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Jean-Léon Le Prevost
Cartas

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  • Cartas 1 - 100 (1827 - 1843)
    • 14 - ao Sr. Pavie
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14 - ao Sr. Pavie

Com tato e delicadeza, o Sr.Le Prevost exprime a seu amigo sua união de coração e de alma. Conselhos de paciência. Recorrer à oração.

 

Terça-feira 12 de fevereiro de 1833

            Penetro tanto quanto posso em sua tristeza, meu querido Victor. Você está sofrendo. Basta. Não examino se tem motivo, o que importa isso? A dor não é menos viva; oh! sim. Quando você apoia sobre mim sua cabeça para chorar, a minha se reclina também para chorar com você. Será uma fraternidade a mais entre nós. Outros procurarão distrações para você, motivos de consolação; meu papel é sentir como você, temer, esperar, ter lágrimas e alegrias com você e como você, a fim de que, meu irmão, nossas duas almas, assim unidas, sejam mais fortes contra o sofrimento, não sucumbam sob a felicidade. Se toda esperança vem a nos falhar um dia, então, meu amigo, não terei mais palavras, nem murmúrio ou canto  para adormecer sua dor. Teremos somente lágrimas, lágrimas simpáticas que se entenderão, se dirão uma à outra o que há no coração, de onde  jorram, de ternura e de amargor, de abismo sem fundo que não se ousaria sondar. Mas hoje, sob seus temores, sobra ainda um pouco de esperança, um raio brilha para você, parecendo-lhe fraca e pálida estrela que se apaga; para mim, ponto luminoso de futuro e de dia que vai nascer. Firme, se é possível, sua vida, olhe bem e dirá como eu: não, não estamos mais em tempos em  que um amor verdadeiro, puro e profundo deve se sufocar na alma que o concebeu; a qualquer alma que ele bater, creio firmemente que se lhe abrirá. Embora possa não estar absolutamente de acordo com a minha opinião sobre esse ponto, você concordará comigo que uma afeição livre de todo interesse, de todo individualismo, que um devotamento exaltado, o amor enfim, tal como o entendemos, totalmente fora de si, sem que nada o ligue ao eu e possa fazê-lo retornar para esse eu, você concordará que um tal amor, digo, é bem raro, e que não há ninguém, fosse um bruto estúpido, que não lhe sinta o preço, que por instinto, cálculo ou simpatia não se apresse a recolhê-lo; pois, para uns, é a esperança da felicidade, para outros, nós por exemplo, a própria vida, o sine qua non da existência. Então, por que quer que uma mulher que parece inteligente e também dedicada e uma moça tão pura que não pode estar muito longe do céu, por que você quer que somente eles, entre todos, fiquem insensíveis e de gelo, sob um raio que aquece e funde tudo? Isso não poderia acontecer, isso não vai acontecer. Você queria, assim que essa moça lhe foi de repente revelada, de repente fazê-la descer em você; não se devia contar com isso; nessa idade se pode soletrar, mas não ler correntemente em uma alma; você não leva bastante em conta seus dezesseis anos. Precisa que o novelo ainda embrulhado se desembarace aos poucos; precisa enfim aqui a iniciação lenta e sucessiva, já que a revelação intuitiva não seria para agora. Tenha portanto paciência, meu amigo, não precipite assim as coisas, com o risco de tudo quebrar; procure tornar a sentar-se e, como seu amigo Cosnier o aconselha sabiamente, deixe as palavrasfaladas descer e cair gota a gota. Ah! se você pudesse ouvir o eco de sua queda, a harmonia encantadora que se elevará na jovem alma, oh! você seria feliz demais. Conjuro-o, meu amigo, seja mais calmo, não perturbe nada e o ouvirá. Sua imagem, pensa você, não é a de seu sonho; seguramente, pois uma moça bem nova, tive disso recentemente um exemplo notável, nunca sonha senão com faces brancas e rosadas e cabelos morenos e encrespados. Mas deixe acontecer e verá se a verdadeira beleza de um homem, os reflexos de uma bela alma reluzindo sobre a fronte, na voz, no porte, nos gestos, se tudo isso, por si  só, não cria logo pano de fundo, desenho, cores em seu espírito, não acaba enfim um retrato novo cujo original será você. Para terminar, acrescento enfim  que nunca no mundo existiu moça de dezesseis anos que, à primeira palavra de casamento, não tenha rompido secamente com uma recusa, apavorada, como você diz, muitas vezes com verdadeira cólera.

            Não conheço tão bem a mãe. Não saberia falar dela com tanta segurança, no entanto, ficando nas generalidades, há para mim, toda parcialidade de amigos à parte, mil a apostar contra um que você terá pleno sucesso junto a ela. Somente, meu amigo, não deve desanimar e, como uma criança emburradadizer: guardarei minha pena só para mim; não, não deveria acontecer que uma recusa, se viesse, (e pode muito bem vir) a seu coração um golpe sem eco que o envenenaria e feriria somente a você. Os golpes retumbantes são menos perigosos e, percutindo no ouvido de quem os , o comovem e lhe fazem  dizerbasta”. Você não poderia, então ver essa mãe a sós, e, controlando-se um pouco, falar com ela: sua submissão, suas promessas, esse acento de verdade que é preciso suportar de todo o jeito, teriam um efeito, senão imediato, pelo menos seguro, e que, direta ou indiretamente, chegaria a seu coração. Pode-se rejeitar um homem que pede um simples lugar, como todos, perto da lareira, que diz: ficarei sem olhar nem falar, estarei como todos, indo e vindo? e se um dia, não importa quando, acostumado a me ver, tendo granjeado em mim, você me diz: fique, então ficarei. Senão amanhã, depois, em qualquer hora você poderá me dizer: e adeus. Tome coragem, meu amigo, não indague em vão se pode haver alguma causa de disposição contra você; não há, não pode haver, ao máximo certa ilusão de vista, certo capricho de ótica, acidente passageiro da luz, que um raio dissipa iluminando melhor. Eis aí, tenho confiança, tudo o que se pode encontrar de obstáculo entre vocês. Quantas primeiras recusas! Que um pavor infantil não tenha portanto tanta força para perturbá-lo. Seja homem, seja sobretudo, meu irmão, crente, esperando em Deus, que tem em suas mãos os fios de tudo isso, reze a Ele. Eu, não esqueci um só dia de fazê-lo, desde o dia em que lho prometi. Adeus, meu amigo, escreva-me todas as vezes que tiver força  e não aguarde apenas  fatos decisivos. O que se passa em você, preciso conhecê-lo também e quero também participar nisso. O Sr. Gavard sabe, como você viu. Não tenho necessidade de lhe explicar as razões; elas me pareceram de consciência e de sentimento. Você as entenderá, aliás.

Adeus de novo. Abraço-o com ternura.

 

 

                        Le Prevost

 

 




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