Devoção
marial. Como as provações contribuem à nossa santificação.
Vaugirard,
25 de junho de 1858
Caríssimo
filho em N.S.,
Você
me acusa, com certa aparência de razão, de não manifestar muita diligência em
responder à sua última carta; explico a nosso irmão Jules [Marcaire], que os
dirá para você, os diversos impedimentos que me sobrevieram nestes últimos
tempos. Tinha também o pensamento de que, um dia ou outro, eu iria vê-lo
em Amiens, e que minha resposta, levada por mim mesmo, seria ainda melhor,
sendo que a gente entende-se bem mais facilmente por conversa de coração a
coração do que por correspondência. Não renuncio a esse projeto e tenho a firme
intenção de não deixar passar a estação sem visitá-lo. Até lá, caríssimo filho,
eu o acompanho, a partir daqui ,com os olhos do espírito; Deus me concede essa
graça de tê-lo habitualmente presente, penso em você muitas vezes e, sobretudo,
rezo por você bem fielmente todos os dias.
Os
pormenores que continha sua carta me interessaram muito. Reconheci com você a
misericordiosa bondade da Santíssima Virgem, que recompensou sua confiança
filial para com ela e lhe proporcionou a doce consolação de ir rezar em seu
santuário, antes de ir retomar seus trabalhos. Considere, caríssimo
filho, que, se sua condescendência estende-se a essas pequenas
suavidades, como deve ser-lhe ainda mais atenciosa e presente em suas
necessidades essenciais, em seus empregos, nos atos de sua vida espiritual.
Tenha, portanto, uma confiança mais firme e mais constante, e, sobretudo, não
considere como indícios do desencanto de Deus suas penas, seus desgostos, suas
securas. Ponhamos claramente em nosso espírito que esses estados da alma são
tão inevitáveis como o são, na ordem natural, a noite, as sombras, o inverno,
as intempéries, as doenças, as perdas dolorosas. Tudo isso entra, nos planos de
Deus, em nossa santificação. À medida em que as coisas rudes, penosas, as que
despedaçam, vêm acontecendo, parecem-nos amargas e horríveis, mas, vistas de
cima, são como as sombras num quadro, como as alternativas do frio e do calor;
ambos contribuem a fecundar a terra e a preparar as colheitas. Deixe, portanto,
o Senhor cultivar como quiser a terra de seu coração, permaneça em paz,
descanse tranqüilamente sobre sua sabedoria e sobre seu amor, os frutos virão
em seu tempo. Uma santa religiosa, muito avançada na caminhada espiritual, me
dizia ultimamente: “se queremos ser homens interiores, saibamos levar a pequena
vida, quer dizer comprazer-nos em ocupações humildes e nas posições
escondidas; saibamos também, aconteça o que acontecer, permanecer em paz,
felizes e bendizendo a Deus.” Suas inquietudes sobre suas disposições, seus
medos sobre suas securas e desgostos não têm, portanto, fundamento. Deus o quer
assim, deixe-o agir; de outra forma, você seria, talvez, tentado pelo orgulho
ou atormentado sem medida por outras tentações não menos penosas. Mais uma vez,
recoloque-se, simplesmente e com pleno abandono, no Coração do divino Senhor,
recomende-se ao Coração misericordioso de Maria e descanse em paz.
Adeus,
caro amigo, todos os corações estão em uníssono com os seus por aqui; ame muito
nosso irmão Jules e abrace-o por nós.
Seu
amigo e Pai em N.S.
Le Prevost
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