Saber saborear a
felicidade que Deus dá e santifica. Não precipitar o casamento. Projeto de
viagem ao estrangeiro para V. Pavie que dura pouco, pela indecisão de Gavard.
Pequena crônica de obras literárias ou religiosas que acabam de ser publicadas.
O Sr. Le Prevost trava conhecimento com Bailly. Assinala alguns indícios da fé
católica.
Terça-feira,
20 de agosto de 1833
Você aceita a felicidade com grande desconfiança, meu caro Victor, e não o
censuro. Receia as reviravoltas de uma esperança acolhida facilmente demais,
e faz bem. Depois, você tinha medo, admita-o, que eu recebesse com
alegria demasiada as coisas que ia me dizer. Então, comprimiu todos os
sentimentos que lhe enchiam o coração, deixando apenas exalar, em longos
fôlegos, umas leves baforadas. Era o bastante, e temores e alegrias, adivinhei
tudo por ali. Não tenho sempre, aliás, a mão sobre seu coração e suas batidas
precipitadas não me diziam as lutas que nele se travavam? Não tenha medo, caro
amigo, não irei depressa demais, não gritarei vitória e triunfo antes da hora.
Oh! eu me sentiria feliz, porém, em deixar com você, por um instante somente,
nada mais, todo medo pelo futuro; em vê-lo, confiante, afogando-se na
felicidade e saboreando em plenitude todas as esperanças infinitas que podem
deixar as mil coisas que você me narra, os mil pensamentos amontoados durante
essas poucas horas, os mil sentimentos que devem ter visto nascer! Se é
verdade que a felicidade existe para nós aqui, quase unicamente, nessas
aspirações ardentes para tudo o que lhe é parecido, onde estará portanto a sua,
meu amigo, se você se recusa constantemente a esses curtos descansos, sempre
aguardando, sempre desejando? Ainda não, e sempre atravessando as mais belas
horas de sua vida, correndo para outras que você ultrapassará ainda? Oh! sim,
aqui teria querido uma parada para você, um pouco de descanso e de frescor,
deixando para retomar em seguida o áspero e duro caminho, as corridas ofegantes
no deserto abrasador. Deus não nos pune por nossa felicidade, quando a
santificamos nele, quando a aceitamos como ele a envia, como uma consolação,
uma graça, como um meio de chegar a ele. Pode-se, pondo-o de parceiro em sua
alegria, abandonar-se plenamente a ela, com toda segurança e confiança, sem
medo pelo dia de amanhã, pois ele ainda lhe determinará a medida, e se ela é de
amargura e de tristeza ele não recusará a parte que lhe ofereceremos. Sinto-o,
é bem fácil, na calma onde estou, falar assim, e não quero dar extensão
exagerada a minhas palavras. Sei muito bem que há tais provações em nossa vida,
que não admitem nem descanso nem reflexões, onde se rola arrastado por um
turbilhão irresistível, não ouvindo mais, não enxergando mais, tendendo somente
com todas as potências para um objetivo, para um fim. Sim, assim é o amor e os
que se atemorizam com o turbilhão, que não ousam se lançar nele, que querem
tomar uma via menos perigosa, aqueles nunca chegam, o amor não é feito para
eles; mas, mesmo assim, ainda é preciso respirar e gritar às vezes: Meu Deus!
Ora, para você, meu querido amigo, não existe nem parada, nem trégua, em toda a
parte e para tudo, você se joga no turbilhão, você não anda, você está sempre
correndo. E quanto tempo você pensa que se possa ir assim, tenso até romper,
lançado até pegar fogo! Quereria portanto, meu amigo, que um pouco dessa
admirável força voltasse para você mesmo, afim de trazer para lá, por uma vontade
enérgica, um pouco de descanso e de calma, às vezes até um pouco de esperança
confiante e de total abandono.
