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Jean-Léon Le Prevost Cartas IntraText CT - Texto |
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428 - ao Sr. PailléO Sr. Le Prevost dá detalhes sobre sua saúde e sobre o clima de Cannes. A má qualidade do vinho é uma das causas de suas misérias. A capela de Nazareth. Assinatura do jornal l’Univers. Projeto de Conferência de São Vicente de Paulo. Guardar com cuidado, nos arquivos, a carta relatando os últimos instantes da Dona Taillandier.
Cannes, 30 de novembro de 1856
Caríssimo amigo e filho em N.S.,
Agradeço-lhe sua afetuosa atenção por minha saúde; muito obrigado também pelo pensamento que teve de consultar o excelente Sr. Tessier sobre as medidas que minhas misérias poderiam pedir. Teria grande repugnância a afastar-me para mais longe; nossas pequenas acomodações são tomadas aqui, começamos a conhecer as entradas, saídas e cantos da casa. Precisaria instalar-se de novo em outro lugar, com novas despesas de viagem e embaraços também reiterados para nos assentar mais ou menos segundo nossas necessidades. Creio que é preciso que eu tenha paciência e persevere ainda. Sinto aqui o que havia sentido no Vernet e em Hyères: o clima do Sul é bem forte e superexcitante para meus fracos órgãos, uma temperatura um pouco mais úmida e menos corrosiva do que a que se tem nestas regiões me iria melhor sem dúvida, mas onde achá-la? A umidade fria e nevoenta de Paris não me conviria, e sobretudo me impediria de sair e tomar ar, como sinto necessidade disso. Aqui, o tempo é maravilhosamente lindo; há um mês temos um sol radiante e tivemos apenas algumas horas de chuva, mas essa mesma aridez tem seus inconvenientes; além disso, as variações da temperatura são grandes; ordinariamente, temos de manhã entre 5 e 7 graus; durante o dia mais de 20, no sol sobretudo; à noite, 8 graus, e, no interior do apartamento, habitualmente 13 ou 14.
Acho que a indisposição que me veio há uns dez dias após minha chegada poderia ser, na medida em que posso presumi-lo, um tipo de pleurisia. Era um mal nas costas e nos ombros, com uma viva dor no pulmão direito, e uma violenta inflamação no peito, indo até as entranhas e causando-me uma ardente alteração. Foi nesse momento que aconteceram, durante dois dias somente, alguns escarros de sangue com um pouco de tosse dolorosa e irritada. Como faço quando sinto a inflamação no interior, modifiquei meu regime, diminuí o uso da carne, reduzi o do vinho a quase nada. A inflamação do peito diminuiu depois de alguns dias, não tusso mais, mas o sistema todo inteiro continua aquecido e sempre pronto a pegar fogo. Não sei como achar alimentos bastante temperados, minhas entranhas tendem sempre à inflamação, meu peito está fraco e sempre bastante doído; em uma palavra, ainda não encontrei meu equilíbrio e colocado meu organismo em harmonia com o meio em que estou.
Você sabe que uma particularidade de minha frágil constituição é que as qualidades do vinho que uso influem singularmente sobre mim; embora beba apenas duas garrafas por semana e deite sempre nele muita água, me é impossível, no entanto, estar em boa forma enquanto não tenho, sob esse aspecto, encontrado a combinação conveniente. Em Vaugirard, tinha conseguido isso, misturando ao que tenho em casa um vinho de Bordeaux muito medíocre, que me vendia por garrafa o Sr. Dupuis, rua do Regard. Aqui, todas as minhas tentativas foram inúteis; o vinho que trouxe, já ardente demais, o é muito menos que tudo o que se encontra por aqui, mesmo nos vinhos de Bordeaux, que são muito caros (3f ao menos a garrafa), superiores sem dúvida, em qualidade, ao de Paris, mas bem mais generosos. Não podendo me decidir para essa estranha medida de mandar vir vinho ruim de Paris, tentei, com muita água, nem precisa dizer, todos os vinhos da região, dentro e fora de Cannes. Só encontrei vinhos quentes, capitosos, irritantes, superexcitantes. Aí está, acho, uma das principais causas de todas as minhas misérias, porque não posso lutar contra o princípio de inflamação que o ar, o sol talvez, o mar, etc... me trazem.
Veio-me o pensamento de que seria para você um incômodo menor e, em si, uma mínima despesa de porte, fazer uma tentativa com 6 ou 8 garrafas ao máximo, que me bastariam grandemente para fazer uma experiência de seis semanas. Se, durante esse tempo, o equilíbrio se restabelecesse em minha saúde, precisaria, embora gemendo, fazer concessão a tais enfermidades e fazer-me de Paris uma remessa de umas vinte garrafas a mais; senão, me resignaria e tomaria, espero, em paciência um mal cujo remédio não estaria vendo.
Se não está vendo inconveniente demais nessa combinação, caro amigo, pediria-lhe para passar na casa do Sr. Dupuis e pegar ali, para me expedi-las, 3 ou 4 garrafas de Bordeaux a 2f, e 3 ou 4 a 1f, tal como ele as vendia para mim; ambos me convinham mais ou menos igualmente.
