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Jean-Léon Le Prevost
Cartas

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  • Cartas 101 - 200 (1843 - 1850)
    • 113 - ao Sr. Maignen
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113 - ao Sr. Maignen

Encorajamentos e testemunhos de afeição. Discretamente, o Sr. Le Prevost exprime a esperança de vê-lo consagrar sua vida a Deus. Ele fortalece seu zelo pela obra da Sainte-Famille, que ama “porque ela consola e edifica os pobres.”

 

Duclair, 4 de setembro de 1844

            Caro amigo,

            Você não me pediu resposta e eu não prometi responder; no entanto, se julgo pela alegria que me causou sua pequena epístola, algumas linhas de lembrança de seu amigo ausente serão bem acolhidas por você. Escrevo-as, portanto, às pressas, nos meus joelhos, e com grande risco de ser interrompido, pois pertenço neste momento tão plenamente à minha família, que é somente de escapada que posso roubar um momento.

            A leitura de sua carta me tomou ontem todo o período da manhã, um pouco porque está rabiscada aqui e acolá, como de costume, um pouco também por uma outra razão que deixo você adivinhar. A impressão que me fica, caro amigo, é doce, consoladora, feliz; sinto-me mais confiante no presente, mais tranqüilo para o futuro. Tinha necessidade, muita necessidade há muito tempo, de alguns detalhes íntimos sobre suas disposições interiores para com aqueles que o amam. Sofria muitas vezes e não ousava me queixar, por medo de ser mal compreendido; agora estarei mais tranqüilo, pois creio poder responder por você. Não peço que você mesmo responda, conheço-o bem, e não sou fácil de contentar em afeição. Se, portanto, estou contente e me mostro seguro do futuro, por que você também não o estaria? Quanto a mim, caro amigo, quanto ao que se encontra na intimidade de minha alma por você, não lhe digo absolutamente. Minhas palavras lhe dão medo, diz você, meu silêncio o persuadirá melhor e o tempo também trabalhará em meu favor.

            Eu teria agora muitas coisas para dizer, rechaço-as e as empurro para o mais fundo do meu ser, de onde quereriam  sair. Você fala, caro amigo, do frescor, da vivacidade das primeiras afeições; procure, pelo pensamento, entender aquelas que são consideradas como as últimas: quando, ao chegar ao cume da estrada e com os pés já na descida, se olha para trás. Ah! você não que, naquele momento de adeus e de pesar, se pode gritar para Deus: “piedade, meu Deus!” Mais uma doce afeição, uma só, para encantar meus últimos dias, para que o exílio seja menos duro e a espera mais suportável”? Se Deus nos atende na sua indulgente bondade, se  nos manda alguma alma meiga, terna, simples, que com ingenuidade abra o coração para nós e receba também nossas efusões, será que isso não é como uma flor de outono, mais suave, mais perfumada do que aquela da primavera? Não é bem perto do coração que ela é colocada, esta flor tanto mais cara e preciosa que o inverno vem chegando e que nada mais florescerá?

            Não insisto, pois prometi não dizer nada; aliás, é a mim mais do que a você que estou falando agora; justifico aos meus próprios olhos um sentimento que julguei muitas vezes excessivo e que o seria, sem dúvida, se não fosse oferecido a Deus de onde vem, tenho certeza, e a quem o farei voltar todo inteiro. Como as afeições assim elevadas, caro amigo, tornam-se puras, santas, apesar de sua força e de seu ardor. Eu estava lendo de novo há pouco, num livro de São Bernardo que me emprestou meu bom pároco, uma carta do santo abade a Roberto, seu jovem parente que o tinha abandonado; compreendi um pouco e senti também o que vale e até onde vai em ternura, em dedicação, uma afeição cristã. Um pensamento consolador também me veio: é que essas ternuras imensas não são senão um fraco derramamento do infinito amor de nosso Deus que forma seus discípulos e os ensina a amar do mesmo modo, senão tanto, como ele mesmo ama. Se, portanto, sentimos nossos corações mornos e muito pouco fervorosos em amor, aproximemo-nos dele, ele será nosso mestre e saberemos amar.

