O Sr.
Maignen organiza Nazareth. Dificuldades em que esbarra. Soluções propostas pelo
Sr. Le Prevost. O uso dos meios sobrenaturais nas obras. A regularidade é
indispensável para salvaguardar os três pontos que são o espírito de piedade, o
espírito de família e o espírito de zelo.
Vernet-les-Bains,
22 de janeiro de 1856
Caríssimo amigo e filho em N.S.,
Acrescento algumas linhas àquelas que lhe escrevi ontem, para responder a todos
os pontos de sua carta de 15 deste mês.
Dormi mal nestes dias, não tenho, de jeito nenhum, a mente disposta, você o
perceberá bem; eu já estava um pouco assim ontem, e anteontem em pior
disposição ainda, pois tendo tencionado escrever-lhe, fui obrigado a renunciar.
Acolha-me assim hoje, tentarei ser melhor outra vez. Dirijo-lhe esta carta para
a rua do Regard, sabendo que o correio funciona mais rápido para Paris do que
para Vaugirard; diga-me se é para a rua do Regard ou a rua Stanislas que é
preferível, na ocasião, endereçar-lhe as cartas.
Você não tornou mais a
me falar das contas de Nazareth. Como estamos e como as pagamos? O Sr. Leblanc
compôs sua Comissão de verificação?
Muito aprovo sua idéia de fazer de Nazareth uma casa comum para as Santas
Famílias. Receio, todavia, que só aquelas do bairro possam acolher pobres ali;
aquelas que são afastadas quase não poderiam fazê-lo com vantagem, pois seus
pobres, afastados de seu bairro, perderiam todos os seus recursos ordinários e
não mais saberiam como subsistir. Veja, no entanto, como a coisa seria
encarada. Poder-se-ia, em todo caso, contentar-se com as Santas Famílias da
margem esquerda (do rio Sena) e isso seria suficiente; colocando cada andar a
1.000f, seria oferecer-lhes uma boa ocasião, pois seria avaliar os quartos só
em 100f,
o que é muito pouco, mas acomodar-se-ia assim. Penso que, em razão de nossa
pobreza, vamos deixar esses quartos absolutamente sem nada. O resultado será
que, entrando os pobres e não achando nem prateleiras, nem armários, farão aí
toda espécie de arranjos maus ou chocantes aos olhos; não seria possível adotar
alguma pequena disposição de apropriação para cada quarto e impor a cada
Conferência o encargo desta pequena despesa; seria pouco para cada uma, e seria
muito, no global, para a obra? Será preciso ainda fazer com que os pobres
retomem todos os seus leitos de ferro e os novos os tenham também. Quando
chegar o momento de ocupar a casa, precisaria ser nomeada uma comissão
administrativa para regulamentar estas questões e as outras; fale disso com os
Senhores Guillemin, Boutron, Leblanc.
Não vejo bem como poderia ser convidado o R. Pe. Lavigne para o sermão de
Nazareth, a não ser que o Sr. Pároco de São Roque, onde ele prega, diz você,
consentisse em dar-lhes sua igreja. Seria um pretexto; de outra forma,
arriscaríamos ferir o R. Pe. Lefebvre que foi de uma bondade constante para nós
e a quem devemos muita gratidão. Se você enxergar algum meio de contornar a
dificuldade, diga-me, farei o que você me pedir.
Quanto a mim, não veria inconveniente na orientação piedosa que se imprime ao
seu patronato e aos seus jovens operários, desde que seja uma marcha regular,
constante, e que não seja somente de circunstância. Mas me pareceria essencial
que a piedade fosse sustentada por uma instrução sólida e que se procurassem os
meios de torná-la atraente para os aprendizes e jovens operários. Esse ponto
não é sem dificuldade. Creio, em todo caso, que é preciso lembrar-nos sempre de
que somos nestas obras somente os representantes da Sociedade de São Vicente de
Paulo. Parecer-me-ia, portanto, muito desejável que você pudesse, quando tiver
um momento, ver o Sr. Baudon e, sem apresentar-lhe a questão de tal modo que
pudesse ficar apavorado, prestar-lhe conta do estado das coisas e consultá-lo.
Ele é bastante piedoso, para não contrariar nada do que é realmente bom, e é
judicioso demais para não traçar-lhe seguramente a linha na qual você deve
andar. Pareceria-me também bem desejável que o Sr. Berthuot não o abandonasse:
faça o que puder para tornar a cativá-lo. Seu afastamento vem talvez do fato de
que ele não se vê com espaço suficiente, tente assegurar-lhe um lugar; é um
jovem muito bom que fazia-se ali tanto bem a si mesmo como às crianças.
Devemos, em nossas obras, tender sempre a edificar nossos Confrades, tanto
quanto os pobres e os operários.
Penso, com você e com nosso querido padre Hello, que aproxima-se o momento em
que será preciso instalar-se em Nazareth, mas não há urgência absoluta,
enquanto a casa não for habitada. É, aliás, um assunto tão grave que me
pareceria essencial recomendá-lo antes de tudo ao bom Deus. Seria de opinião de
que fizéssemos uma novena à Santa Família, a partir da próxima segunda-feira,
para pedir ao Senhor luz a respeito do tempo e dos meios para esta ocupação.
Será preciso também, quando se tiver tempo, preparar com o Sr. Myionnet um
pequeno projeto de regulamento particular para esta casa, e examinar também em
reunião de Conselho quem poderá ser mandado para lá, quais os meios que se terá
para gozar ali de um pouco de recolhimento e de vida comum, como se
poderá, algumas vezes, voltar a Vaugirard e permanecer unido à Casa-Mãe.
Temos três grandes pontos a salvaguardar: o espírito de
piedade ou de vida interior, o espírito de família ou de comunidade, o espírito
de zelo e de dedicação. É preciso
conciliá-los e mantê-los pela regularidade. Tudo isso junto apresentará em Nazareth muitas
dificuldades. Eis porque é preciso iniciar rezando, depois examinando as coisas
diante de Deus, e enfim combinando juntos o que parecer melhor a ser feito.
Se fosse possível fixar a época da instalação só nos inícios, ou na primeira
quinzena de abril, esse momento seria, sem dúvida, bem próximo de nossa volta,
e seria uma vantagem para a Comunidade que se achará bem diminuída; mesmo que
eu ainda não fosse útil para muita coisa, o que é provável, seria sempre um a
mais! O irmão Paillé, aliás, estaria ali como elemento da velha Comunidade.
Não vejo bem o que nosso bom padre Hello
poderia fazer durante a quaresma, a não ser dizer ou mandar dizer a missa todos
os dias durante a última quinzena e talvez a oração da noite com algumas
palavras de exortação; mas acho que ele deveria tomar sobre si somente uma
pequena parte de tudo isso; a Páscoa o cansará, a Quaresma também. Se não se
poupar, não estará na prudência cristã e nas vistas de Deus.
A verdadeira tomada de posse (em Nazareth) me
pareceria ser o mês de Maria, realizado simples mas piedosamente, de modo a
tocar e conquistar muitas almas; espero que Deus lhe esteja reservando essa
consolação.
Adeus, caríssimo filho, eis que não tenho mais lugar para um pouco de conversa
íntima com você, mas, logo que você for aliviado do “grosso” de seus negócios,
prometo-lhe algumas cartinhas mas ternas e menos sérias.
Seu amigo e Pai em N.S.
Le Prevost
Escreverei logo ao nosso querido padre Hello, mas peço-lhe para comunicar-lhe o
que lhe escrevo sobre a instalação em Nazareth, principal assunto de sua última
carta; abrace-o por mim.
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