Não acho que se deva julgar do clima do Sul por aquilo que sinto dele; você se lembra que em Hyères, no ano passado, todos os doentes iam corajosamente para fora, enquanto eu, achando o ar duro demais, estava obrigado a me cobrir a boca e o rosto. Aqui, a pele de minhas mãos tornou-se rude, como estava nos grandes frios ou nos ventos de fevereiro em Paris. Acho que entre Hyères, Cannes e Nice, que são lugares contíguos, há, para dizer a verdade, bem pouca diferença. São regiões admiráveis: aí se escapa a tudo o que o inverno tem de triste e de rigoroso alhures, mas não podem ser absolutamente o paraíso terrestre, elas têm suas dificuldades para organizações demasiadamente delicadas e débeis. Quanto a Menton, não sei de jeito nenhum como a gente está por aí; tomarei algumas informações para deferir aos conselhos do Sr. Tessier, em quem tenho inteira confiança. Seria, porém, um estorvo bastante grande para mim chegar num país onde não conheço ninguém e onde teria, sem ajuda alguma, que prover a uma nova instalação. Aqui, as recomendações do bom padre Taillandier me tinham preparado as vias; tinha, na minha chegada, um alojamento encontrado, todos os tipos de assistências benevolentes me cercaram e remediaram à minha inexperiência da gente e dos lugares; não teria, sem dúvida, em outro lugar, as mesmas condições. Desejaria, portanto, tentar ainda um pouco se, com a ajuda do vinho que você me enviaria, e tomando muitas precauções, eu não poderia aclimatar-me; se o sofrimento do peito e a inflamação das entranhas persistirem, tomarei novamente o parecer do bom Sr. Tessier.
Não acredite, aliás, que eu faça alguma imprudência: saio somente após o levantar do sol (levanta-se, é verdade, habitualmente pelas 8 horas da manhã) e entro quando ele se deita; é uma recomendação que se faz aqui a todos os doentes, os orvalhos sendo bem abundantes e frios.
Estava chegando a este ponto de minha carta, quando me remetem sua última, na qual você me convida a escrever diretamente ao Sr. Tessier. Estou tão confuso por já ter-lhe dito tanto na presente carta sobre minha saúde, que não posso encarregar-me de refazer outra sobre o mesmo assunto. Como o Sr. Tessier é muito apressado, você poderia indicar-lhe nesta o que melhor o colocaria a par de minha situação.
Expresso-lhe ainda todo o meu pesar, meu bom amigo, pelos intermináveis detalhes em que entrei aqui sobre minha pessoa e minha saúde. Acreditei que era preciso, já que você, bondosamente, tinha assumido consultar o Sr. Tessier a meu respeito. Se tivesse ocasião de revê-lo, assegure-o de toda a minha gratidão e de todo o meu devotamento.
O que você fez relativamente à capela me parece certo; agora, é preciso esperar e deixar o Sr. Pároco tomar, por si mesmo, tal resolução que lhe convier; tornaríamos a falar sobre isso, se fosse o caso. Não conheço de jeito nenhum o Sr. Pároco de Saint Philippe du Roule, mas vou mandar para você a carta que me pede, deixando-o livre para não utilizá-la, se achar melhor procurar outro meio qualquer.
Agradeço-lhe por l’Univers; tome uma assinatura para três meses somente, esta despesa me pesa um pouco na consciência, acho que nos limitaremos a este trimestre; encontrarei talvez depois algum meio de providenciar isso por aqui; só achei La Presse, da qual li um número, mas era ainda demais.
O assunto da Conferência aqui anda devagar, todavia parece-me avançar um pouco; esses prazos têm este bom lado: me trazem algumas relações com aqueles que deverão colaborar na obra; tornar-se-á então mais fácil influir um pouco sobre eles. Esses prazos, aliás, não dependem de mim.
Nosso jovem irmão Ernest é bem sensível à sua boa lembrança; ele vai bem até agora e se mantém nas suas boas disposições.
Mandei ao irmão Myionnet uma carta muito tocante, que me tinha escrito nosso bom padre Taillandier sobre os últimos instantes de sua santa mãe. Todos tomem conhecimento dela e cuidem muito para que não se perca; faço questão bem vivamente que seja conservada em nossos arquivos. Adeus, meu excelente amigo; abrace todos os meus filhos de Nazareth por mim, amo-os ternamente em N.S.
Seu amigo e Pai
Le Prevost
Vou ver se uma pequena região chamada Le Cannet, a três quartos de légua de Cannes, melhor abrigada e mais afastada do mar, teria um albergue para mim. Se fosse absolutamente necessário mudar, eu não poderia ir a Roma, cujo ar é mais macio e menos áspero do que aqui? A viagem então teria um objetivo, e, aliás, eu reencontraria ali amigos. Dizem-me aqui que Menton está numa região montanhosa mais fria e pouco resguardada do mar.
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