Por que, por exemplo, esse pavor espantado diante da distância que se colocaria
entre você e sua felicidade completa? Deixe que digam, que façam, que se conte
nos dedos da mãe os anos, que o horizonte fique sem limite para ela e para sua
filha que, tão jovem ainda, se apavoraria diante de um futuro mais preciso;
depois, quando por sua docilidade, sua submissão de criança, você tiver enfim
obtido admissão, que não houver mais desconfiança contra você tão humilde e tão
resignado, neste instante, diga-me, você não será dono absoluto e livre de
mudar os lustros em anos, os anos em meses? Ao tomar a coisa na pior
perspectiva, segundo seus próprios desejos, um prazo um pouco distante
pareceria realmente a seu bom pai, a seus verdadeiros amigos, uma felicidade,
um tempo necessário de espera e de iniciação.
Se falo assim, meu querido amigo, não é, acredite, porque minha ardente simpatia
não voa com você para o objetivo desejado. Não é porque meu coração fica calmo
e frio, ponderando à vontade o bem e o mal. Oh! não, você sabe, eu que
demoradamente aqui o repreendo, leio de um só fôlego suas cartas, só respirando
no final. Cada vez que você sofre, parece-me que é preciso correr para você e a
impossibilidade material mal pára minha vontade. Mas, meu amigo, há ainda em
mim, para você, algo mais além da simpatia, há uma ternura infinita que quer
sua felicidade ao preço de todos os sacrifícios e rompe ou reprime todos os
impulsos da simpatia, quando afastam-se desse fim, em vez de concorrer a
ele. Veja-me assim, meu amigo, se quiser me ver em verdade e conceda algum peso
a minhas palavras, pois tudo o que há de melhor em mim as inspira, de melhor,
sim, pois não há reserva ali, nada que não lhe pertença, nada que não lhe seja
dado.
Irei hoje à noite à casa de Gavard e lhe direi na volta, se posso, melhor do
que ele ao menos, o que ele conta fazer.
Não é a afeição que falta a Gavard para seguir a você, nem é o desejo, é
somente a força de querer, força que quase nunca vi nele e que nunca talvez
tenha tido. O que você quer? É estranho, mas ele nos prova que, isso
tirado do homem, este ainda é uma rica e boa criatura. Aliás, talvez haja nele
uma ternura de coração exagerada, que o faz se ligar tão estreitamente a tudo o
que o cerca, que se desapegar disso é impossível. Desde o início, quando falei
com ele anteontem: oh! me disse, nunca, não me sinto capaz disso. Depois, lida
sua carta, era a ela que estava ligado, exclamou: oh! sim, quero, sim,
quinze dias, é decidido; depois, voltamos para perto de sua esposa que finge
encorajá-lo a partir, porque, no fundo, ela não teme nada. Era então coisa bem
diferente, e se você tivesse visto como eu a impossibilidade enorme,
intransponível que, de repente, se ergueu entre o projeto de você e sua
realização, você teria sorrido como eu, compreendendo o homem até o fundo e
perdoando-lhe também, pois, de verdade, não é culpa dele.Ele dá tudo o que tem
de potencialidade de querer; pedir mais seria mal e você não o fará, meu amigo.
Sinto sinceramente, e ele também, que haja tal virada. Não valeria muita coisa
para você em tal viagem a minha pessoa. Não lhe faria suficiente contrapeso. Na
falta de melhor, no entanto, já estaria a caminho, scirent si ignoscere manes48, manes
significando aqui administração, o que é traduzido menos livremente que se
poderia acreditar.
A Suíça parece acalmada e você poderia retomar seu primeiro projeto; seria
melhor para você, parece-me, ir para lá bem à vontade, respirar o ar, em vez de
pisar apenas num pedaço da Itália. Afinal de contas, porém, o Piémont, a
Lombardia sobretudo, bem podem ser destacados do resto e vistos em si separadamente.
Quanto a Gavard, sente inclinação para os Pyreneus; quanto a nós, palpiteiros
como somos, não temos nada mais a dar que nossos palpites; mas você, como o
homem ao burro: farei como bem entender, e nós de acrescentar depois: assim fez e fez bem.
