Alegrias da
amizade. Representação de Marion de Lorme. Desejo de escrever um artigo sobre a peça, mas por enquanto, sua
fraca saúde lho interdita.
Sexta-feira,
2 de setembro de 1831
Sua carta demorou muito, meu amigo, e mesmo levando em conta os
descontraídos divertimentos ao ar livre, o esquecimento, por alguns instantes
de tudo o que não é casa paterna, cidade natal, campos ao redor, já havia
vários dias que eu esperava essa carta. Mas enfim ei-la aqui, seja bem-vinda.
Percorro-a às pressas, e para não gozar egoisticamente de minha alegria,
convido por uma palavra nosso amigo Gavard que, bem depressa, acorreu e temos
falado de você como sempre, pois não me lembro de uma entrevista com ele, onde
você estando ausente, não esteja logo como terceira pessoa. Não por termos
combinado ou resolvido isso, mas bem naturalmente e porque dois amigos depressa
percorreram todos os terrenos vagos das conversações gerais e por uma
inclinação insensível, como sem perceber, voltam aos assuntos de conversa
íntima, de confiança, de abertura. Então, se há entre nós alguma leve
divergência, acontece poucas vezes que não apelemos à sua opinião presumida
para julgar nossas discussões. Neste caso, meu triunfo é quase sempre
assegurado, pois sempre tomei para mim a causa que você mesmo teria defendido.
Outras vezes lamentamos sua ausência, tratando-se de um passeio, de uma
admiração a partilhar com você, de uma emoção de arte ou outra que sua presença
nos teria tornado mais suave ainda e sempre assim. É sobretudo na grande
solenidade, grande para você sobretudo, amigo dedicado do Sr. Hugo, é sobretudo
na representação de Marion que sentimos sua falta, nós e muitos outros
ainda, e o autor, e sua esposa e a peça também, pois os amigos estavam bem
dispostos, a assembléia brilhante e numerosa, a obra cheia de interesse e de
admiráveis efeitos, e, no entanto, o que lhe direi? Um certo frio, um tipo de
constrangimento reinavam na sala; enormes prolixidades (magníficas com certeza
em outro lugar) contribuíam a isso sem dúvida, mas faltava por outro lado a
todas as boas vontades uma direção, uma alma, um chefe. Havia aplausos, mas bem
moderados, não de arrastar, ainda menos a torto e a
direito, também sem entusiasmo. Mas que isso, meu amigo, não aflija sua
afeição. As prolixidades foram supressas e a peça ganhou tanto com isso
que anda agora em pleno sucesso, com grande renda cada noite; é hoje sua 19a
representação e sem dúvida haverá mais outras. Na 1a havia pouca ou nenhuma
oposição; pela 5a ou 6a surgira uma das mais maldosas e das mais grosseiras. Os
atos eram interrompidos; uma vez até, não foi possível terminar o 4o , mas era
tão evidentemente uma obra urdida pela inveja, que o público fez justiça. Em
dois dias, o caso foi resolvido. A peça bem sentida, bem compreendida,
aplaudida com um verdadeiro entusiasmo em muitos trechos, sempre bem escutada,
produz agora o maior efeito. A Sra. Dorval é soberba, há verdadeiramente
revelações contínuas em suas atitudes, seus acentos, seus gestos; você vai ver.
Você teria tido sobre tudo isso um artigo para o seu jornal, se o Sr. Gavard
não tivesse sido preguiçoso; ele tinha começado um, prometia cada dia
terminá-lo, quando sua carta chegou, mas o artigo estava bem pouco adiantado;
segunda-feira, vendo que dava para esperar mais o artigo, eu mesmo tentei às
pressas fazer um; mas o espaço de um dia não era suficiente.Tinha apenas um
esboço. Improviso pouco, e o calor extremo me enfraqueceu a ponto de minha
cabeça sofrer por isso. Fico cansado uma hora após o levantar, preciso de sono;
teria corrido um grande risco de arrastar ao sono também seus leitores; não se
escreverá nada portanto sobre isso; mas por que você não redigiria algo sobre a
obra impressa? Se não a possui, é um vivo prazer que lhe resta antes de morrer.
Para mim, não me era possível deixar de sentir todo o encanto que nele
encontrava, sempre novo e renovado, mesmo após tê-lo ouvido duas vezes. Seus
amigos tiveram para a primeira representação, cada um, um lugar na galeria,
reservado e numerado. Em seguida, distribui-lhes novamente muitos bilhetes:
enviei dois amigos ao Sr. Hugo com uma carta; enfim, para satisfazê-los
plenamente reclamarei mais entradas; você está contente comigo?
Estive ontem na rua Jean Goujon14 de propósito para ver todo o mundo e
lhe dar notícias recentes; mas cada noite o Sr. Hugo está no teatro. Madame
tinha-se retirado e sua porta estava vigiada. Ela, no entanto, vai bem e as
criancinhas também, e, até o Sr. Paul que vi ontem florescente de saúde, bem
apressado como de costume e por isso com traje bem desleixado. Recebi de nosso
amigo Mazure uma carta escrita às pressas sem dúvida e numa hora de distração,
pois, sobre sua esposa, seu lar, tudo o que há de novo em sua posição, nenhuma
palavra; excelente homem, havia esquecido tudo isso. A respeito de coisas
singulares, chegou mais uma irmã na casa do Sr. Gavard, doce e boa como as
outras, julgaria eu, mas com o nariz o mais curioso que se possa imaginar: ele
é pontudo e se recurva como um pescoço de cisne para a boca. Vou lhe escrever,
meu amigo, um outro dia, uma carta menos diluída e menos vazia. Já disse a
você, minha cabeça está cansada. Assim que estiver um pouco reanimado, quero
fazer algo também para o pequeno jornal. Teria tido, parece-me, hoje
ainda, mil coisas a dizer, mas não tenho espaço e minha fala é ruim demais.
Adeus, portanto, e até outra vez. É preciso amar seus amigos mesmo doentes. Ame
a mim ainda mais que de costume. É preciso apresentar minhas lembranças
respeitosas ao Sr. seu pai e falar de mim também a seu irmão, em seguida ao Sr.
Cosnier (somos amigos agora).
Léon Le
Prevost
Vou cuidar do quadro.
|