Votos de ano novo. Agradecimento pela ajuda
trazida a Nazareth. Após informação mais ampla, o Sr. Le Prevost decide não
renunciar à capela de Nazareth. Projeto de Conferência de São Vicente de Paulo em Cannes. Proselitismo
protestante.
Cannes, 29
de dezembro de 1856
Meu bom amigo,
Há, no fim do ano e no começo daquele que vai se abrir não sei que influência,
que agita em mim todos os meus sentimentos de afeição e de dedicação. É uma
velha impressão de infância, à qual cedo com tanto maior gosto neste momento,
que me sinto voltar a ser criança, à medida em que fico mais velho, mais
fraco, mais perto dessa outra extremidade da vida que, embora tão longe da
infância, lhe é parecida, porém, em alguns pontos. É por isso, caro amigo, que
lhe desejo um ano bom, e desejo também, senão para você, ao menos para os que o
amam, que seja seguido de muitos outros, repletos, como os precedentes, de um
grande número de boas obras e de atos de dedicação e de verdadeira caridade. É
o melhor e o mais nobre lote sobre a terra; é aquele que desejo e que peço a
Deus para você. Não lhe repito, meu bom amigo, quanta consolação me vem na
minha incapacidade, ao ver que tudo o que meu coração queria realizar está se
cumprindo melhor por você, mais vivamente e mais firmemente que eu poderia ter
feito. É evidentemente por uma inspiração de Deus que esse impulso de generoso
ardor lhe foi dado, é, portanto, como uma missão; ela o honra como vinda de
Deus. Será, tenho certeza, meritória aos seus olhos e digna de recompensa.
Peço-Lhe para assisti-lo por sua graça, para guardar a pureza de seu zelo e
para fazer deste um florão bem radiante e bem lindo para sua coroa.
Nossos amigos me escreveram o pedido que nos é feito da capela de Nazareth. Eu
tinha achado, no primeiro momento, que você considerava essa locação como uma
necessidade, seja porque era indispensável para a paróquia, seja porque devia
produzir um recurso, que a própria obra não podia dispensar. Tinha, portanto,
embora prevendo os inconvenientes graves da medida, achado dever aderir ao que
me parecia ser seu parecer; mas adotei, com viva atenção, a decisão oposta,
logo que informações mais precisas me permitiram enxergar melhor a situação.
Penso como você plenamente que, tirada a capela, nossa obra perderia seu
principal mérito, seu valor e seu significado, que deixaria desde então de
interessar ao mundo cristão e caridoso e não conseguiria mais criar para si os
recursos de que tem uma imperiosa necessidade. Vou, daqui a poucos dias, enviar
a nossos amigos uma nota respeitosa para Monsenhor o Arcebispo, para
explicar-lhe a situação em que estamos e as razões que nos impedem aderir ao
pedido do Sr. Pároco.
Você terá bastante bondade, espero, meu bom amigo, para apresentar ao Sr.
Baudon meus respeitos e votos de ano novo, assim como a todos aqueles dos
nossos confrades, que têm a extrema caridade de conservar-me alguma boa
lembrança. Escreverei logo ao Sr. Baudon; gosto de dizer-lhe de vez em quando a
situação de nossa pequena Comunidade, para que ela ande bem, em perfeita
união com nossa querida Sociedade de São Vicente.
Não perdi a esperança de colaborar para a fundação de uma Conferência em
Cannes, mas encontrei neste local até agora muitas dificuldades. Os católicos
têm muita dificuldade para se entenderem entre si, e bem pouco fervor para
sustentarem sua fé, que está sendo deploravelmente solapada pelos Ingleses
protestantes, que a beleza da região atraiu. Já compraram as almas de um
bastante grande número de pobres operários, que a ignorância e a miséria
colocaram à sua mercê. Acabam, estes dias, contra a vontade do prefeito e das
autoridades locais, apesar do parecer contrário do prefeito do Var, de ser
autorizados a abrir uma escola gratuita, cujo instituidor, pago por eles, é,
claro, protestante. Quarenta crianças já estão inscritas para freqüentar essa
escola, porque as outras não são gratuitas. Você não acha que, se os católicos,
por uma subscrição ou de outra forma, não tornam uma de suas escolas não paga,
não são dignos de guardar o dom de sua fé? No entanto, é de se temer em demasia
que agüentem ainda passivamente esse audacioso golpe a suas crenças na pessoa
de seus concidadãos pobres e fracos, que eles deveriam sustentar. Oremos muito,
meu bom amigo, e, segundo as nossas forças, não descuidemos de nada para
sustentarmos nossa causa, pois parece que o demônio está redobrando de furor
neste ataque.
Acredite, excelente amigo e irmão, em todos os meus sentimentos de inalterável
afeição em N.S.
Le Prevost
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