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Jean-Léon Le Prevost
Cartas

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  • Cartas 101 - 200 (1843 - 1850)
    • 163 - ao Sr. Maignen
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163 - ao Sr. Maignen

O Sr. Le Prevost tem a certeza de que Deus chama o Sr. Maignen. A vida de comunidade não se constrói com afeições humanas; precisa de intenções sobrenaturais, da oração e da santa caridade. Não se apavorar pela humildade dos começos; trata-se de bem colocar os alicerces na terra. Apelo ao amor fraterno: ver na “terna caridade de seu irmão um dom de Deus”.

 

Duclair, 13 de setembro de 1846

            Estava quase esperando receber de você uma cartinha hoje, caríssimo irmão, embora houvesse pouca aparência de que devesse escrever-me, já que podia pensar que eu estivesse na estrada, para voltar a Paris. Não esperava, portanto, para dizer a verdade, senão porque tinha a necessidade de ter algumas linhas suas e porque, com um certo número de suposições, acha-se sempre o meio de se montar uma esperança. Estou ainda aqui por dois ou três dias. O Sr. Myionnet, que aprecia muito a idéia de levá-lo consigo na pequena excursão ou retiro que projetou, tendo-se organizado somente para o decorrer da semana e não antes, me convidou a não apressar sem necessidade minha volta. Estarei, portanto, em Paris somente quarta feira, 16, durante o dia; penso que encontrarei ali uma carta sua. Até lá, não terei, sem dúvida, notícias suas. Sofreria muito com este atraso, caro amigo, se sua última carta não me tivesse tranqüilizado a respeito de sua posição e, sobretudo, de seu estado de espírito. Encontrei, no meio das preocupações bem naturais do seu coração, uma certa calma, uma espécie de segurança, que me pareceu o indício da operação de Deus em você. Ora, aí está o que procuramos, caro amigo, você e nós que o amamos: a certeza de que o Senhor o chama e o quer conosco. Uma vez bem adquirida essa convicção, poderemos sofrer, sem dúvida, pelos sacrifícios que uma grande resolução impõe, mas, gemendo ao mesmo tempo por nossa própria pena e pela dos outros, teremos a paz no fundo da alma, porque reconheceremos aí a vontade sempre terna e sempre sábia do nosso Deus. Sem isso, não saberíamos achar nenhuma segurança nem repouso de coração. Sabemos por experiência que as mais ternas simpatias não bastam para assegurar a duração das afeições, que elas têm ao menos inconstâncias ou flutuações que misturam a perturbação às suas mais suaves alegrias e fazem temer pelo futuro. Mas se, como tudo me deixa agora esperá-lo, caro amigo, é verdadeiramente uma pura e santa caridade que nos congrega, se é o espírito de zelo e de dedicação, a necessidade de nos entregar a Deus sem medida, de unir para o seu louvor nossos corações e nossas vozes, para seu serviço nossos trabalhos, para a utilidade de nossos irmãos nosso ardor e nossos esforços, oh! certamente, nossa existência é bem alicerçada, a união se consumará em nós e firmar-se-á pela duração, pois o Senhor habitará entre nós. Se é verdade dizer que um fiel, um homem em paz com seu Deus apresenta a união de um corpo, de uma alma e do divino Espírito, é igualmente certo que uma assembléia de verdadeiros irmãos é também um corpo e uma alma unidos íntima e divinamente ao Espírito; que maravilha de caridade, caríssimo amigo, que meio poderoso de edificação, que obra gloriosa e cara a Deus! É a isso que seu amor nos chama! Dilatemos nossos corações, elevemos nossos espíritos para respondermos dignamente a uma tão grande vocação. Importa pouco que nossos começos sejam pequenos, que nossa roupa, nossos hábitos exteriores continuem sendo os do mundo, que nossos exercícios não tenham uma regularidade absoluta, nossas obras, um grande alcance. Se, com um coração reto e puro, colocamos na base de nossa querida instituição o amor, a dedicação, o desejo ardente e verdadeiro de reproduzir em nós o divino Modelo que teremos agora como único, sob nossos olhos, não teremos trabalhado em vão, mais cedo ou mais tarde, nossa obra sairá de terra, terá, como as que Deus abençoou no passado, seu lugar, seu futuro e sua missão.

