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Jean-Léon Le Prevost
Cartas

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  • Cartas 1 - 100 (1827 - 1843)
    • 3 - ao Sr. Pavie
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3 - ao Sr. Pavie

Comentário sobre os acontecimentos revolucionários. Contraste das paixões humanas. Pequena crônica de suas relações amigáveis. Duelo de Sainte-Beuve

 

Paris, 29 de setembro de 1830

 

Segundo sua última carta ao nosso amigo Gavard, esperava, meu caro Victor, receber logo uma de você, datada do mar, com cheiro de alga e de brisa, com o zumbido das ondas como uma concha do mar, mas nada. Você seria, então, tão infeliz, meu amigo, a ponto de ter abandonado esse projeto? Nesse caso, retome-o rápido, Nunca, meu bom Deus, foi mais necessário mergulhar nas alegrias puras e etéreas da natureza, quando, de toda a parte, o material das coisas nos assalta, nos absorve. Felizes os que podem fugir. Ao menos para mim que a necessidade amarra ao material, fiquei logo inteiramente mergulhado nele. A revolução dos fatos não é maior que minha revolução interior. Leio todos os jornais,  os soletro e os medito. Apaixono-me por eles ou contra eles; a contradição me revolta. Fico mudo em toda reunião social sobre a política, por precaução contra a irritação que sinto em mim, prestes a explodir. Quando as conversas ao redor me chocam, logo pego meu chapéu e minhas luvas e eis-me correndo a perder o fôlego! Não me condene, meu caro amigo, antes de ter você mesmo passado por esta prova. Se, após um mês passado aqui, toda a violência despertada dos partidos, a tolice de uns, as infames esperanças dos outros, a irracionalidade, o egoísmo de todos não o exasperarem, não lhe causarem tanto horror quanto a mim, me oferecerei a ser julgado por você. Em verdade, na vida pacífica que estávamos levando, os homens dormiam. Essa calma, esse descanso combinavam bem com o seu estilo e velavam a nulidade ou a baixeza da alma. Mas eis que estão acordando e sobre todas essas faces passam e se formulam ignóbeis paixões, para nós quase desconhecidas até então. Oh! o horrível espetáculo! Basta, não é?

 

Todos os meus amigos felizmente permaneceram belos. Isso constitui um refúgio. Com quanta felicidade aproximamo-nos deles. Volte, meu amigo, logo. Você nos faz muita falta. Temos ainda o Sr. Mazure. Vejo-o quase todos os dias e quase cada manhã. Conversamos perto de sua lareira. Encontrei esta manhã, na casa dele, Ballanche8, mas quando estava saindo, como uma aparição. Só me ficaram seus dois olhos que, num relance, eu via brilhar através da abertura da porta, como uma fascinação. Vi o Sr. Hugo há uns oito ou dez dias; havia ali uma espécie de caboclo do Danúbio que ele parecia não reconhecer ou nunca ter visto; era constrangedor, não temos falado muitas coisas particulares.  

 

Um jornal traz que Sainte-Beuve9 e Dubois do Globe, nomeado Inspetor Geral dos Estudos, tiveram um duelo. Ainda não pude saber por quê, como, nem quais as conseqüências. Nenhuma deplorável, sem dúvida, pois se saberia. Se eles estão, espero, sem acidente e melhores amigos do que antes, para poetas isso não será em vão e as emoções de tudo isso serão benefício para a alma. Longe de mim que eu considere tal acontecimento como desejável para eles e para os outros; não é a você, meu amigo, que tenho necessidade de explicar meu pensamento.

 

Mando-lhe um artigo pouco caprichado, talvez falso do início até o fim; veja, você mesmo.

Adeus, meu caro amigo. Depressa uma carta, muitas, versos, prosa, tudo, e você sobretudo, quanto antes.

 

Seu todo amigo

Léon Le Prevost

 

 





8 Pierre-Simon Ballanche (1776-1847), era de Lyon. Amigo de Chateaubriand e de Ozanam, esse filósofo teve uma grande influência sobre a escola romântica.



9 Charles Augustin Sainte-Beuve (1804-1869), jornalista e célebre crítica literário. Através de V. Pavie, conheceu o Sr. LP, de quem tinha sentido o encanto. Esse cético inquieto confessará, na intimidade, que se sentia atraído para os sentimentos religiosos do Sr. LP (VLP, I, p.12). Trabalhava então no jornal le Globe, do qual Dubois era diretor. Após um incidente na redação, os dois homens se provocaram em um duelo que não terá conseqüências deploráveis, mas que virará para o trágico-cómico. Chove quando se enfrentam; Sainte-Beuve pega então com uma mão sua pistola, e com a outra... seu guarda-chuva: “Aceito ser matado, mas não quero ser molhado!”





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