Projeto de um lar para
jovens. Associação com A. Levassor. Atitudes de prudência do Sr. Levassor, pai.
Obra dos jovens detentos. Notícias das pobres visitadas por um amigo.
Paris, 25
de agosto de 1834
Minha resposta, meu caro amigo, terá demorado mais ainda que sua carta e não
sei se, como você, poderia dar a isso alguma boa desculpa. Não é, todavia,
negligência nem preguiça, mas sim por não poder dar conta das ocupações
momentâneas que me surgiram, ou um pouco de falta de habilidade na distribuição
de meu horário, ou na ordem de minhas ações. Sei de antemão que você possui uma
reserva de indulgência para tais delitos. Sem mais apologia, portanto, passo
adiante para os nossos negócios.
Fico sabendo, com uma satisfação bem viva que o consentimento de seu pai, base
essencial e fundamental de nosso projeto foi conseguido, ou antes, o que é
ainda melhor, plena e livremente concedido. Bem adquirida essa segurança de
consciência, não teremos mais obstáculos, a não ser secundários, e nossa
vontade firme poderá, espero, facilmente enfrentá-los. E em primeiro lugar, meu
amigo, a objeção levantada pelo Sr. seu pai a respeito da associação pura e
simples entre nós, não será um problema. As inquietudes que manifestou aqui o
Sr. Levassor não me ofendem em nada, sendo que não tenho a honra de ser seu
conhecido. Aliás, elas não me teriam, em nenhum caso, ferido; eu as teria, como
se deve, atribuído à sua terna solicitude, à sua prudência que deve ajudar a
sua em toda decisão importante para você. Dou portanto, aqui, pleno
consentimento às disposições que você me propõe e desejo que minha diligência
em fazer-lhe esta concessão possa aparecer ao Sr. seu pai um penhor de inteira
segurança.
No entanto, meu amigo, você me permite fazer-lhe a esse respeito algumas
observações, deixando-as aliás à sua livre decisão. Prometi-lhe que tudo o que
seria de meu interesse pessoal seria logo sacrificado e não poderia fazer
sombra de obstáculo para o sucesso de nosso projeto. Assim será, o
asseguro de novo, e é unicamente no interesse de nossa própria obra, que
insisto um pouco nesta ocasião. Pensa, meu amigo, que a nova combinação
proposta por você não destruirá o equilíbrio, a harmonia desejável de uma
inteira igualdade entre nós? Acredita que não vai criar superioridade de um
lado, subordinação do outro lado? Nesse caso, você está bem seguro de minha
completa abnegação? Será esta suficiente para sustentar meu ardor em uma obra
que, em mim mesmo, não terei mais o direito de dizer minha? Apesar de minha
confiança sem limite em sua delicadeza, em sua generosidade mesmo, não tem medo
de que, em algumas horas ruins, este pensamento desanimador se infiltre em mim:
“aqui nenhuma autoridade direta, nenhum direito para você, amanhã, você poderia
encontrar porta fechada e seria certo, seu lar não está ali”.
Não vá acreditar, meu amigo, que estas reflexões tendam a fazê-lo mudar de
parecer; de jeito nenhum, desejo somente voltar um instante sua atenção para
elas; se você confia em mim o suficiente para que elas não o preocupem, estou
demais ufano com sua confiança para ater-me nisso; por outro lado, se você
pensasse que, afinal, não se deve demasiadamente presumir de suas forças nem
das dos outros, sem mudar em nada o fundo de sua proposição, talvez fosse
possível, por algumas palavras faladas ou escritas, mas sem nenhum valor legal,
restabelecer mais equilíbrio, criar entre nós alguma obrigação mais precisa,
moralmente ao menos e religiosamente. Você me dirá a esse respeito seu parecer
definitivo e, depois, não se falará mais sobre isso.
Não preciso dizer que vi o Sr. Dufour56. Em uma primeira visita, o
encontrei ausente; voltei outra vez e conversamos algum tempo juntos. Ele
parece absolutamente na mesma disposição em que você mesmo o achou; somente o
parecer de seu bispo devia resolver definitivamente sua determinação, quanto ao
momento preciso de sua aposentadoria; mas seria, disse ele, ao mais tardar no
ano que vai começar, de qualquer jeito. Não devo dissimular para você que
este ano, ao menos, parecia-lhe desejável para suas disposições de partida;
isso seria subordinado, porém, entrevejo eu, às ofertas que ser-lhe-iam feitas
para um emprego mais ou menos próximo em sua diocese. Deve partir amanhã; daqui
a pouco, se cumprir sua promessa, ele deverá escrever-me. Não deixarei de
comunicar a você sua carta pelo correio, logo ao recebê-la, a fim de
combinarmos a resposta. Seu retorno para cá é fixado para o começo de outubro
ou, até, o fim de setembro. Ele partiria de novo para visitar algumas das
famílias que confiam-lhe seus filhos. Não pareceu achar que minha ajuda lhe
fosse necessária em sua ausência; o repetidor de direito atual continua
provisoriamente a vigiar a sua casa.
Quanto ao arrendamento, objetou numerosas dificuldades em seu interesse e no
nosso, para prolongá-lo durante 3 anos. Todavia, insisti, pedindo-lhe para ao
menos sondar o terreno e assegurar-se precisamente de que haveria
impossibilidade, ou desvantagem grave, em dar-lhe uma duração menos longa. Não
sei o que ele terá feito e se a promessa que para tanto obtivera dele terá sido
levada em conta.
Coloco-lhe, caro amigo, todas essas coisas bem sumária e
apressadamente; voltarei sobre isso, pois ambos o tempo e o espaço me faltam.
Estamos instalados perto de nossos jovens presos57. Falar-lhe-ei deles mais longamente, quando tiver
visto melhor o que se há de esperar deles; à primeira vista, os consideraria de
bom grado como outros tantos santinhos: pobres meninos, a realidade é bem
diferente! Um deles, de excelente família, separado dos outros, com quem
conversei ontem bastante tempo, está encarcerado por ter batido em seu pai. Tem
mais de dezenove anos, quase vinte. É o único que conheça; por ele,
julgue o resto. Muitos não sabem ler, alguém lhes ensina mal ou nada; vamos cuidar
disso. Adeus, meu amigo, visitei suas pobres protegidas, todo o mundo ali
esmorece de saudade, você é sua vida: a caridade e a graça chegam ali através
de você; volte, portanto, para o bem delas e também um pouco por seu amigo
devotado em J.C.
L. Le Prevost
|