Desejo de ir em peregrinação a Roma. Orações
junto dos monges de Lérins, na ilha de Santo Honorat, para obter a união
habitual em
Deus. Importância do recreio tomado em comum, para que se
abram os corações e se mantenha o espírito de família. Aproveitar a doença para
o progresso espiritual. Falecimento de Dona Taillandier.
Cannes, 7
de novembro de 1856
Caro Sr. padre e filho em N.S.,
Você não mais acreditará muito na minha palavra, pois me tinha feito o
propósito de ir visitá-lo antes de deixar Vaugirard, se estivesse forçado a
afastar-me ainda durante esta estação de inverno. Mas tinha contado sem meu
hóspede, quer dizer sem o parecer do médico, que recusou-se a deixar-me
experimentar minhas forças ao menos durante um mês, como estava
pedindo-lhe, e que me obrigou a partir de improviso, sem nem me despedir de
nossos amigos e benfeitores em Paris. Comprometeu-se em poupar-me de toda nova
ausência para o futuro, se eu me mostrasse dócil e me resignasse ainda para
este ano a um tão rude sacrifício, enquanto considerava como comprometida a
melhora sensível já conseguida, se eu corresse os riscos de uma estação
rigorosa e dos cansaços que teria causado à minha frágil saúde. Nossos irmãos
insistiram para que seguisse esse parecer. Resignei-me e eis-me, de novo, mais
uma vez a 300 léguas de você e de nossos bem-amados irmãos. Nem tive a
consolação de escolher o local de meu exílio. Teria desejado ir a Roma, que
teria sido ao menos uma causa de edificação e uma piedosa peregrinação.
Pensou-se que ali o ar é pouco saudável e convém mais ou menos aos doentes.
Estou aqui num lugar que não tem nada notável, a não ser a beleza de sua
paisagem e a doçura de seu clima. Percebe-se, porém, a pequena ilha de Santo
Honorat, onde estão as ruínas ainda imponentes da célebre abadia de
Lérins249. Irei visitá-la, procurarei nessa terra que habitaram outrora
tantos santos religiosos alguns vestígios dessa fé profunda, dessa abnegação absoluta
que inspiravam então os servos de Deus. Pedirei-lhes, no mesmo local onde
tanto rezaram, para que obtenham para mim e para toda a nossa pequena família
um pouco do fervor que animava suas almas, e dessa união a Deus em que temos
tanta dificuldade para nos manter. Como seria feliz, caro Senhor padre, se
minhas pobres orações pudessem contribuir para um tão precioso resultado! Eu
seria bem consolado de minha inação forçada, e acharia ter servido bem nossa
querida Comunidade. O que me dá boa esperança para nossa casa de Arras é que o
vejo bem cheio dessa convicção de que não faremos nada sem a graça, e que não
teremos a graça, senão rezando incessantemente; é que você tem sobretudo
interesse em levar a Deus nossos irmãos e nossas crianças; é, numa palavra, que
você conta pouco sobre si mesmo e muito sobre o amor do nosso Pai
celeste, que você encarrega Maria, nossa Mãe, de todos os seus
interesses, e gosta de deixar-lhe o governo de sua casa. Tudo irá bem enquanto
andarmos assim; digne-se o Senhor manter-nos em tão bom caminho.
Suas últimas cartas, caro Senhor padre, não me davam notícias do Sr.
Cousin250. Ficarei satisfeito se tiver a bondade de me dizer algumas
palavras sobre ele em sua próxima carta. Espero que esteja melhor. Se você
tivesse alguma razão em pensar que as ocupações que ele poderia assumir em
Vaugirard e a mudança de ar lhe fossem mais favoráveis do que a estada em
Arras, poderia conversar sobre isso com o Sr. Myionnet e combinar
com ele o que se deveria fazer para dar esse alívio ao bom jovem. Se ele
tem, como creio, o sincero desejo de consagrar-se ao serviço de Deus, devemos
tratá-lo como um irmão e fazer por ele tudo o que pudermos.
Não sei como está nosso caro Sr. de Lauriston; esperava que me escrevesse. Até
agora, está silencioso comigo. Continuo rezando por ele, e espero que terá a
força de fazer o que Deus me parece pedir.
Esqueci de falar-lhe antes sobre a cerimônia da renovação dos votos, que se faz
habitualmente nas comunidades no dia da festa da Apresentação, no dia 21 de
novembro, e que está também em nossos usos. Farei chegar-lhe a pequena fórmula
e lhe indicarei na minha próxima carta como fazemos, em grande simplicidade,
esse ato de piedade.
Desejo muito, caro Senhor, que você deixe intacto seu recreio da noite, em toda
a medida do possível. A experiência nos convenceu de que é bem
necessário, para dilatar um pouco os corações, manter a união e o espírito de
família entre os irmãos. Insiste-se em todas as comunidades para que esse
exercício seja considerado como essencial e não seja mais negligenciado que os
próprios exercícios de piedade. Não vejo, às 7 horas, tempo para seu recreio,
outro exercício no regulamento fora do jantar e do recreio dos alunos. Parece-me
que, revezando-se, algum dos irmãos vigiando-os, os demais poderiam fazer seu
descanso em comum.
Você fará, tenho certeza, tudo o que puder para conseguir
isso. O espírito de sua obra, como o da comunidade, só poderão ganhar.
Peço-lhe insistentemente, caro Senhor padre, assim como aos nossos irmãos, para
não se esquecerem de mim nas suas orações. Estou no retiro, é verdade, e mais
livre de cuidados detalhados do que de costume. Mas fico privado dos apoios e
edificações da vida comum e, para aqueles que estão acostumados a esse apoio, é
um grande socorro a menos. Devo, aliás, por isso mesmo que trabalho menos
exteriormente, fazer melhor e mais na vida de oração e de união a Deus; é uma
coisa grande e que o homem não pode fazer sozinho. Queira, portanto, pedir ao
Senhor para que queira me assistir a fim de que eu responda a suas vistas
adoráveis.
Sou, caro Senhor padre, com uma terna afeição,
Seu todo dedicado amigo e Pai em Jesus e Maria.
Le Prevost
P.S. Recomendo insistentemente à sua querida comunidade uma santa alma
que Deus acaba de chamar para Si. Perdemos nela251 nossa amiga
mais dedicada e a protetora mais afeiçoada à nossa casa de órfãos. Peço-lhe
para se unirem todos a nós; peço-lhe também, caro Senhor padre, para oferecer
por ela o Santo Sacrifício.
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