Corresponder aos desígnios de Deus. O apego à
Regra favorece a unidade e sustenta o esforço dos membros da comunidade.
Penetrar-se mais do espírito de sacrifício. O Sr. Le Prevost se mostra exigente
por causa da afeição que tem por seus irmãos.
Cannes, 26
de novembro de 1856
Caro filho em N.S.,
Tomo de propósito, para escrever-lhe, um pedacinho de papel, para não ceder à
tentação de utilizar somente com você o tempo que desejo consagrar hoje a
vários dos meus filhos de Nazareth e, desconfiando do longo costume, que existe
entre você e mim, de uma expansão fácil e talvez complacente demais. Aliás,
tenho quase unicamente motivo para me alegrar com você e abençoar o Senhor pela
boa estabilidade que Ele deu à sua querida casa e pelas felizes
disposições de todos os que a compõem. Ao mesmo tempo que você me dava testemunho
disso, nosso bom padre Beaussier, de quem recebi bem recentemente uma carta, me
dizia também suas boas esperanças sobre o futuro dessa pequena fundação.
Esforcemo-nos, caríssimo filho, por corresponder, cada um por nossa parte, aos
desígnios da sabedoria e da misericórdia divinas; Deus faz muito por nós.Reuniu
em nossas mãos grandes meios para nossa santificação e a de muitos outros: uma
capela, um padre zeloso, uma comunidade, uma Casa de obras, um círculo de
amigos e de cooperadores dedicados. Quantos recursos, se soubéssemos
aproveitá-los! Quantas razões, para esperar muito no futuro, se formos bastante
firmes para sustentá-lo.
Vejo com alegria que você guarda fielmente seu
regulamento. Convenço-me cada vez mais da força que dá a uma comunidade este
precioso apego à regra; é o laço da unidade para todos, é o apoio da
inconsistência própria para cada um. Sem isso, a comunidade dispersa suas
forças e anula sua ação, cada um de seus membros tendendo a retomar posse de si
mesmo pelo capricho e pela arbitrariedade de seus movimentos. Acho que você
sairá ganhando muito, em particular, caro filho, colocando esse freio à
sua atividade e ao jeito improvisado de suas inspirações nas obras. Digo,
aliás, esta palavra de passagem, só para responder à sua carta, sabendo
bem que você está trabalhando seriamente para mortificar o que pode ser
repreensível em
você. Quanto ao espírito de sacrifício, penso que você
chegará lá cada vez mais, não ficando muito à vontade, mortificando-se
diariamente nas pequenas coisas, enfim, voltando constantemente a este
grande princípio: sofrer e ser humilhado de bom coração, é o resumo da doutrina
de Jesus Cristo. Nossa pequena Comunidade toda inteira, até agora, me parece
ter penetrado pouco demais nesse espírito, sem o qual, contudo, não há meio de
avançar. Aquele que tem os dons de amor, de luz e de fortaleza, digne-se
derramá-los bem abundantemente sobre nós.
Tudo isso é bem sério, caro filho; você não gosta de minhas cartas, quando não
acha nelas, em algum canto, um pouquinho de terna e viva afeição. Procurando
bem, você o descobriria por baixo daquilo que acabo de escrever: nada me
interessa tanto como vê-lo consumar em plenitude o generoso sacrifício que fez
a Deus de todo o seu ser; sua perfeição me é cara, porque ela glorifica a Deus,
mas também porque o amo ternamente, porque recebeu de mim mais do que
outros, e porque me seria doce até o fim dar-lhe tudo o que minha indigência
puder produzir de menos defeituoso. Não esqueço de que a oração fará mais para
isso do que todas as palavras do mundo. Rezo constantemente por você e por
todos os meus bem-amados filhos, por suas obras e por todas as suas
necessidades. Posso dizer que esta é minha principal tarefa aqui.
Esforço-me por me compenetrar desta convicção de que se coopera nas obras de
santificação e de misericórdia rezando e submetendo-se docilmente à vontade
divina. Estar inativo, quando temos tanto para fazer, sentir minha
incapacidade, quando sei que estão todos carregados, é uma cruz que me quebra penosamente,
mas espero que os alivio todas as vezes que digo: fiat voluntas tua;
repito-o tantas tezes quanto posso, mesmo quando sofro, como me vem acontecendo
todo este tempo.
Tenho dificuldade para me aclimatar, o ar destas regiões é muito vivo para mim;
e a força do sol me excita além do normal, por causa da fraqueza de todos os
meus órgãos. Meu peito irritou-se de novo, mas tudo isso é segundo Deus ou,
antes, por Deus. O tempo é magnífico aqui: o sol brilha todos os dias ou,
antes, resplandece, a região é magnífica, mais linda do que Hyères, o que
acreditava quase impossível; quantos temas de pintura você acharia aqui! Tudo é
quadro, tudo parece disposto a contento para dar os mais maravilhosos efeitos.
Mas para mim, não sei pintar, admiro e louvo o autor de todas essas maravilhas
e penso que Ele colocou muitas outras no mundo da graça, muitas outras ainda no
mundo celeste onde Ele dignar-se-á, espero, nos reunir.
Adeus, caro filho, abraço-o com uma certa pena, através dessas linhas
entrecruzadas; faço-o, contudo, do mais forte de meu coração.
Seu amigo e Pai em N.S.
Le Prevost
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