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Jean-Léon Le Prevost
Cartas

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  • Cartas 301 - 400 (1855 - 1856)
    • 365 - ao Sr. Decaux
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365 - ao Sr. Decaux 

O Sr. Le Prevost extasia-se diante da beleza da Provença. Estado religioso da região: “seria preciso aqui soprar um pouco o fogo sagrado nas almas”. Agradecimentos pelo zelo exercido em favor das obras de Nazareth. Projetos para a Santa Família.

 

Hyères, 18 de abril de 1856

            Caríssimo amigo e irmão em N.S.,

 

            Ainda não lhe escrevi desde minha chegada aqui. Não é por não ter tido muitas vezes a intenção de fazê-lo, mas não sou muito feito para as mudanças de lugar. Em cada estação nova, é preciso aclimatar-me, refazer hábitos, classificar as ocupações do dia, em uma palavra, sentar-me. Eis-me aqui, salvo novo transtorno, mais ou menos sentado: aproveito para escrever-lhe algumas linhas.

 

            Não lhe direi nada da região em que nos encontramos, meu irmão Paillé e eu. Muitos de nossos amigos vieram aqui antes de nós e puderam falar-lhe dela: principalmente os Srs. Legentil e Tulasne. É sem dúvida a mais linda região da França, a mais rica por suas produções, o clima mais suave, o sol mais radioso. Todas as maiores maravilhas da natureza aqui se acham reunidas: o mar, montanhas, vales encantadores, todas as árvores de nossas regiões do Norte e todas aquelas dos climas mais quentes que souberam aclimatar aqui. Em certos lugares, é possível acreditar que estamos na sombra das palmeiras da Síria. Em outros, nas florestas de abetos das regiões setentrionais. Para onde quer que se , tem-se vistas encantadoras, horizontes à vontade. Os doentes aqui encontram  passeios inúmeros sempre variados, nas alturas ou nos planaltos, segundo seus gostos e suas forças. Para suprir a fraqueza de suas pernas, eles têm pacíficas e pacientes cavalgaduras muito injustamente desprezadas entre nós e das quais eu mesmo pude, no Vernet e aqui, apreciar as sólidas qualidades. Não é muito majestoso, certamente, cavalgar um burro, mas é muito seguro e muito cômodo; pode-se orar, pensar, ler andando, sem preocupação e sem cansaço e, se acontece de cair, como fiz ontem sobre o sargaço na praia do mar, é sem risco nenhum nem grave contusão. Se estivesse na condição dos homens de lazer que, por situação, devem procurar tudo o que os pode encantar e alegrar, eu me expandiria mais sem dúvida nesta maravilhosa região de Provença, onde tudo parece feito para tornar a vida agradável e suave. Mas levei a sério meu papel de doente, uso de tudo somente como medicamento: o ar, o sol, os passeios, os descansos, tudo isso tomo como prescrição, não usufruo disso nem procuro por atração.

 

                        Admiro as bondades adoráveis do Senhor nos dons tão variados que fez às suas criaturas, e Ele parece tê-los prodigalizado aqui. Mas sinto-me ainda melhor chamado para Ele através de belezas de um tipo mais severo: os ásperos cimos dos Pirenéus, os costumes rudes e simples dos pobres camponeses do Vernet me convinham melhor e lembravam melhor, a meu ver,  a via que traça a aqui em baixo para o homem decaído e penitente. Quer dizer, meu excelente amigo, que à exceção até das ternas afeições e graves cuidados que me orientam incessantemente para você, estou aqui unicamente porque preciso estar, porque a vontade divina para me trouxe, e voltar daqui me será fácil e meus adeuses logo serão dados.

 

            No entanto, encontrei aqui, e isso me foi uma doce consolação, bons Confrades de Paris e também uma Conferência que me fez uma roda completa de amigos. Os que a compõem me parecem excelentes; seu Presidente e os membros da diretoria, em particular, são animados do melhor espírito. Suas obras têm pouca extensão até agora e se limitam quase à visita de algumas famílias pobres, que poderiam ser suficientemente assistidas de outra forma. Haveria muito que fazer para as crianças e os jovens, geralmente muito mal educados e que não parecem preparar belas gerações para o país; mas nossos Confrades são tímidos,  pouco empreendedores, segurados por seus costumes de vida mansa e pacífica. O Sr. Becquet, antigo presidente de São Vicente de Paulo, primo do Sr. Legentil, os incita muito e eu ajudo um pouco. Não sei se chegaremos a algum resultado. Encontro aqui muito menos entusiasmo e vida do que na Conferência de Prades, que é verdadeiramente zelosa e parece ter uma verdadeira compreensão do papel e da ação reservados às Conferências. Seria preciso aqui soprar um pouco o fogo sagrado nas almas. Infelizmente, não tenho mais muito sopro e vigor, minhas forças traem logo minha vontade.

