Observações
sobre o regulamento e a organização do Instituto. Regras que presidiram à sua
fundação. Relações com as autoridades eclesiásticas. Estado do pessoal e das
obras. O forte e o fraco.
Vaugirard,
31 de maio de 1856
Caríssimo amigo e filho em N.S.,
Agradeço-lhe pela interessante comunicação que me fez da carta do R. P.
Mallet242, concernente ao nosso regulamento; ela deve chamar duplamente
nossa atenção, por causa da elevada experiência desse bom Padre, e porque nos é
um novo testemunho da benévola disposição do Monsenhor Bispo de Amiens. Espero
muito que, durante a estada que deve fazer proximamente esse venerável prelado em nosso Paris, me será
possível chegar até ele e expressar-lhe nossa profunda gratidão.
Todas as observações do R. P. me parecem fundadas e acho que poderemos
aproveitá-las bem, à medida em que avançarmos e em que nos for dado completar
nossa constituição que ainda está, você sabe, apenas esboçada. Teria sido
desejável talvez que o bom padre Mallet soubesse precisamente que nosso
regulamento não passa realmente de um simples sumário de nossa situação e que
não o consideramos como um trabalho definitivo. Reconhecendo, desde o início,
que fundar uma sociedade religiosa é uma grande tarefa e que éramos incapazes,
por nós mesmos, de realizá-la, recusamos, por assim dizer, e, haurindo nossa
força em nossa própria incapacidade, nós nos propusemos nada fazer por nossa
inspiração própria e tudo deixar à conduta da divina Sabedoria. Andamos assim,
passo a passo, sem nos afastar dessa via, e encontramos nossa salvação.
Você sabe, com efeito, meu bom amigo, a paz, a união mais perfeita nunca
cessaram de reinar entre todos os membros de nossa pequena família.
Eclesiásticos e leigos, vivemos unanimemente nesta confiança: o Senhor nos
conduz, nosso barco não vai afundar. A graça divina nos amparou manifestamente
no passado, ainda será o apoio de nosso futuro. À medida em que vínhamos sendo
esclarecidos e em que as circunstâncias nos pareceram indicar os caminhos de
Deus, nós nos conformamos a eles, ou, antes, damos nosso assentimento às
disposições que sua Providência constantemente determinou.
Essas informações, se tivessem sido transmitidas ao R.P. Mallet, teriam sido
para ele, sem dúvida, a explicação das principais lacunas de nosso regulamento
e a resposta a várias de suas observações. Desejamos bem ardentemente que nossa
regra seja aprovada pela corte de Roma, mas a cremos ainda imperfeita demais e
insuficientemente definida para ousarmos submetê-la a essa corte. No entanto,
não ficamos fora da autoridade, andamos constantemente aqui sob os olhos de
Monsenhor de Paris que nos tratou, por sua vez, com uma bondade paterna e
espontaneamente escolheu o Sr. padre Dedoue, seu Vigário Geral, para ser nosso
conselheiro, nosso apoio e como nosso representante junto a ele e a seu
conselho.
As duas principais observações do R. P. referem-se à nomeação direta dos
membros do conselho pelo Superior e à posição aparentemente secundária,
que têm entre nós os irmãos eclesiásticos.
Parece-nos de total sabedoria que a autoridade do Superior tenha algum
contrapeso; a perfeita unidade de pensamento, que até agora existiu entre nós,
nos tornara essa necessidade menos sensível, mas tenderemos a providenciar isso
para o futuro.
Quanto à outra questão, que é evidentemente a mais grave, pensamos que o estado
atual resultante, você sabe, dos inícios de nossa obra, que foi puramente leiga
em sua origem, poderá exigir algumas modificações; mas achamos sábio, de ambas
as partes, deixar que a divina Bondade cuide de estabelecer um equilíbrio, que
temeríamos assentar sem jeito. Plenamente confiantes uns nos outros, ficamos
tranqüilos, confiantes em Deus e na caridade, que é a essência mesma de nossa
obra e que nos há de salvaguardar, é nossa esperança.
Lembro sumariamente essas circunstâncias já conhecidas por você, a fim de que
possa pedir mais utilmente as opiniões do Monsenhor Bispo de Amiens, caso tenha
ainda alguma ocasião de consultá-lo a respeito de nossa pequena família.
