Como se
escreve aos vinte anos. “Aspire em Deus para respirar a caridade, a dedicação”,
tal é o segredo da vida espiritual. Procurar a Deus renunciando às criaturas.
Confidências íntimas.
Vaugirard,
2 de setembro de 1862
Caríssimo
amigo e filho em N.S.,
Suas
queridas cartas vieram nos consolar de sua saída e prolongar um pouco a alegria
que nos tinha causado sua breve aparição; você conversa na correspondência como
no colóquio de viva voz, você está sendo reencontrado vivo nas suas cartas,
porque são uma efusão bem simples e como que um derramamento da fonte interior
que as suscita; é bem assim que se escreve na sua idade, a pena recebe da
abundância do coração. Vem um tempo, ele chegará para você como para todos, em
que a efusão é bem menos generosa, a fonte não corre mais, senão gota a gota e
como a custo, a experiência estancou-lhe os jatos e, se a caridade não
intervém, a expansão seca inteiramente. Que a alma transborde, então, quando
jovem, que espalhe ao seu redor sua fecundidade, é seu privilégio, ela dá com
tanta abundância que parece não poder esgotar-se. Feliz será você, caro amigo,
se a inspiração estando por dentro sempre pura, os borbotões exteriores fluem
também, límpidos e vivificantes. Aspire em Deus para respirar a caridade, a
dedicação e todos os tesouros do espírito cristão; aí está o segredo da vida
espiritual e a causa das maravilhas produzidas pelo zelo e o amor divino.
Eu
deveria ter respondido antes, você pode pensá-lo ao menos, à parte de sua carta
pela qual você me propõe bondosamente um preceptor para substituir o Sr.
Marty. Achamos que convinha, antes de tudo, pedir informações para saber se o
cargo ainda estava disponível; a família interessada nos respondeu que estava
tentando um ajuste com um candidato apresentado, de outro lugar, que era muito
incerto que ela se comprometesse com ele, que em breve daria uma resposta
definitiva. Essa família, muito honrável, habita ordinariamente a Touraine e
aparece em Paris somente por raros intervalos. Os emolumentos dados por ela ao
preceptor de suas crianças são de 2.000f por ano, e seriam levados em seguida
para 2.500f. As duas crianças têm 10 anos, são gêmeos, nunca deixaram a casa
paterna; se alguma resposta tendo o menor interesse nos chegasse, eu me
apressaria em informá-lo dela.
Perguntei
ontem ao Sr. Maignen se ele lhe tinha escrito; ele ainda não o fizera; ele o
lamentava vivamente, o tempo lhe faltou até agora; compreendo-o, escrever é
coisa tão lenta, tão imperfeita, tão insuficiente; pensar, sentir, se lembrar
se realiza como o clarão do relâmpago; a pena, enquanto isso, se arrasta no
papel, soletrando as palavras como a criança que começa a juntar as letras;
como desculpo os que escrevem mal para fazê-lo com mais rapidez, como entendo
também os que não encontram a folga para um tão impotente exercício, enfim,
como sou daqueles que usam dele com desconfiança e sem gosto! Quero dizer aqui
que eu teria mil coisas a dizer sobre alguns pontos de sua carta, sobre a
quarta página em particular onde, a exemplo de santo Agostinho (a comparação
não tem nada de desagradável), você renega todas as coisas neste mundo como
incapazes de encher sua alma. e você se detém somente em Deus para ali
permanecer e repousar. Cor nostrum inquietum et irrequietum donec requiescat
in te. Nessa via, irei com você tanto e tão longe como você quiser; se uma
verdade me vai ao íntimo da alma e me faria, mais do que qualquer outra, entrar
em contemplação extática, é aquela. Como almejo, caríssimo amigo, que ela o
penetre de parte a parte, ou, antes, como me alegro por ela tê-lo, com efeito,
tão vivamente agarrado; é o sinal característico, é a marca que Deus imprime
nos seus, é a doce corrente que os amarra e os une invencivelmente a Ele.
Enquanto esse precioso toque permanecer em você, fique em paz, você tem a
melhor parte e ela não lhe será tirada – se você mesmo não a tirar.
Eu
quereria muito conversar com você longamente, mas para escrever às pressas ou,
antes, para acabar estas linhas já várias vezes retomadas, ultrapassei a hora
em que, de costume, faço uma pequena oração por você; deixo-o para fazê-la e,
sob a impressão deste colóquio interrompido, esforçar-me-ei por lançar no
Coração de Deus tudo o que gostaria de exprimir aqui. Oh! sim, caríssimo filho,
falemos muito e muitas vezes um a outro em Deus, ali não há lentidões,
insuficiência alguma de linguagem e de sinais. Ele vê a preparação do coração,
o pensamento que vai nascer, o sentimento confuso que desponta no fundo do
coração, sem barulho de palavras. Oh! como isso é atraente! Eu calo, não,
ainda falo, mas no seio de Deus, escute bem, o eco irá ao seu coração de amigo
e de filho.
Sou
bem afetuosamente em Jesus e Maria
Seu
amigo e Pai
Le Prevost
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