Pedido de separação.
Ele deseja um consentimento nítido e preciso.
30 de abril
de 1845
Querida amiga,
A sobrecarga de meus trabalhos, o esgotamento sempre maior de minha saúde que
me obriga a seguir outro regime de vida, enfim a necessidade de definir mais
nitidamente minha posição por demais dividida entre obrigações diversas, me
determinam definitivamente a deixar a administração e a aposentar-me. Não tomei
esta decisão sem reflexões amadurecidas. Examinei bem, tanto para você quanto
para mim, quais seriam as conseqüências, e me convenci de que, sem prejuízo
algum para você, me asseguraria um pouco do descanso de que sinto a mais
urgente necessidade.
A independência de seus recursos próprios, a insuficiência dos meus para
acrescentar algo de favorável à sua existência, a diferença dos nossos hábitos,
a raridade de nossos relacionamentos, tudo me persuade de que minha
determinação nada mudará, na verdade, em sua situação, que eu não gostaria, por
nada neste mundo, nem de piorar nem de perturbar. A minha modesta aposentadoria
não me deixará senão a escolha de dois meios: viver no campo, ou retirar-me
numa Comunidade. O primeiro não conviria muito aos meus hábitos e às minhas
necessidades. Só forçado recorreria a ele, caso minha saúde se
alterasse cada vez mais. Só o segundo me parece viável e é nele que me detive
definitivamente; mas, para tal, querida amiga, preciso de seu assentimento e o
espero da sua boa vontade, como de sua afeição por mim.
Tenho ainda, parece-me, algum bem a fazer. É minha única porção neste mundo e
será também meu único legado. O que me resta de forças e de dias será
suficiente talvez, não quereria me recusar a isso. Pense bem nisso, por favor,
querida amiga, um dia ou dois, e escreva-me algumas linhas de resposta bem
nítida e bem positiva. Não é um consentimento arrancado e forçado que peço:
equivaleria para mim a uma recusa e eu não poderia, nem quereria usá-lo; é um
assentimento livre, simples, e cordial que coloque meu espírito em paz e nos
deixe um para com o outro numa união verdadeira e em boa disposição de coração.
Se achar, querida amiga, que pode me dar um tal assentimento, o receberia com
gratidão. Se fosse diferente, eu não insistiria, decidido de antemão, quaisquer
que sejam as conseqüências, a manter até o fim todas as obrigações que me são
impostas.
[L.P.]
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