A beleza do lugar onde
trata de sua cura não apaga sua saudade da Comunidade de Grenelle. Desejo de
ver diversificarem-se os tipos de obras, para que almas dedicadas e generosas
possam empenhar-se na mesma vida de oração e de caridade. Haurir o amor de Deus
e do próximo nos Corações de Jesus e de Maria. Desejo do dom de oração
contínua.
Saint
Valéry-en-Caux, 24 de julho de 1850
Caríssimo filho em N.S.,
Não se passará, agora, um grande número de dias antes de reencontrá-lo.
Contamos partir sexta-feira, dia 2 de agosto, quer dizer, daqui a oito dias.
Teremos tomado, então, 22 ou 23 banhos. É o bastante para produzir bom efeito
e, como a estação foi perfeita, tenho confiança de que nossas saúdes
experimentarão realmente alguma melhora. Apesar dos belos campos, do ar livre
sob as grandes árvores, dos magníficos aspectos do mar, não podemos impedir-nos
de ficar com saudade de nossa pobre casinha de Grenelle, do nosso jardinzinho
tão estreito e tão apertado. Aí está a nossa vida: aí está o divino Mestre que
nos conduz e cuja terna bondade nos atrai; aí estão nossas bem amadas crianças
e nossos irmãos, cuja terna caridade faz a paz de nossos dias. Chegamos a
desejar que todo esse querido ambiente pudesse transportar-se para estes campos
tão vastos, tão livres, tão isolados do mundo e do barulho, onde se sente
somente a Deus manifestado em suas obras. Mas achamos que, para tal existência,
é preciso uma plenitude de vida, uma aplicação habitual a Deus, uma potência de
atração para ele que domina todo o ser e o absorve nele. De outro modo, e num
estado de graça inferior, não sentiríamos nossos anseios preenchidos,
sentir-se-ia um vazio e acreditar-se-ia que os dias são mal empregados. Tanto é
verdade que a sabedoria divina calculou tudo em vista das necessidades diversas
das almas, como fez a água para os peixes, o ar para o pássaro e a terra para
as outras criaturas.
Para nós, caro filho, nossa vida é Deus em si mesmo e na caridade; por isso,
estamos com pressa de voltar para perto de você para aí reencontrar essa
atmosfera que a bondade do Senhor preparou para nós.
Não estou pensando, caríssimo amigo, em nada mudar as coisas que a Providência
divina tem, visivelmente, acomodado às nossas aptidões e às nossas forças.
Gosto, assim como você, das nossas queridas pequenas obras, e espero morrer
dando-lhes, até o último dia, meus cuidados. Penso somente que seu círculo
atual é um pouco restrito e só pode convir a um certo número de almas;
que um pouco de ampliação seria melhor, a fim de que cada um pudesse achar
junto de nós seu lugar e que ninguém se afastasse de nós por falta de obra para
empregar-se. Ora, evidentemente, os patronatos e as Santas Famílias, por
excelentes que sejam, não saberiam ocupar muitas almas, chamadas, como nós, à
vida de oração e de caridade, mas que não teriam as mesmas aptidões ou
disposições de espírito. Eis todo o meu pensamento. Ele é partilhado pelo Sr.
Myionnet e não se afasta, creio, do seu próprio.
Amanhã, quinta-feira, realizar-se-á aqui a primeira comunhão das crianças. Será
para mim uma festa participar dessa emocionante solenidade. Em tais momentos,
penso que, no meio de todas estas jovens almas, há muitas puras e cândidas que
se unem ao bom Jesus num coração verdadeiramente amoroso e que o Coração do
terno Senhor vibra com grande alegria. Invejo seu santo ardor e uno-me a elas
para glorificar melhor a meu Deus. Nesta região de fé, sobretudo, as crianças
são boas; deve haver entre elas e o divino Pai uma festa toda amável e sem
perturbação nem pesar algum.
Tivemos também, domingo, como suplemento de graça, a festa do Sagrado Coração,
que se celebra tardiamente nesta diocese e que tivemos assim a alegria de
solenizar uma segunda vez. Considero a atração que nos impele a todos para essa
devoção aos Corações tão amorosos de Jesus e de Maria, como um dos maiores
testemunhos da predileção do Senhor em favor de nossa pequena família. Se você,
caríssimo filho, tem um espaço para mim no Santo Sacrifício, por minha vez,
coloco-o cem vezes por dia nos Corações sagrados de Jesus e de sua Santa Mãe,
pedindo que, ali, você tome inteira conformidade com suas adoráveis
disposições, a saber, como você tão bem indicou em sua carta, o amor de Deus, o
zelo das almas, a caridade indulgente e compassiva, o amor do desprezo, da
pobreza, da cruz. Não se acha outra coisa nesses dois livros divinos e, se
neles lêssemos toda a nossa vida, não aprenderíamos jamais outra coisa. Como
isso é curto e como essa ciência estaria logo em nossas almas se não
fossem tão insensatas e tão rebeldes. Trabalhemos, caro filho, com todas
as nossas forças para adquiri-la. Nossa vida será bem empregada se, no último
dia, o bom Mestre achar que seus alunos sabem bastante bem sua lição.
Estou feliz, caro filho, e bendigo a Deus pelo bom espírito que você demonstra
em sua carta: é confiança ingênua e desejo simples de dar-se ao Senhor todo
inteiro; com isso, e perseverando na oração e na humildade, atinge-se
seguramente o fim.
Rezo cem vezes por dia por vocês todos, mas não é ainda o suficiente, nem em
quantidade, nem em ardor.
Meu dever seria, como você diz, pedir incessantemente para
você as graças do Senhor, a fim de que Ele mesmo supra a minha insuficiência.
Peça, então, por seu pobre Pai o dom da oração constante e habitual, e
tornar-nos-emos todos ricos, pois ele não cessará de haurir nos tesouros do
divino amor para derramá-los a borbotões sobre nós.
Adeus, caríssimo filho, abraço-o nos Corações de Jesus e de Maria com sua
própria caridade.
Seu devotado Pai e amigo em N.S.
Le Prevost
Peço a você, caro filho, para procurar com o Sr. Lecoin, num pequeno registro
azul onde inscrevo endereços, uma anotação com uma pequena carta do Sr. de
Bioncourt, indicando os nomes dos oradores que prometeram falar à Santa Família
em todas as reuniões até o mês de setembro. Penso agora, escrevendo isto, que o
Sr. de Malartic deve ter classificado essa anotação nas peças diversas em um
bilhete. Precisaria ver o orador designado e assegurar-se bem de que ele não
deixará de vir domingo. Escreva-me, logo que souber, a decisão do Pe. de
Ravignan.
Queria escrever algumas linhas para nosso querido Gabriel, mas é tarde demais
hoje; rezarei, em compensação, um pouco mais ainda por ele.
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