 

            Como não me sentiria atraído para Paris quando incessantemente recebo novos testemunhos da bondade, da afeição, da dedicação dos amigos que ali deixei? O Sr. Maignen, em suas cartas, não se cansa de elogiar o zelo e a incomparável caridade de nossos Confrades que o cobrem, diz ele, de confusão pelos exemplos que lhe dão e as obras generosas que cumprem para levar a bom termo nossos empreendimentos. Não quero dizer-lhe, meu bom amigo, tudo o que ele me escreve, em particular sobre sua gratidão pelas assistências sem número e os testemunhos de sua afetuosa bondade. Lendo com uma alegria profunda esses pormenores tão consoladores, não posso deixar de achar muito boa e bem oportuna essa doença que só me afastou de nossas obras para melhor pôr em evidência o zelo e a dedicação cristã dos membros de nossa querida Sociedade. Tenhamos boa confiança, meu caro e bem amado amigo, pois as obras da Sociedade de São Vicente de Paulo, crescendo com ela, podem operar uma grande ação sobre as almas e tornar-se, nas mãos de Deus, um poderoso meio de salvação. Para mim, à medida em que avanço, tomo um interesse sempre maior pelos menores empreendimentos seus, pois vejo neles preciosas sementes e promessas cheias de futuro.

 

            O Sr. Maignen me disse, em suma, tudo o que você faz para a organização de nossa Casa de Nazareth. Agradeço a Deus incessantemente pelo que Ele põe no seu espírito e no seu coração para o acabamento dessa boa obra, e vejo  um  indício de seus projetos misericordiosos para com os pobres, os operários, as crianças que nos esforçamos por trazer de volta a Ele. Sua Sabedoria proporciona os meios ao fim que ela quer atingir e, já que nos põe nas mãos recursos mais poderosos para o bem que o havia feito até agora, é que Ele quer realizar assim algumas obras notáveis de edificação e de salvação. Oxalá sejamos instrumentos humildes e dóceis e correspondamos fielmente a seus desígnios.

 

            Queria comunicar-lhe algumas idéias que me ocorreram, a respeito de nossa Santa Família e que tenderiam a entrar mais diretamente no objetivo que nos tínhamos proposto de início: devolver à nossa pobre gente os sentimentos e os costumes da família cristã; mas recuo diante da demora que uma exposição por escrito implicaria. Adio, portanto, até minha volta os pormenores que teria para lhe dar a esse respeito e que não atingem, aliás, de forma alguma, o fundo da Obra.

 

            Ainda não sei precisamente o dia de minha volta, aguardo uma resposta do Sr. Tessier, cujos avisos devem regular minha partida. A estação bonita me devolve um pouco de forças e deixa a meus movimentos um pouco mais de liberdade; mas o ponto capital, a fraqueza e a suscetibilidade de meu peito, continua mais ou menos no mesmo estado. Com a vida de repouso e de cuidados que levo, com um clima como o de Hyères, a existência ainda me parece possível por um tempo, mas fora dessas condições duvido que haja meio de avançar. O verão talvez me permitirá angariar forças para o inverno. Deus sabe, não tenho, quanto a mim, necessidade de sabê-lo, e, sobretudo, não tenho que me inquietar: a cada dia basta seu mal.

 

            Seja bastante bondoso, meu caro amigo, para oferecer, oportunamente, meus respeitosos sentimentos ao nosso excelente Presidente, o Sr. Baudon, assim como a todos os membros do Conselho, que têm a caridade de se lembrarem de mim. Agradeço-lhes mais uma vez por suas orações e os conjuro para continuar o favor de me dedicá-las. Não me esqueça também junto a todos esses zelosos Confrades que partilham seus trabalhos e solicitudes pelas nossas obras de Nazareth.

 

            Adeus, meu excelente amigo, você conta entre as mais doces alegrias prometidas em minha volta; revê-lo e abraçá-lo será para mim uma grande e verdadeira consolação. Boa lembrança particular ao Sr. Frion e à sua excelente família.

 

            Seu todo afeiçoado amigo e irmão em N.S.

 

                                               Le Prevost

 




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