Inquietações de V. Pavie na perspectiva de se
casar. O Sr. Le Prevost o encoraja: o amor humano é a expressão do dom de Deus.
Apoiar-se em Deus.
Paris, 27
de dezembro de 1832
Sinto-me um pouco reerguido, um pouco menos desanimado, meu amigo, à medida em
que você deposita sua confiança em mim. Aqueço-me com o ardor de seus sentimentos e
esse doce calor afrouxa, amolece meus pobres membros adormecidos. Feliz de você,
amigo, por acender assim seu fogo, por convidar os outros à sua lareira! E
você, todavia, se queixa. E tem medo de se queimar! E você tem medo do
incêndio; vá, vá sempre. O incêndio não é chama e luz ainda? Sim, você terá
choros, prantos; será torturado; mas tudo isso é a vida da alma. É o poder de
abraçar e de amar que se revela. Ah! meu caro Victor, chore-as lentamente,
essas preciosas lágrimas; bendiga seu amargor, e do meio dos tormentos que lhe
vierem talvez, diga a Deus que fez jorrar em vós a fonte delas: Obrigado! Veja
ao seu redor, o Sr. Gavard, eu, vários outros que eu sei, outros ainda que você
conhece. Semelhante faculdade lhes foi dada? Não. Aspiraram à idade de amar e
já ela havia passado e ainda aspiravam! Então, cobrindo com tristeza suas
frescas e jovens esperanças, estenderam a mão a uma mulher. O que importava a
qual? Para viver perto dela docemente, dando-lhe apoio, respeito, ternura até,
tudo fora do amor, o verdadeiro e puro amor, pois não tinham para dar. E você,
meu amigo, apertando suas duas mãos sobre seu coração, quando bate depressa
demais, você sente pular nele o amor; e para você uma moça, a única talvez,
guardada também em ar mais puro, menos nublado que o de nossos dias,
desabrochou, por assim dizer floresceu, sem que pensamento nenhum ainda, sem que nenhum
olhar até tenha passado sobre ela; Como! Deus lhe deu tudo isso, e você se
queixa. Cuidado! Aconteça o que acontecer, portanto, meu amigo, mesmo na pior
das hipóteses, evite uma pena violenta demais ou insensata, que rejeitaria
ao rosto do céu os dons bem raros que lhe tem feito; como diz um de nossos
mestres: se a mão do Senhor o dobra, curve sua cabeça e chore”. Mas, eu tenho
confiança, o Senhor o reerguerá depois e, se devesse receber essa acabrunhadora
recusa tão temida, tão temível, não o acharia menos adiantado por isso; bem
mais, veria nisso um passo, um grande passo dado. Tenho medo, querendo
aconselhá-lo, de falar como insensato; mas você saberá muito bem dar a minhas
palavras a influência e o peso que elas merecem, somente isso, e prestar
atenção a uma voz mais elevada e bem mais sábia que a minha. Dito isso, a mim
parece que se Deus lhe disse mesmo que essa mulher era digna de você, que você
era feito para ela, Ele a dá para você, ela é bem sua e você pode acolhê-la.
Entendo que é preciso atravessar os pequenos obstáculos de vaidade, as pequenas
muralhas da sociedade, passar por cima e não ver ali montanhas inacessíveis.
Uma vontade firme e perseverante é mais forte que tudo isso. Recusarão. Que seu
querer seja mais enérgico. Dirão não. Grite, berre sim, mil vezes sim, sendo o
último a gritar; mas você não chegará até lá. Farão coro, e todo o mundo
cantará sim com você. Mas para isso é preciso estar bem seguro de si; não se
deve andar sozinho, é preciso ter Deus consigo, interrogá-lo muitas vezes pelo
olhar e só continuar a caminhada quando tiver dito para avançar. Acho que as
coisas vão desse jeito até agora, e pelo que sei, elas me parecem tais como hão
de ser. Essa mãe, de nariz para o ar, com o ouvido de atalaia, obedece à
natureza, nada mais. É guardiã de sua filha, vigia sobre sua criança, pois com
dezesseis anos, se tem necessidade ainda de sua mãe. Dois anos mais tarde, ela
seria menos desconfiada e se deixaria aproximar. Assim fazem os próprios animais
com seus filhotes. Arreganham os dentes e grunhem nos primeiros tempos, mas
mais tarde os deixam pegar e eles próprios os oferecem às carícias e à afeição
do homem. Mas todo sentimento autêntico torna clarividente tal mulher que sem
isso teria sido incapaz de atingir com o olhar a fronte de um homem,
verdadeiramente homem como você. De repente iluminada por seu amor de mãe, ela
lerá correntemente numa alma mistério, abismo profundo até então para ela.
Confie-se portanto a tudo isso, meu amigo, a mil coisas ainda que ignoro, que
ninguém de nós sabe, que no entanto não deixam de existir e, numa esfera que
não podemos atingir, fazem peso e contrapeso na balança de nossos destinos.
Adeus, deixe-me informado, você está bem assegurado de minha viva, de minha
terna simpatia, e alegria ou pena, você sabe, irá direto de seu coração ao meu
coração.
Seu amigo e
irmão,
Léon Le Prevost
Como sempre respeito e ternura para seu bom pai.
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