Como a mãe do Sr. Le
Prevost se prepara a morrer. É-lhe impossível deixá-la para voltar a Paris.
Festa da Apresentação de Maria, na rua do Regard, esse “asilo abençoado que o
Senhor nos deu para abrigar e amadurecer um desígnio formado para sua glória”.
Duclair,
21 de novembro de 1845
Meu querido irmão,
Havia feito o propósito de responder mais cedo à sua boa e amável carta, cuja
terna benevolência me encorajou e amparou muito na dolorosa provação que
suporto presentemente; meu tempo está tão absorvido pelos cuidados incessantes
que exige nossa querida doente que tenho muita dificuldade, quando começo uma
carta, interrompida e retomada vinte vezes, para terminá-la.
Minha pobre mãe, caro amigo, não sente melhora alguma em seu estado; ao
contrário, enfraquece de um dia para outro, não tomando absolutamente nenhuma
comida; ela se sustenta unicamente pelos restos de uma boa e vigorosa
constituição. Até aqui, seu espírito está perfeitamente livre e suas
disposições de coração excelentes. Pediu ontem, com tanta insistência, que o
sacramento da extrema-unção lhe fosse dado, que o bom Pároco da paróquia,
para satisfazer seu piedoso desejo e em consideração à sua grande fraqueza, que
deixa sempre a temer algum acidente, achou dever conferir-lhe esse último favor
da Igreja.
Você teria sido edificado, caro amigo, pela piedade e pela resignação de nossa
pobre doente. Desde cedo, ela me chamou para perto dela, para me dizer em que
intenção ia receber o sacramento ao qual aspirava: queria se oferecer a
Deus para morrer ou para viver, segundo sua santíssima vontade. Respondeu às
orações tanto quanto pôde durante a cerimônia e se entregou depois, de todo o
coração, nas mãos do Senhor. Esqueço, diante de um pensamento tão consolador,
as angústias de todos os instantes que nos causam seus sofrimentos e seu enfraquecimento.
Acabo de perguntar outra vez ao médico se não via nenhuma esperança de
restabelecimento; nenhuma, disse ele, eu o enganaria falando de outro jeito;
mas, acrescentei eu, este estado de langor não pode se prolongar bastante para
que possa voltar a Paris ao menos por um pouco de tempo? Seria, respondeu ele,
arriscar não mais reencontrar sua mãe: uma fraqueza pode acontecer de um
instante para outro e no-la tirar subitamente.
Meu dever não me parece duvidoso: numa situação tão crítica, não posso deixar
minha pobre mãe que, aliás, me conjura a todo momento a não abandoná-la. Temo
somente que meu chefe de escritório, ao qual avisei às pressas o grave
motivo de minha partida precipitada, ache minha ausência longa demais. Convide,
peço-lhe, caro amigo, nosso irmãozinho Maignen a ver, na saída de seu
escritório, o Sr. Carré141 que ele conhece bem, para dar-lhe notícias
minhas, dizer-lhe o estado de perigo permanente de minha pobre mãe e rogá-lo
que responda a uma carta que lhe escrevi há vários dias já.
Peça ainda ao caro irmão Maignen para passar no meu porteiro e reclamar todas
as minhas cartas; ele teria a bondade de abri-las com você e vocês julgariam
juntos se há algumas que necessitem de me ser enviadas urgentemente, para que
lhes desse uma resposta. Essas, o Sr. Maignen as entregaria ao Sr. Carré para
que as fizesse chegar até mim aos cuidados do Pároco de Duclair. As outras
poderiam ser entregues à Santa Família ou à Conferência, se concernem a uma ou
a outra. Junto aqui uma palavra para reclamar minhas cartas junto a meu
porteiro, ao qual o Sr. Maignen dará ao mesmo tempo notícias minhas.
Na sua bondade, excelente irmão, você quer me assegurar que minha ausência lhe
causa algum pesar. Agradeço-o ternamente por isso e asseguro-lhe, do meu lado,
que volto muitas vezes por dia meu coração e meu pensamento para nossa pequena
casa da rua do Regard; ela me parece como um asilo abençoado que o Senhor nos
deu para abrigar e amadurecer um desígnio formado para sua glória. Possam os
nossos corações corresponder bastante à sua graça para afastar logo todo
obstáculo à realização definitiva do nosso projeto. Conservo-me unido de
coração a você e ao outro irmãozinho, na medida em que depende de mim: de
manhã, vou à Santa Missa às 7 horas, lembrando-me com grande consolação de que,
na mesma hora, vocês estão prostrados diante de Deus na capela de nosso
bem-amado padroeiro. Hoje sobretudo, festa da Apresentação da Santa Virgem,
ofereci você, o jovem irmão, o seu Girard142 e eu ao Senhor, para
sermos todos dedicados ao serviço do Senhor com o mesmo abandono e o mesmo amor
que a Virgem Maria; se, como penso, caro amigo, vocês fizeram a mesma oferta, o
Senhor nos terá olhado com misericórdia e dignar-se-á de abreviar o tempo de
nossas provações. Adeus, querido amigo, será para mim uma suave alegria revê-lo
e rezar ainda com você.
Seu ternamente nos corações de Jesus e Maria (Apresente-me particularmente à
lembrança do bom Girard).
Le Prevost
O jovem padre que veio visitá-lo, mande-o de volta, por favor, ao Sr. Henry de
Messey nº 82 rua Grenelle, que corresponde em minha ausência com o Sr.
Levassor, ou ao próprio Sr. Levassor em Chartres.
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