17 de
novembro de 1836
Morto, doente ou adormecido, de qualquer jeito, você
desanima comigo, sem dúvida, meu querido Victor. Sua indulgente amizade não
terá agüentado desta vez, deve estar desconcertado. Tem motivo para tanto,
confesso. No entanto, eu estava vigiando, pensava em você e o amava sempre. Por
que este obstinado silêncio? Não saberia dizer com exatidão. Estou tantas vezes
tão mal disposto, quanto ao corpo, que o espírito carece de instrumento. É
guerra e luta perpétua entre um e outro. No meio de tudo isso, minha vida se
desgasta e vai passando sem proveito nem resultado para mim, nem para os
outros. A submissão passiva é o único mérito possível, e não a tenho sempre.
Perdoe-me, portanto, meu querido amigo, na verdade, meu coração não tem culpa
alguma. Sempre sou seu, sempre discípulo e irmão para você. Se digo isso a Deus
mais do que a você, é que ele está lá pertinho e você está longe. Possa ele lho
redizer e me guardar em união com você.
Ao ouvir-me, você me acharia impotente, andando de cadeira de roda, rabugento e
sempre a cuspir; não, não é isso. Estou somente fraco de corpo e de espírito,
não estou em proporção justa com esta enorme cidade, com esta prodigiosa
atividade, esta animação poderosa que ela, no entanto, exige. Estou sempre
atrasado, sempre com falta de tempo, de fôlego, de pensamento, de vida em uma
palavra. Tenho dela uma centelha, quando seria preciso uma fornalha. Conclusão:
indulgência e perdão, meu irmão Victor, amizade mesmo assim e paz constante
entre nós.
Sonho às vezes que deveríamos ter trocado, você e eu, de lugar; convinha tão
bem a você, com suas incansáveis pernas e seu ardor eterno, andar a
passos largos nas ruas pavimentadas, na mesma hora cumprindo cem deveres e
servindo cem amigos, dando conta de tudo, estando à altura da situação; e eu, a
vida rotineira e monótona de uma pequena cidade ficaria bem para mim! Mas penso
também nisto, a gente pode apoiar-se em você para tudo remexer, fazer dançar a
rotina e levar as pessoas a adotar seu ritmo. É assim, meu caro amigo? Tem
organizado aí sua vida à sua moda, ou antes o quebraram e domaram? Uma carta
que me mostrou Gavard já dá a resposta. Você é o Victor de outrora sem nada a
menos. Tanto melhor, amigo, pois o coração também é o mesmo com certeza. Tudo
está bem enquanto está assim.
Far-me-á grande bem ter uma carta sua a mim endereçada, toda fresquinha e de
nova data. Por minha culpa, não tenho mais outras a não ser antigas e, embora
todas estejam guardadas com respeito, não as releio. Você me deu sua
aversão a esse respeito. Não gosto muito de tomar a vida de ré. Faça-me
logo, portanto, uma epístola onde o reencontre, isso me rejuvenescerá e me
recolocará firme nos pés. Não esqueça, na sua carta, de fazer grande a parte
dedicada à sua bem-amada esposa; parece-me que ela estava outrora
implicitamente em você, e que, por isso, ela é por mim conhecida e amada, como
se nunca tivesse sido diferente. Théodore, o que ele faz? Não vai voltar logo
para você? Não sei o que quer a ele minha mulher, ela pede por ele todos os
dias. Insista um pouco para que parta. O Caldeu, o Siríaco e o Armeniano, e não
sei quantos outros, o reclamam também e eu igualmente, embora indigno e
inferior. Afeições a ele, a Maillard, Cosnier e todos, pois todo angevino,
sabe, de perto ou de longe, é sempre um pouco parente comigo.
Adeus, meu caro Victor, acima de tudo, respeito a seu bom pai e viva afeição à
sua querida esposa.
Todo seu de coração.
Le Prevost
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