Impressões
do peregrino da Salete. Lugar que a Virgem Maria tem na vida espiritual do Sr.
Le Prevost. Breves notícias da Comunidade.
Allevard, 10 de agosto de 1865
Caríssimo
amigo e filho em N.S.,
Não o
procuro mais em Nossa
Senhora dos Eremitas, porque já passou adiante. Assim vão
todas as coisas neste mundo: o homem é um transeunte, não se detém nem nos
lugares, nem nas coisas, uma voz imperativa lhe grita: “Anda”. Andemos,
portanto, caro amigo, mas andemos rumo à pátria onde repousaremos enfim! (Estou
escrevendo ao ar livre, nos joelhos; leia se pode, são esses meus costumes no
campo). Na sua volta, você me dirá os piedosos incidentes de sua peregrinação a
Einsiedeln. Eu lhe contarei os da Salete, será dupla ocasião de edificação. Não
se deve procurar, nem sempre esperar, nessa visita dos lugares santos, emoções
vivas, graças sensíveis e extraordinárias. A calma e a serenidade da alma na
simplicidade da fé são um estado bem doce e que só Deus pode assentar em nós. Precisa,
portanto, saber desfrutá-las e não lastimar disposições que são diferentes, sem
dúvida, mas que não são melhores. Não saberia dizer que eu tivesse
experimentado sentimentos desconhecidos, comoventes no Santuário e nas estações
piedosas da Salete. Estava em paz, feliz como se está na casa paterna, que nada
tem de agitação, mas onde a pessoa se compraz melhor do que em qualquer outro
lugar. A despesa, o cansaço, outros inconvenientes nem eram percebidos e não
contavam. Estávamos aos pés da Mãe, nos encontrávamos bem, teríamos
ficado de bom grado. Você sente isso como eu, caro amigo, a Santa Virgem, em
nossa fé tão santa e tão perfeita, é a mãe na família; haveria algo a
acrescentar? Tire a mãe da família, o fogo se apaga no lar, os bens que sobram
ficam desfalcados e perdem quase todo o seu preço. A Santa Virgem ainda é essa
lua doce e pura que ilumina as noites. Sim, o sol é radioso; sim, aquece e
vivifica toda criatura, mas a lua vai bem aos aflitos, aos corações partidos. É
a imagem da Mãe de misericórdia, auxílio dos miseráveis e refúgio dos
pecadores. Enfim, Maria é o instrumento por excelência, escolhido pela mão de
Deus para executar com o próprio Salvador a grande obra da reparação do mundo.
Se tivéssemos, se você tivesse, caro amigo, o cálice que usava São Vicente de
Paulo para o Santo Sacrifício, que tesouro, que felicidade! Maria é o cálice no
qual foi oferecido o sacrifício pelo próprio doce Jesus: em seu seio virginal,
a vítima estava sendo oferecida, imolada e aceita pelo Pai Eterno. E esse
cálice não era material, insensível: vas spirituale, vaso espiritual,
concorria pelo espírito e pelo assentimento para o grande sacrifício que se
consumava. Por isso, através dos tempos, Maria ainda é, e antes de todos os
outros santos, o instrumento nas mãos de Deus, o canal de suas graças e o órgão
de suas misericórdias.
É bem
visível que estou em pleno campo. Ponho-me à vontade e não economizo nem tinta
nem papel; mas o irmão Paillé está aí e me chama a atenção. Será preciso deixar
o lugar e ir às aspirações, diz-se as inalações, soa mais medical
e científico, a confiança é maior. A minha não é muito robusta, sofro tudo isso
passivamente, já quis voltar a Vaugirard várias vezes e não acho que minha
paciência tenha prazos bem longos.
Não vejo
fatos e gestos bem notáveis a lhe dizer sobre a Comunidade. Nosso amigo, o Sr.