            Faz três vezes que me interrompem e, como bem tinha previsto, não poderei conversar intimamente com você aqui; como boa compensação, em certas horas do dia, faço longos e solitários passeios; desde que um panorama me agrade, que um vale, uma mata, algum acidente da natureza me pareça pitoresco e lindo, chamo alguém para me ajudar, a fim de melhor admirá-lo e para apreciá-lo comigo. Adivinhe bem quem pode ser essa pessoa e não longe demais, caro amigo, você o encontrará com certeza; senão, em alguma próxima excursão com  você, um domingo, vou lhe dizer melhor; mas você não vai acreditar, talvez, pois você é duro de acreditar; em seu lugar, eu acreditaria logo e já.

            É preciso, antes de terminar, agradecer-lhe pelos pormenores tão precisos e tão interessantes de sua carta sobre nossa Santa Família117; tudo estava bom, e nossos pobres estavam felizes. Que o bom Deus, nosso Pai, seja bendito por isso. Você estaria errado, de resto, em pensar que isso se fez sem mim; todos os dias, fielmente, rezava por esta família bem-amada; sábado, o dia inteiro, acompanhei em pensamento a você, caro amigo, e a todos os nossos amigos nas corridas multiplicadas que tinham de fazer; domingo, desde cedo, ofereci a Missa e a Santa Comunhão por esta pequena obra. Enfim, às duas horas e quinze, na hora em que se encerra a sessão, disse com todo o fervor de minha alma a oração da Santa Família para estar de coração com você. Você está vendo que não ficava ocioso e que uma pequena parte do bem que se fez cabe a mim. Gosto desta pequena obra do fundo do meu coração, não por ser nossa, nem porque sonho para ela, como você, grandes destinos, mas porque ela me parece bem no espírito cristão, e porque  consola e edifica os pobres aos quais, desde há muito e ardentemente, desejei consagrar meu sopro de vida. Oremos bastante para que Deus sustente, purifique nosso zelo e não deixe nossos esforços sem frutos.

            Coloque-me um pouco no meio de suas orações e boas obras, caro amigo; o mereço, pois você sempre tem uma grande parte nos meus mais caros pensamentos. Encarrego meu bom anjo de mensagens freqüentes para você e, se escutá-lo bem, sua voz deve ir avante no seu coração. Segunda-feira, como lhe tinha prometido, pedi a missa na intenção de seu pobre pai118 e assisti a ela com todo o fervor de que estava capaz.

            Adeus, querido, ame a mim tão bem como você puder, não peço nada mais; não seja ciumento, pois o amo de preferência, mais e diferentemente que os outros; não seja invejoso, pois, levando em conta sua idade, você está longe de ter algo a invejar a alguém. Agradeça a Deus por alguns dons preciosos que ele lhe tem feito, deixe que eles cresçam e progridam aos raios de sua graça, mas sobretudo ofereça-os a ele, reze ardentemente para que ele os tome para seu serviço antes de deixá-los ao mundo; com isso, responderei por você de um bom e útil futuro; com isso, você terá seu amor que vale mais do que tudo, e por acréscimo, a terna, bem terna, sempre mais terna afeição de

            Seu devotado amigo e irmão em N.S.

(até segunda-feira)                   Le Prevost

 





117 “Uma obra-prima da caridade parisiense” (padre Mullois). O Sr. LP. tinha observado que, entre as obras de caridade existentes, faltava uma consagrada às famílias. A Santa Família (em primeiro lugar chamada Oeuvre de la Consolation des Pauvres) procurará portanto reunir “as famílias da classe indigente e operária” para “reerguê-las e trazê-las de volta a Deus e à Igreja”. Nasceu na paróquia S. Sulpice no início de 1844. Reunia 1200 associados, assistia 300 doentes por ano. Os resultados espirituais ultrapassarão depressa as esperanças. Um padre é liberado exclusivamente para os pobres da Santa Família, o jesuíta Louis Milleriot (1800-1881), que será durante 32 anos padre-pregador. Obra de predileção do Sr. LP., refletia bem seu espírito e sua caridade. Cantavam ali o famoso cântico de Claudius Hébrard: “Oh, como é suave nesta terra, ver corações unidos entre si, etc.” Uma das páginas mais lindas escritas por M. Maignen descreve a primeira sessão, memorável, da Santa Família. (VLP. I, p.126), M. de Montrond, V. Pavie, e outros, saberão narrar em termos coloridos o encanto de suas reuniões (cf. Positio, p.75).



118 O pai de M. Maignen morrera no dia 3 de setembro do ano precedente.





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