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Jean-Léon Le Prevost
Cartas

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  • Cartas 1 - 100 (1827 - 1843)
    • 61 - ao Sr. Levassor
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61 - ao Sr. Levassor

O Sr. Le Prevost encoraja seu amigo, um pouco indeciso, a seguir o apelo de Deus que o incita a deixar o mundo; descreve-lhe a felicidade de uma vida pobre e desapegada de tudo. Exprime a esperança de que seu século verá na França um grande movimento religioso. Detalhes edificantes sobre refugiados poloneses, cuja vida comunitária atrai fortemente o Sr. Le Prevost. Zelo dos confrades de São Vicente de Paulo

 

Paris, 28 de junho de 1836.

 

            Dei graças a Deus, meu querido amigo, pelas boas e santas coisas que contém sua última carta: encontro nela, por baixo de algumas reservas de humildade e de sábia desconfiança, uma firmeza de querer que você ainda não tinha mostrado. Pouco a pouco o horizonte se ilumina e logo você lerá seu futuro com o clarão da luz do dia. Sinto-me mais forte agora para encorajá-lo, vendo o bom Sr. Lecomte e seus outros conselheiros tão firmes em seu parecer. Ouso dizer depois deles que tudo, neste grave assunto, virá a ser bom para você e para os seus, porque você nada quis a não ser segundo o coração de Deus e que seu coração que o ama o quer feliz.

            Pela minha própria experiência, posso atestar que nunca coisa empreendida com intenção piedosa e reta teve final ruim. Se o sucesso não estava segundo minha esperança, é que a ultrapassava demais para minha previsão alcançá-lo. Coragem, portanto, meu querido amigo, mais um leve esforço, e a obra será consumada; uma vida toda de abnegação e de amor, toda entregue a Deus, tal será aqui na terra seu quinhão e, no fim: Deus meus et omnia! Isso não vale um pouco de incerteza, algumas dores de coração, algumas lágrimas talvez, que a Virgem Santa enxugará com ternura e compaixão? Conjuro-o, meu caro Adolphe, meu caro irmão, não recue, chegou a hora, Deus o chama, você não pode duvidar. Grite, portanto, com toda a sua força: eis-me aqui, ecce venio; faça o sacrifício do coração. Quanto ao resto, ele se encarrega,  disporá  tudo; a partir do dia em que, em efusão de alma, você lhe disser: “sim, eu sou seu, sim, pertenço a você, pegue-me”, na mesma hora Ele o levará.

            Não sei se me engano, mas parece-me que nosso tempo fará algo de grande pela causa de Deus. Parece-me que há sinais de que a graça faz germinar uma obra de regeneração; vejo em tantos corações um fervor ardente, uma aspiração de futuro tão grande! Sim, Deus quer trazer de volta nossa França a Ele. Portanto, quantos operários Ele pedirá para sua santa messe, e você entre os primeiros, amigo, estará ali sob a sua mão, desapegado de tudo, pronto a tudo. O Espírito armá-lo-á de força, inspirá-lo-á divinamente. Oh! você não desejaria tudo isso? Que remorsos você teria!

     Você se lembra de nosso pobre Marziou? Ele quis a felicidade da terra; é rico, casado, com uma mulher que ele ama, no entanto chora amargamente os bens que perdeu; não me imite, escreveu ao nosso amigo Lambert, vá a Deus, somente Ele é amável, somente Ele é manso; para atingi-lo, tome o caminho mais curto, os outros são rudes e cheios de aborrecimentos. Não preciso recomendar-lhe aqui o segredo: isso foi escrito quase como confissão; somente o caso atual pode me autorizar a revelá-lo a você.

            A Providência parece preparar para você uma roda tão agradável como edificante no retiro onde deve entrar no fim desta estação. Além de alguns de nossos amigos que você já sabe, conheço outros ainda cuja intimidade lhe será bem doce. Nesse número estão alguns jovens Poloneses refugiados que Deus chama a si. Pobres exilados, dizem eles, não temos mais pátria, nem familiares nem amigos, mas eis que o Senhor quer nos fazer as vezes de tudo, Ele nos recolhe em sua casa; ali será para nós o lar, a família, a pátria; oh! não  perdemos nada! Por isso, eles são da mais admirável piedade; amanhã, dois entre eles, e logo um terceiro, vão a Stanislas; mas passarão de lá para São Sulpício, ali você os encontrará. Desde algum tempo, reunidos a alguns outros de seus patrícios, vivem em comunidade, dirigidos por um superior tomado entre eles, com uma regra cristã rigorosamente observada; não têm empregados. Além disso, a oração, o estudo, as santas obras, sobretudo a conversão de seus irmãos exilados, fazem toda a sua vida. Vi o interior dessa pequena comunidade; nada mais edificante, é tudo caridade, tudo paz em Deus. Um crucifixo enorme, colocado na sala de entrada, está ali como para nos acolher e nos avisar do espírito da casa; as pessoas são afáveis, cada uma o cumprimenta e lhe sorri, é a fraternidade dos primeiros tempos. São somente 8, creio, só aceitam os de seu país. São muito pobres; a esmola que lhes faz o Governo, 500 francos a cada um, é seu único recurso mais ou menos, mas são austeros e sóbrios, ainda sobra a parte dos pobres. Não estou embelezando nada, é pura verdade. Você não terá uma grande alegria ao contar entre seus irmãos dois ou três desses pobres refugiados? Os dois que conheço, e de quem estou falando aqui sobretudo, são muito instruídos e do espírito mais distinto; são muito jovens (22 ou 24 anos), de um rosto nobre; um é acutilado. Serão magníficos padres, asseguro, mas tão piedosos, tão humildes como bonitos; um dos dois sobretudo não cessa de orar, mesmo falando, agindo; sente-se que sua alma está vendo a Deus sempre e nunca o perde. Estou sabendo, da parte de um pobre doente de quem cuidava de noite, que sem cessar ele estava de joelhos, conversando com seu Deus, voltando a Ele desde que podia; achava assim a noite curta. Durante cinco semanas também, ele velou no hospital sobre um de seus patrícios, jovem e adoidado ferido em duelo. Á força de cuidados, ele o salvou, a alma e também o corpo, fez dele um cristão. Eis aí como Deus, meu caro amigo, trata uns pobres exilados. Não sejamos invejosos disso; todos também não estamos exilados? Oh! Como eles, temos nossos direitos, é só reclamá-los. Deus nos será manso e misericordioso. Se acreditar em mim, trataremos de nos pôr a trabalhar nesse sentido de todo o coração, nossa miséria, nossa fraqueza serão nossos títulos e, talvez, com a graça, nos tornaremos fervorosos e bem-amados do Senhor.

            Adeus, não se esqueça de me pregar em sua resposta; não deixo de fazê-lo aqui a seu respeito, desforre-se; serei dócil e bom ouvinte.

            A conferência se mantém; o Sr. Housset é dos mais zelosos, não por minha causa; não pude ter com ele, Deus o terá levado a isso; parece amável e bondoso. Suas boas senhoras vão como sempre. Redobre em oração por mim, seu irmão em Jesus Cristo. Nunca falto nisso do meu lado por você.

                                               Le Prevost

            Lembranças de respeito ao Sr. Lecomte, recomendo-me a ele.

 

 




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