Chaverot, saiu de Chaville somente na segunda-feira, dia 7. Achava-se ali no
seu lugar, afastava-se com pesar; queria também colaborar na distribuição de
prêmios em Vaugirard, talvez? Ele pertence à família e tudo nela o interessa.
Como o bom Deus é bom, que dá assim aos seus o gosto das coisas mais simples e
as torna amáveis a seus olhos, porque Ele é quem as fez e lhes doa. Benedictus
Dominus etc... Que toda a natureza O cante e O louve conosco! Nosso
amigo, Sr. Camus, é menos adiantado, ao menos pelo que está acontecendo. Seu
pai, com furores inauditos, ameaças contra sua mulher, contra si mesmo, injúrias
contra tudo o que está relacionado com a religião, injúrias violentas, jurou
que daria sua maldição a seu filho, no dia em que entrasse em uma Comunidade.
Infelizmente, lê le Siècle. Segundo o parecer do Pe.
Millériot e o meu próprio, pareceu sábio temporizar um pouco e deixar passar o
temporal. Esses tristes fatos têm seu lado bom: firmam e elevam a vontade de
nosso amigo. Na sua volta das águas, seu pai declarou que lhe fechava sua casa,
a não ser que se comprometesse a renunciar a todo projeto de vida religiosa.
Recusou com bravura a tomar esse compromisso, ficou, portanto, em Paris,
residindo em aparência no Hotel Fénelon, mas, de fato, quase sem cessar com os
nossos. Seu desejo de fazer a vontade de Deus e de bem conhecê-la não mudou um
instante. Continuemos, portanto, a rezar, e o Deus de misericórdia tirará dessa
vocação um duplo bem: a santificação de um, a conversão do outro.
O Sr. padre
Laroche está em Chaville, em retiro. Nossos Senhores se entendem
maravilhosamente com ele: é, com efeito, um santo padre, um homem inteligente,
de um grande zelo, de uma verdadeira piedade.
O padre
Roussel, muito cansado, descansa um pouco e toma alguns banhos de mar. O Sr.
Georges [de Lauriston] cuida da casa de Grenelle, e o Sr. Lantiez vai para lá
aos domingos e às quintas-feiras para o espiritual. Estamos examinando a
situação.
Não lhe
digo nada de Allevard, seus bons pais viram o lugar, como você me disse. Essa
região tem suas belezas, com certeza, mas vimos coisa melhor nos Pireneus e na Provence.
Para os encontros sociais, numerosos aqui, como em todas as estâncias
balneárias, ficamos absolutamente estranhos. Aliás, não tenho muito gosto pelas
observações nesse mundo, para o qual não temos outra missão a não ser a oração
e os bons desejos. Digne-se o Senhor aceitá-los. Até agora, fora a peregrinação
a Nossa Senhora da Salete, não sei que lembrança boa teria para trazer dessa
viagem, a última talvez um pouco longínqua que deverei fazer, a não ser a
impressão de contentamento que ficou em mim pela amável e hospitaleira acolhida
de Chalon. Nada faltou para torná-la agradável e delicada para nós: os cuidados
atenciosos de sua boa mãe, a cordialidade franca de seu caro irmão, e também,
bem particularmente, a presença do venerável Pároco de Saint Pierre, que
desejava tanto conhecer e que, de antemão, você me levara a amar. Procure bem,
caro amigo, alguma ocasião de agradecer por nós seus bons pais, da maneira mais
expressiva; quiseram fazer uma boa ação, conseguiram mesmo. Que o Senhor queira
recompensá-los!
Adeus,
caríssimo amigo, os dias fluem, correrão rapidamente, e o que deverá nos reunir
chegará sem demorar muito agora; será um dia abençoado para mim, pois, quanto
mais envelheço, mais sinto a necessidade de ser rodeado por meus amados filhos.
Seu amigo e
Pai em N.S.
Le Prevost
Ternas
afeições e boas lembranças do Irmão Paillé.
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