 

            As horas de desânimo em que você me viu muitas vezes, caro irmão, se explicam pelo sentimento profundo de nossa indignidade para um tal empreendimento; mas, se Deus se dignar  nos apoiar, seria uma fraqueza exagerada não andarmos com Ele. Não temos que trabalhar sozinhos, com nossas forças, com nossas mãos, mas, sim, sob a sua conduta, com os meios, os recursos, as luzes, as graças de todos os tipos que sua Providência fornecerá. Não temos, enfim, que construir, nós mesmos, o edifício inteiro, mas unicamente, sem dúvida, que limpar a área, colocar sob a terra talvez os fundamentos esquecidos que aparecerão bem pouco e não terão valor senão para o arquiteto divino. Esta tarefa bem entendida deve muito agradar a umas almas que o Senhor tiver tocado; uma vida de uma beleza toda interior, uma obra obscura e quase despercebida, desprezada talvez ou contrariada153, tendo como único apoio a confiança no Deus de caridade e um vago vislumbre de esperança e de futuro. Sim, essa tarefa é nobre e bela, digna de corações firmes e movidos por um grande amor, mas também, naqueles que a aceitam, que segurança ela requer de que Deus os aceita e repousará neles! Mas, mais uma vez também, não duvidemos demais de nós mesmos quando, após um sério exame de nosso coração, você, o irmão e eu, tivermos dado o passo. Saibamos bem que a obra de nossa edificação interior, a conversão, a perfeição de nosso coração não serão o trabalho de um dia, como também não será a obra de nossas mãos a nossa própria querida instituição.  A impaciência, os desejos demasiadamente apressados, estragariam ambos os empreendimentos. A humilde oração de cada dia, o trabalho sabiamente executado, a espera paciente e ternamente confiante deverão ser nossa via e só eles nos conduzirão ao nosso objetivo.

            Você me perguntará, caríssimo amigo, se é você que pretendo exortar por esses pensamentos aqui enunciados dentro de previsões que o Senhor bem pode não ratificar. Não, meu muito querido filho, não é precisamente para aconselhá-lo, você não precisa de meus conselhos, o bom Deus mesmo falará a seu coração de um jeito bem diferente do que eu poderia usar; mas, escrevendo-lhe, parece-me que converso com você bem simplesmente, como fizemos tantas vezes nestes longos passeios cuja lembrança não perderemos. Procuro me dar conta da nossa posição, das vistas do Senhor sobre nós, daquilo que deveremos fazer para lhes responder, e o digo a você, caro amigo, sem dar outra importância a isso, sabendo bem que as previsões servem pouco aos que se abandonaram às condutas do Senhor e que vão, dia a dia, aonde seu sopro os impulsiona. Será para mim, acredite, caro amigo, uma doce consolação, um poderoso encorajamento, andarmos neste caminho lado a lado com você. Melhor do que nunca, nos apoiaremos e nos reergueremos alternativamente; mais do que nunca nos amaremos e nos daremos um ao outro, pois cada um de nós verá na terna caridade de seu irmão um dom de Deus, uma graça para dar-se totalmente a Ele.

 

            Sou bem afetuosamente em J. e M.

 

            Seu irmão devotado

                                               Le Prevost

     P.S. – Não deixe de agradecer ainda por nós o jovem irmão e de assegurá-lo de nossa sincera afeição. Diga-me qual é sua posição e se ela pode ser mantida ainda por alguns dias. Reze por nós, não digo se rezo por meu querido filho. Escrever-lhe-ei ao chegar em Paris ou pelo menos desde que você mesmo me tiver escrito.

 





153 No original em francês: “traversée”, francês antiquado, significando isto: contestada, contrariada, impedida de agir.





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