Tudo isso, meu amigo, está escrito no desespero vindo de que minhas três
páginas se acharam inundadas, não sei com que, e que não tendo mais espaço
suficiente para nada levar ao término, tanto faz não começar nada. Temos aqui o
Sr. Gerbet.
Leia Lelia49, muita coisa ruim,
muita coisa boa; aí está, e em tudo que se publica hoje, uma insuportável
mistura das coisas santas com as profanas. O misticismo invade o romance; logo
será a cena. Teremos Mystères50, menos
a fé no autor, no ator e no auditório. Isso me inspira uma singular
repugnância, mas a prova é inevitável. Descoberto um filão, eles o esgotam.
Entreguei seu jornal ao Cabinet de Lecture.
Parece que você deveria ter declarado no correio que era um impresso: a ladra
me fez pagar dezoito centavos (nota somente para o futuro, não precisa dizer, e
de simples aviso). Meu pequeno trabalho sobre Pelllico parece perdido. Se a Revista o redescobrir, o mandarei para você,
meu amigo. Pediram-me um boletim de anúncios para essa mesma revista, poesias
de um jovem bretão, um pouco conhecido de você, Ed. Turquety: Amour et foi. Isso sairá no número de agosto,
salvo cortes talvez e ajustamento.
Conheci o Sr. Bailly51, e alegro-me por isso, como certamente você
entende. Ele confia a parte literária e filosófica do jornal que dirige, La
Tribune Catholique, a
alguns jovens e o produto dos artigos feitos por eles é colocado numa caixa
para esmolas, que os próprios jovens vão levar a famílias pobres; é uma
generosa e piedosa idéia. Terei, de minha parte, a alegria de entrar um pouco
nisso. Há neste momento, aqui, um grande movimento de caridade e de fé, mas
tudo isso na esfera isolada da humildade, escapa ao mundo indiferente. Estou
muito enganado, ou destas novas catacumbas surgirá ainda uma luz para o mundo;
não importa, aliás, qual forma terá o resultado, mas uma multidão de coletâneas
religiosas que se imprimem aqui agora em abundância e vão a todos os lados
levar a instrução em todos os níveis, e na medida de todas as inteligências,
revelam uma necessidade que até aqui estava adormecida ou se apresentava bem
menos urgente. Os livreiros dizem que não se lembram que, desde há muitos anos
atrás, um livro tenha sido vendido tanto quanto Pellico. De todos os lados,
faz-se dele novas edições. (A nossa não avança muito.) De outro lado, o Sr.
Gerbet me deu recentemente detalhes bem interessantes a respeito do movimento
de ascensão do catolicismo na Inglaterra; ele me relatou, em particular, uma
conversa do Sr. Rio, amigo do Sr. de Lamennais e agora companheiro de viagem do
Sr. de Montalembert com vários professores da Universidade de Cambridge, de
onde se pode tirar as mais belas esperanças. Se estes detalhes não lhe foram
comunicados, diga, e você os terá na minha próxima carta. Vi recentemente
cartas sobre as missões da América: elas também têm resultados bem felizes;
enfim, prepara-se aqui missões para a África que ainda não as tinha.
Tinha traçado no meu papel a linha de nec plus
ultra [a não ultrapassar] a fim de deixar
espaço para o endereço: ela não foi respeitada. Não sei mais como fazer. Não
sei como dizer-lhe muito em poucas palavras. Tentarei. Adeus, meu amigo, em
breve uma carta de você! Tivemos, digo nós, uma carta de Théodore, Gavard lho
disse sem dúvida, muito boa, bem jovem e amável carta. Mil coisas ternas e
respeitosas a seu bom pai; parece-me sempre que estou com vocês dois e que Deus
está no meio de nós. Amém! Terei motivo de responder-lhe sobre a data de sua
última carta, mas nos entendemos, chega de responder e aí está algo bastante
comprido. Adeus, amigo.
Léon
Le Prevost
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