Informaram-me que Monsenhor de Salinis estava em dúvida quanto ao nosso futuro
porque, vendo somente nosso pequeno rebanho de Amiens, ainda tão imperceptível,
acha nosso pessoal pouco consistente e de medíocre valor. No entanto, parece
que, se quiserem considerar os tempos em que vivemos, a existência ainda
recente de nossa pequena família, as desconfianças que inspira nossa associação
nascente, somos bem providencialmente favorecidos. Nossa Comunidade se compõe
assim:
Nosso bom padre Viollat, nos tendo sido retomado para o Céu, restam-nos
somente quatro irmãos eclesiásticos [os Sres. Planchat, Lantiez, Hello e
Roussel]. Três dentre eles, pertencendo a famílias muito honrosamente situadas,
juntam à dedicação mais absoluta e a felizes qualidades de coração e de
espírito as vantagens de uma educação cuidadosa. O quarto [o Sr. Roussel],
embora mais novo e menos experimentado, é, no entanto, um padre de um
verdadeiro mérito, que várias paróquias nos disputaram e que o Sr. Pároco de
N.D. des Victoires, em particular, só nos cedeu por causa de sua afeição por nós.
Os irmãos leigos são 20, entre os quais seis letrados [os Srs. Le Prevost,
Myionnet, Maignen, Paillé, Carment e Caille], homens maduros, acostumados nas
obras; cinco dentre eles poderiam conduzir uma casa.
Oito moços [os Srs. Polvêche, A. Vasseur, Marcaire, E. Beauvais, Tourniquet, E.
Vasseur, Guillot e Boucault] vindos de casas de comércio, piedosos
inteligentes, dedicados, mas tendo necessidade de serem mais completamente
formados; foi preciso, forçosamente, pô-los a trabalhar por causa da
multiplicidade das necessidades, mas não lhes faltam nem conselho nem direção.
Enfim, seis irmãos [os Srs. L. Boursier, Thuillier, Mainville, Bulfay, Allard e
Assier] ocupados nos cuidados domésticos. Mais de dois terços da Comunidade são
engajados por votos (17 sobre 24).
Essa pequena sociedade, unida como está, não deixa de fornecer algumas forças
para o serviço de Deus. Infelizmente, as necessidades das obras nos constrangem
a espalhar nossos membros; estamos a serviço em cinco obras, das quais duas,
nosso orfanato e a casa de Nazareth, bastariam para nos ocupar a todos. Se
pudéssemos nos restringir, agiríamos mais firmemente. Aí está nossa
dificuldade: todas as obras caritativas têm necessidade de elementos e só
temos, para ajudá-las, um bem pequeno rebanho, sendo que a metade deles tem
formação média. Eis aí o forte e o fraco de nossa pequena Comunidade. Você não
se dera plenamente conta talvez, até agora, de nossa situação. Você poderá,
conhecendo-a melhor, dá-la a conhecer aos que ela interessaria e, sobretudo,
apresentar muitas vezes nossas necessidades ao divino Mestre, a fim de que se
digne remediá-las, segundo sua adorável vontade.
Assegure bem seus jovens irmãos de todas as minhas afeições. Espero vê-los dentro
em breve. O
cansaço de minha longa viagem tendo agora desaparecido, acho que poderemos, o
irmão Carment e eu, nos colocarmos a caminho para Amiens, logo que o tempo
estiver um pouco menos nebuloso. Peço-lhe que me diga, logo que puder, se,
daqui a uns dez dias, você não vê algo que o impeça de me acompanhar para
Arras. Esse tempo me deixaria espaço para tomar definitivamente minhas medidas
e para avisar também o Sr. padre Halluin de nossa chegada.
Você ficará sabendo com prazer que estamos também em via de associação com uma
outra obra muito interessante fundada no Interior (Marseille) e cujos
relacionamentos conosco poderão influir positivamente sobre nossos
empreendimentos caritativos. Falarei com você sobre isso mais à vontade em Amiens.
Todos os nossos irmãos apresentam-se à sua bondosa lembrança e continuam sendo,
assim como eu, ternamente unidos a você nos Corações sagrados de Jesus e de
Maria.
Seu amigo e Pai afeiçoado
Le Prevost
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