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Jean-Léon Le Prevost
Cartas

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  • Cartas 1 - 100 (1827 - 1843)
    • 76 - ao Sr. Pavie
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76 - ao Sr. Pavie

Viver e amar é uma só coisa. O Sr. Le Prevost se queixa de ter demasiadas atividades; no entanto, o que ele faz, o faz para Deus. Sua verdadeira vida pertence totalmente a Deus. Andar com firmeza apesar dos obstáculos da estrada.

 

Paris, 1o de junho de 1838

 

            Você sabe, meu querido Victor, que de tanto contar um com o outro, acabamos adormecendo? Este sono, oh não! não seria jamais a morte! Longe de nós um tal pensamento, mas basta que isso lhe tenha a imagem para que pareça muito triste. Acordemos, caro amigo, e que nossos corações batam bem forte para testemunhar que vivemos ou amamos, pois é uma só coisa. Tenho sob os olhos sua última carta, que data de cinco grandes meses, e que, mesmo assim, após tão longo espaço está ainda tão calorosa de expansão que neste momento me faz sentir muito reconfortado. Eu o rogo ardentemente, meu caro Victor, seja como sempre o mais generoso e o mais fiel de meus amigos; escreva-me apesar de tudo, e nunca, nunca deixe de contar comigo com essa segurança que me honra e me reergue um pouco nas horas de abatimento. É preciso dizer-lhe, no entanto, caro amigo, que meu silêncio não vem, como você parece acreditar, de disposição demasiado contemplativa, nem da invasão sempre crescente de exercícios piedosos, longe disso. Bem que eu gostaria! Seria uma bela desculpa junto a coração tão cristão como o seu, eu sei; mas dela não posso me apropriar. Há, ao contrário, caro amigo, muitos pequenos atos na minha vida, muita atividade exterior, concessões demais às coisas do momento. Cada dia traz de volta um número deles mais do que suficiente para preencher todas as horas. Cada manhã uma medida nova se apresenta, atendo-lhe o melhor possível, mas isso não tem fim. Será que é o resultado do excedente desta cidade monstruosa em que estamos? Será que é fraqueza e insuficiência em mim? Não sei, mas é assim e eu digo a verdade. Decorre daí, caro amigo, que tudo o que não grita ao redor de mim com tanta atualidade,  tudo o que só se encontra no fundo do coração íntimo, terno, suavemente mexendo - Deus, minha mãe e você - é deixado de lado com excessiva freqüência e não se faz ouvir. No entanto, todo o meu amor está ali, toda a minha vida, todos os meus votos. Lanço aqui e acolá alguns lamentos ardentes por estes objetos abandonados, para Deus sobretudo. Ele que penetra no íntimo das pessoas, sabe bem que no fundo eu dou às exigências cotidianas meus passos, minhas ações, até mesmo meus pensamentos e minhas preocupações, mas minha vida, minha verdadeira vida, a que me pertence e que o mundo exterior não me tira, ela é dele, totalmente dele. Você, meu querido Victor, cuja indulgência, cujo bom senso confiante para comigo sempre se me afigurou como aquele da Providência, imite-a. Sob este movimento maquinal, esta sedução das coisas, saiba com seu olhar de irmão discernir sua parte. Na verdade, ela está aí, sinto-a e é a melhor, eu lhe asseguro. Como gostaria de persuadir, neste sentido, todos aqueles, em seu grau, que têm direito também, de minha parte, a uma afeição manifestada, encarnada, como você diz. Oh! não nego a minha dívida, com o tempo talvez eu tudo pague. Que eles tenham apenas paciência; depois, se esta vida não o conseguir, não teremos outra em que amar? Amar a todos e sempre será a única tarefa. Ali pagarei com usura. Receio, todavia, não obter perdão, com semelhantes razões, senão  de você só, o que já é muito.

 

            E você, meu caro Victor, passemos a você, pois isso importa mais. Em que ponto você está, na grande escala que todos nós subimos, tão habilmente alguns, tão pesadamente outros, tão ridiculamente estes, tão nobremente aqueles? Você é um destes últimos, tenho certeza, você prossegue como começou, você torna feliz a querida e boa pequena alma que Deus uniu à sua, você encoraja e mantém no bem seus amigos e outros ainda. Trabalho, estudo, amor santo, oração, eis como vejo, caro amigo, o fundo de sua vida; eis como o quero e como o peço a Deus cada dia.

 

            Aí está, seguramente, uma grande tarefa: andar firme em tal linha, apesar dos obstáculos, das circunstâncias de lugares, de tempo e de tudo o que põe obstáculo aos nossos pés, mas era a única coisa que lhe conviesse e, tenho plena confiança, você a manterá invariável até o fim. A este plano geral que já conheço, não deixe, caro amigo, numa bem próxima carta, de acrescentar alguns pormenores e indicações mais precisas que me permitam, com esta familiaridade afetuosa que sempre me concedeu, seguir até nas mínimas trilhas esta vida que me é tão cara.

 

            Não vejo Théodore há algum tempo, tinha saído quando o procurei ultimamente. Numa visita precedente, encontrei na casa dele Nerbonne, mas mal o entrevi. Gavard também aí estava, e era festa para nós dois nos revermos, após tão longa ausência. É o nosso caso, apesar da vontade muito cordial, creio, de ambos os lados, de nos aproximarmos, não o conseguimos senão em tempos que marcam data e época. Ao seu redor, caro amigo, deve ser mais movimentado, a gente se vê quase todos os dias. Nosso caro Adrien e alguns outros ainda que conheço como seus, lhe são tão assíduos que você tem dificuldade em não nos lastimar, aqui, nós que corremos sempre sem nunca chegar.

 

            A respeito de visitas raras em demasia e bem desejadas, quando será a sua, caro amigo? Já faz um longo ano passado e cadê o Victor? Venha, se possível, você será como no passado nosso ponto de união, e, por algum tempo, os dias lindos voltarão, sem contar ainda a boa lembrança que isso deixa e todos os afrouxamentos que isso reata!

 

            É verdadeiramente uma obra moral, senão melhor ainda, que lhe pertence. Tenho uma certa vontade de dizer que é um dever, e você viria, pois, será que alguma vez essa palavra tocou em vão o ouvido de nosso Victor?

 

            Adeus, querido amigo, mil amizades e das melhores à sua querida alma, a todos o que você ama.

            Seu amigo e irmão

 

                                                Le Prevost

 

            P.S. Devo uma carta a Adrien. Na espera, abrace-o por mim.

 




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